Pular para o conteúdo
TEORIA

Em livro, socióloga Isabel Mansur discute a história e as contradições do petismo e do lulismo no Brasil recente

No livro “Corda bamba: O lulismo como metamorfose e realização da estratégia democrático-popular”, lançado em 2021, a socióloga tece um “inventário crítico” do lulismo desde o surgimento do PT, vinculado à redemocratização e ao ascenso das lutas operárias, até o ciclo de governos petistas, onde pôde aplicar o programa democrático-popular. Segundo a historiadora Virgínia Fontes, que assina texto de orelha da publicação, a autora faz um “balanço rigoroso das análises sobre esse percurso” e “destaca os passos em falso do acrobata, ao desviar-se do enfrentamento do capital”.
O livro é uma leitura obrigatória, ainda mais em função da possibilidade de um novo governo Lula, em condições distintas das anteriores, mas preservando a estratégia de conciliação, no qual permanece sempre em uma corda bamba, equilibrando-se entre as classes em disputa.
Leia abaixo trecho do prefácio, assinado por Sara Granemann, professora da Escola de Serviço Social da UFRJ, que participou da banca de doutorado de Mansur, cuja tese é base para o livro.

 


“(…) O argumento de Isabel, em minha compreensão, é herdeiro de sólidas análises críticas amparadas no melhor da tradição marxista formulada – aqui e alhures – para a compreensão, enfatizo-o, da complexa e violenta formação social brasileira. 

De Florestan Fernandes, a autora muniu-se de categorias ideais, discernimentos e análises; parece-me tão verdadeiro que, se não estou em erro, foi nele que a autora encontrou a inspiração. Nas trajetórias tomadas e escolhidas no âmbito do amadurecimento da estratégia democrática-popular – amadurecimento que sabemos ser, no âmbito da vida orgânica e nos períodos e ocorrências da história; ou, dito de modo mais preciso, nos modos de produção, a antessala para o apodrecimento e morte de tudo o que viceja. 

Escolhas da classe trabalhadora, organizadas por si e para si, em um dado momento da luta de classes e em uma particular formação social, importantes ou que almejam algo distinto do que se tornaram não são – lamentavelmente – algo original ou nunca manifesto na história da luta de classes sob o capitalismo. Estratégias podem ser superadas por seu acerto ou acomodadas no seu contrário por numerosas determinações. Todas essas possibilidades são aqui, no texto de Isabel, passadas em revista crítica, livre de suas influências perturbadoras – e olha que desde 2016 elas são numerosas! – tal como o recomendou Karl Marx em seu extraordinário prefácio da primeira edição de O capital. 

Tecer determinações para a compreensão teórico-política do que se tornou a estratégia democrático-popular é o que se deu por tarefa o grupo de pesquisadoras e pesquisadores antes mencionados. Para derrotar – no sentido de sua superação – essa medusa há que se a olhar nos olhos pela via do espelho. O espelho como arma, na tese de Isabel, corresponde à crítica teórica (o inventário) para compreender e mudar o nosso particular mundo e para superar o capitalismo. Sua leitura articula a análise da formação social brasileira, o período recente marcado pela ditadura, a burguesia e seu Estado. Não bastasse, sua análise, no movimento de apanhar a totalidade da vida social brasileira em dado período, toma a indicação de Gramsci, qual seja: pela história de um partido da classe trabalhadora, até hoje o mais importante, temos ao final a história das nossas infelizes páginas dos séculos XX e XXI. 

Se a leitora, se o leitor de suas pesquisas discordar do caminho traçado; se pensar que algo substantivo ou, para outrem, adjetivo deixou de figurar na explicação, isso nem será o mais importante. O que importa é conhecê-lo bem ao jeito de um inventário. Ler o livro é um compromisso para entendermos e lutarmos no presente e para podermos mirar o futuro – nos curto e médio prazos – sem ilusões. No caminho para sua Ítaca (1), Isabel sabe que ele é e foi longo, repleto de aventuras – dores e derrotas –, mas também que a tornou plena de saberes. Um agradecido abraço por seu texto e pela honra de dizer algumas palavras sobre seu muito necessário trabalho.”

Sara Granemann

 

NOTAS

1 – Referência à poesia de Konstantínos Kaváfis (1863-1933), renomado como o maior poeta da Grécia moderna.

Veja informações sobre o livro no site da editora