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EDITORIAL

Ciro ajuda Bolsonaro

Editorial de 30 de agosto de 2022
Bolsonaro e Ciro Gomes no debate da Band
Reprodução

Ainda que não queira, Ciro Gomes está prestando inestimável serviço a Jair Bolsonaro. A todo momento, o pedetista se esforça para igualar Lula e o fascista. E pior: é mais agressivo e concentra ataques contra candidato do PT, aliviando para o Jair. Isso ficou evidente no debate da Band.

Com habilidade, Ciro apresenta propostas econômicas e sociais de centro-esquerda, algumas corretas, como a taxação das grandes fortunas. Mas sua linha política oportunista está favorecendo a extrema direita.

O erro terrível de Ciro pode levar Bolsonaro ao segundo turno. Primeiro, porque o percentual que o pedetista registra nas pesquisas, entre 6% e 9% das intenções de voto, se continuar assim até o final, pode ser fatal, impedindo que o petista vença no primeiro turno. Segundo, porque os constantes e ferozes ataques de Ciro a Lula dão combustível à campanha bolsonarista de desgaste da imagem do ex-presidente, sobretudo com a tentativa leviana de associá-lo à corrupção.

Lula e Bolsonaro são iguais? 

Ciro tem o direito de criticar Lula, de apresentar seu projeto de governo e de tentar crescer nas pesquisas. Faz parte da disputa democrática. Mas sua insistência em colocar um sinal de igual entre o candidato do PT e o candidato do fascismo merece a mais enérgica condenação política.

Nenhum equívoco passado ou atual do PT, nenhuma limitação programática ou estratégica do ex-presidente, permite fazer qualquer equivalência de Bolsonaro e Lula. Essa linha do pedetista faz eco ao posicionamento das elites liberais, a exemplo do famoso editorial do Estadão, “Uma escolha difícil”. Além disso, alimenta a máquina de propaganda bolsonarista. Tanto que o “gabinete do ódio”, comandado por Carlos Bolsonaro, espalha alegremente nas redes sociais as agressões de Ciro ao petista.

É certo que as alianças do PT com setores da direita (por exemplo, com o MDB de Temer) abriram a porta ao golpe contra Dilma em 2016. Alianças essas que o PDT de Ciro também faz no Ceará e em outros estados do país, como no apoio ao ACM Neto na Bahia e ao Ronaldo Caiado em Goiás. É verdade, também, que os governos petistas de conciliação de classes (dos quais Ciro e seu irmão, Cid Gomes, fizeram parte) não foram capazes de promover mudanças estruturais no país.

Porém, nada disso autoriza a reiterada afirmação de Ciro de que Lula e Bolsonaro representam, em essência, o mesmo projeto. Trata-se de uma mentira com consequências nefastas.

A bem da verdade, há enorme diferença entre o projeto social-liberal do PT, que busca realizar concessões sociais aos mais pobres, beneficiando ao mesmo tempo os grandes capitalistas, e o projeto fascista do bolsonarismo, que visa a completa destruição das liberdades democráticas e dos direitos sociais. Os governos petistas podem e devem ser criticados pelos seus limites, equívocos e estratégia, mas não há nenhuma comparação razoável dos governos Lula e Dilma com o que aconteceu com o país nos últimos anos com o governo Bolsonaro.

Jair é o principal responsável por quase 700 mil mortes na pandemia e destruiu todo tipo de direitos e conquistas sociais e democráticas que conseguiu. Se for reeleito, ganhará força para avançar na implementação de um regime ditatorial de extrema direita. Seu triunfo teria, portanto, efeitos catastróficos para a vida do povo e ao conjunto da esquerda e dos democratas.

Por sua vez, se Lula for eleito, teremos um cenário muito diferente, abrindo melhores condições à luta do povo trabalhador e oprimido, aos projetos políticos à esquerda do PT, como o PSOL, e aos movimentos sociais, sindicatos, movimento negro, feminista e LGBTQI.

Com Lula no governo, poderemos cobrar medidas à esquerda para acabar com a miséria, combater as desigualdades, o racismo e o machismo, investir em saúde e educação e proteger o meio ambiente. Sem a ameaça imediata de uma nova ditadura, será possível exigir mais democracia, com liberdade, inclusive, para criticar o governo Lula em seus erros e alianças à direita.

Ciro parece não perceber os significados opostos da vitória de Lula e a de Bolsonaro. Ao igualá-los, passa um pano para o fascismo, mesmo que não queira.

A vitória de Lula em primeiro turno seria um golpe no golpismo 

Há um argumento sério e importante para o diálogo com os eleitores que pretendem votar em Ciro (ou em Simone Tebet), mas que compreendem o quão perigoso e nefasto é o projeto autoritário de Bolsonaro. Se o fascista for ao segundo turno, terá mais força para tentar um golpe contra o resultado das eleições.

Se a disputa terminar no primeiro turno, com o triunfo do petista, Bolsonaro não terá condição política para melar a eleição que também é para governador, senador e deputado federal e estadual. Ou seja, ele teria que questionar, além da eleição de Lula, a de todos outros políticos, inclusive de seus aliados.

E, mais importante do que isso, uma vitória de Lula já no primeiro turno provocaria desmoralização política na base bolsonarista, dificultando sua mobilização para fins golpistas. Numa disputa de segundo turno, ao contrário, teremos uma batalha muito mais acirrada e perigosa, concedendo mais tempo para a recuperação eleitoral de Bolsonaro.

Por todos os motivos elencados acima, é urgente que Ciro Gomes abandone sua linha de igualar Lula e Bolsonaro, sob pena de continuar favorecendo a recuperação eleitoral do fascista. A história não o perdoará se ele insistir nesse caminho trágico, que começou com sua ida para Paris no segundo turno em 2018.

Aos eleitores que estão pensando em votar no pedetista (ou em Simone Tebet), fica o convite à reflexão: não é melhor derrotar Bolsonaro já no primeiro turno, matando qualquer chance do golpismo prosperar? Apenas o voto no Lula, ainda que crítico, pode ser útil para esse objetivo fundamental.