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BRASIL

Lula deve revogar decretos de armas de Bolsonaro, diz Flávio Dino

Henrique Canary, de São Paulo (SP)
Agência Brasil

O senador eleito pelo PSB do Maranhão, ex-governador do estado, coordenador do grupo de segurança pública da equipe de transição e cotado para o ocupar o cargo de ministro da Justiça Flávio Dino afirmou em entrevista nesta quinta-feira, 17, que o governo Lula deve revogar os decretos de Bolsonaro que facilitaram o acesso às armas ao longo dos últimos quatro anos.

O armamento da população foi uma das prioridades do governo Bolsonaro, mas deve ter outro tratamento no novo governo Lula. Desde que foi eleito, Bolsonaro assinou 19 portarias, duas resoluções, três instruções normativas e dois projetos de lei que flexibilizaram as regras de acesso a armas e munições. O decreto que flexibilizou a posse de armas (não confundir com o porte) foi um dos primeiros atos de Bolsonaro, assinado ainda em janeiro de 2019, logo no início do seu governo. Em maio do mesmo ano veio o decreto que liberava o uso de armas em toda a área de propriedades rurais e flexibilizava o monopólio da importação de armas. A compra de cartuchos também foi ampliada, passando de um máximo de 50 unidades por ano para até 1000 unidades, no mesmo período. O resultado prático dessas e de outras medidas é que o governo de um modo geral, e o Exército em particular, praticamente perderam o controle de quantas armas e munições existem no país.

O ex-governador afirmou ainda que não deve haver fechamento generalizado de clubes de tiro, mas que algum tipo de controle deve ser implementado. “Vai haver fechamento generalizado de clubes de tiro? Não. Seguramente, não. Mas não pode ser algo descontrolado, não pode ser ‘liberou geral’ porque todos os dias se noticiam tiros em lares, em vizinhança, em bares e restaurantes de pessoas e cuja observação está lá nas matérias dos senhores: possuía registro de CAC (Colecionador, Atirador e Caçador)”, afirmou. Dino defendeu também a revisão do conceito de CAC, que visivelmente fracassou, e não descartou o recolhimento das armas de grosso calibre que foram liberadas com os decretos de Bolsonaro.

Para o senador eleito, não cabe aqui a discussão sobre direito adquirido. “Existe direito adquirido a faroeste? Não. Existe direito adquirido a andar com fuzil, metralhadora? Não também. Imaginemos uma situação de um medicamento que hoje é permitido e amanhã passa a ser proibido. Alguém terá direito adquirido a continuar tomar esse medicamento? Resposta: não”, disse a jornalistas ao chegar ao CCBB de Brasília, sede da transição, após reunião com o atual ministro da Justiça Anderson Torres.

Segundo orientação dada pelo coordenador dos grupos temáticos Aloizio Mercadante, o grupo de segurança pública deve formular até o dia 30 de novembro uma lista de decretos e atos a serem revogados pelo novo governo Lula. Depois, o tema deve ser incluído no relatório final da comissão, que será entregue até 12 de dezembro. A ideia geral é que toda a política relativa às armas obedeça o Estatuto do Desarmamento, aprovado em 2003: “Nós temos uma lei vigente, o Estatuto do Desarmamento, que foi objeto de um desmonte por atos infralegais, abaixo da lei. Isso sem dúvidas é um tema fundamental do grupo de trabalho. É um tema que o presidente Lula escolheu e foi aprovado pela sociedade brasileira”, disse Dino.

Lembremos também que os decretos de Bolsonaro já estão sob análise no STF, mas um pedido de vistas de Nunes Marques (nomeado por Bolsonaro) trava o julgamento do mérito já há 14 meses. Em setembro deste ano, o ministro Edson Fachin suspendeu temporariamente o efeito dos decretos devido ao perigo de violência política relacionada às eleições.

Seja da forma que for, a política armamentista de Bolsonaro é um completo fracasso e precisa ser revista. Ela não levou, de forma alguma, ao aumento da segurança para a população em geral. Seus dois principais efeitos foram, por um lado, o armamento de fanáticos bolsonaristas dos clubes de tiro; por outro, o acesso facilitado do crime organizado às armas, graças à flexibilização do controle por parte do Exército.

O problema da segurança pública é um dos nós mais complicados de se desatar porque foi aí que o bolsonarismo mais violento fincou raízes. O objetivo de Bolsonaro nunca foi a segurança da população, muito menos da população pobre. O que ele sempre quis foi implementar no Brasil uma cópia vira-lata do atual bangue-bangue norte-americano: supremacistas brancos armados até os dentes desfilando livremente pelas cidades do interior com seus fuzis e metralhadoras automáticas “de caça”. Felizmente, estamos mais próximos de impedir esse pesadelo.

Mas o problema não se encerra aí. Revogamos os decretos de Bolsonaro. Mas o que propor em seu lugar? Uma verdadeira política de segurança passa não pelo acesso indiscriminado às armas por parte dos supostos “cidadãos de bem”, em sua maioria marginais tresloucados com sérios desvios comportamentais, mas por uma ampla e radical reforma das polícias federal, civil e militar, com eleição democrática de chefias, integração dos comandos à população local e aos territórios, subordinação da política geral de segurança a conselhos de segurança representativos da sociedade civil, desmilitarização das polícias militares, direito à greve e à sindicalização, formação de policiais em direitos humanos e antirracismo e investimento em inteligência e prevenção de crimes. E ainda assim, tudo começa pela revogação dos atos de Bolsonaro.

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armamentismo / armas / CAC