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BRASIL

PE: número de mortes supera 90. Em visita ao estado, Bolsonaro prioriza ataques

da redação
Pessoa em uma rua alagada. Ela está caminhando dentro d´água. com os braços pra cima.
Reprodução
(texto atualizado às 13h30)

O Grande Recife vive uma tragédia climática de grandes proporções, e o número de mortos já supera a grande cheia, em 1966, que alagou a capital e permanece na memória do povo pernambucano. No início da tarde desta segunda-feira, as autoridades já haviam registrado 91 mortes na região. O número deve subir nas próximas horas, diante dos trabalhos de bombeiros e defesa civil em pelo menos 12 pontos de deslizamento.

As autoridades reconhecem que o total de pessoas desabrigadas é incerto, mas pode chegar a 5 mil pessoas no estado. Há registro de 3.957 pessoas que perderam suas casas e 533 desalojadas, que foram removidas de suas casas, diante das chuvas. Pelo menos 3.500 pessoas estão nesse momento em abrigos da Prefeitura do Recife, sem contar os das demais cidades da Região Metropolitana e da Zona da Mata. Até agora 15 municípios decretaram Situação de Emergência: Recife, Olinda, Jaboatão dos Guararapes, Igarassu, São José da Coroa Grande, Moreno, Nazaré, Macaparana, Cabo de Santo Agostinho, São Vicente Ferrer, Paudalho, Paulista, Goiana, Timbaúba e Camaragibe.

Dor e solidariedade

O País inteiro acompanhou a dor da população, através de imagens e vídeos de busca e resgate de pessoas soterradas. A vereadora Dani Portela (PSOL), saiu de madrugada e passou o sábado percorrendo a cidade, ajudando pessoas atingidas pelas chuvas. No final do dia, escreveu um relato emocionado em suas redes, que mostra um pouco da dor e da luta do povo pernambucano pela vida.

“Chamados de Saponu, Passarinho, Coqueiral, Ibura, Peixinhos, Fragoso, Jaboatão, etc.
Chamadas. Socorro. Bombeiro. Defesa Civil. Tudo isso misturados a uma chamada desesperada pq alguém foi levado pela correnteza. Outro alguém, estava soterrada nas barreiras.
-É a mulher da Pizzaria, estamos ouvindo a voz dela, mas não tem ninguém para ajudar!
Outra senhora conseguiu ser resgatada e passou mal em seguida, falecendo. Correria. IML. Dor.
Convenci uma senhora de 84 anos a deixar a casa.
Arrecadamos. Fizemos sopa. Cuscuz. E ao final da noite a triste notícia: duas famílias que eu estava aguardando o resgate aéreo, pois os botes não chegaram devido a correnteza, só podem ser resgatadas amanhã. (…)”

As ações e campanhas de solidariedade, como nas demais tragédias climáticas recentes, foram imediatas. Nas redes, coletivos e associações divulgaram formas de doação, convertidas em cestas básicas, roupas e mantimentos. Em Recife, centenas de locais se converteram em pontos de recolhimento de doações, incluindo as sedes dos clubes de futebol Náutico, Sport, Santa Cruz e Retrô.

Quando o governo não é aliado, Bolsonaro ataca antes de ajudar

As ações por parte dos governos ainda são limitadas. O governo estadual, de Paulo Câmara (PSB), anunciou a liberação de R$ 100 milhões, para ações das prefeituras atingidas e nomeou bombeiros aprovados em concurso, para início imediato. O prefeito de Recife, João Campos (PSB), anunciou R$ 15 milhões em ações de ajuda às vítimas da chuva, mas para isso, cancelou as festividades juninas.

Nesta segunda-feira, Jair Bolsonaro visitou o estado e sobrevoou áreas atingidas. sem sequer ter comunicado ao governador. Estava acompanhado de ministros e do prefeito de Jaboatão dos Guararapes, Anderson Ferreira, filiado a seu partido, o PL. Também teria realizado uma reunião com ministros, sem convidar o governador ou o prefeito de Recife. À imprensa, tentou transferir o ônus ao governador, que não teria telefonado para ele. Bolsonaro anunciou medidas para as vítimas da tragédia, como a liberação do FGTS e do BPC (Benefício de Prestação Continuada), aplicadas em outras tragédias, e anunciou liberação de recursos, sem definir valores.

O rito repete a atitude tomadas em outras tragédias, ocorridas em locais onde gestores são oposição ao governo federal. Nestes casos, Bolsonaro alterna omissão e ataques, fazendo da tragédia uma luta política. O caso mais marcante ocorreu diante das chuvas na Bahia, em dezembro e janeiro, quando o presidente, de férias, fez questão de passear em jet ski e atacar o governador, do PT.

Tragédia climática: não foi fatalidade

Os deslizamentos e mortes foram resultado de uma forte chuva que desabou sobre a região, entre as 23h de sexta, 27, e sábado, 28. Neste período, choveu o equivalente a 70% do previsto para o mês. Segundo os serviços de metereologia, não estão previstas fortes chuvas nos próximos dias.

Como no Sul da Bahia, em Minas Gerais ou em Petrópolis (RJ), as mudanças no clima atingem especialmente populações que moram na periferia e em moradias precárias. Em Pernambuco, uma das áreas mais atingidas foi o bairro do Ibura, zona sul do Recife, onde 20 pessoas morreram num deslizamento de terra. Levi Costa, da Associação de Moradores de Três Carneiros Alto, no Ibura, conta que vem buscando solução há bastante tempo junto à Prefeitura, sobre as encostas. “Há dois meses, o (prefeito) João Campos veio inaugurar aqui uma pintura no pé da ladeira, que poderia ser a geomanta na própria localidade. A gente não entende, a gente não concorda… Agora vem fazer política com a tragédia. Você, João Campos, você é só mais um do mesmo”, afirma.

Estas tragédias evidenciam o racismo ambiental, com a maior parte das mortes de pessoas negras, que vivem em favelas e comunidades . “Em cidades em que o metro quadrado é super explorado pelo mercado imobiliário, só resta aos trabalhadores mais empobrecidos, ocupar as áreas de risco em morros e encostas. As mortes em Pernambuco não são obra da natureza, mas consequência da desigualdade na ocupação do solo urbano!”, afirma Silvia Ferraro, covereadora em São Paulo, pela Bancada Feminista do PSOL.

Mais do que nunca, além da solidariedade imediata e da cobrança de apoio de todos os governantes para as famílias atingidas, o momento é de lutar em defesa do meio ambiente, combatendo o desmatamento, que cresceu sob Bolsonaro e que acelera o aquecimento global, provocando mais tragédias climáticas como essa, ou mesmo secas e ciclones. O momento é também de combater a desigualdade e o capitalismo, que joga milhares de pessoas em situações de moradia precária, expostas às tragédias das chuvas ou as de incêndios como o que atingiu recentemente uma comunidade em Recife, apostando nas eleições em um outro programa para o país, onde a vida valha mais do que os lucros

Saiba como doar aos atingidos pelas chuvas