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BRASIL

Por que o PSOL deve defender a candidatura Lula sem Alckmin e a direita?

Gibran Jordão*, do Rio de Janeiro, RJ
Reprodução

Lula no podcast Podpah

Nessa quinta-feira, às 19h, foi ao ar pelas redes sociais o episódio 295 do PodPah, numa conversa ao vivo com Lula. Esse Podcast tem ótima audiência e é comandado pelos talentosos Igor Cavalari e Thiago Marque. A entrevista era para ter acontecido semanas atrás, mas como naquela data coincidiu com a triste morte da cantora Marília Mendonça, em respeito ao luto que se instalou no Brasil, foi adiada para esse dia 2 de dezembro.

O ex-presidente tem espaços mínimos na grande mídia tradicional, comparando com o tratamento que a Globo, Record, SBT e BAND tem dado e até usado para lançar outros candidatos. E mesmo assim, numa quinta-feira à noite, o seu bate papo com dois jovens negros youtubers, apresentadores do PodPah, atingiu milhões de pessoas, em especial jovens, e foi por um bom tempo, o assunto mais comentado do Twitter, no dia em que o Atlético Mineiro se consagrou campeão do Brasileirão. Isso porque o podcast com Mano Brown e Lula já quebrara todos os recordes no Spotify… E a live de quinta do Bolsonaro, alguém viu?

Segundo publicação do PodPah no Twitter, ao todo, foram mais de 2 milhões de acessos simultâneos durante a live, isso significa que daqui a uma semana, tem potencial para chegar perto da marca de 10 milhões de visualizações.

Lula é resultado das lutas dos anos 80, com sua força e suas limitações…

As lutas operárias organizadas, com alcance de massas, que move centenas de milhões, em muitos momentos históricos acumulam força suficiente para conquistar vitórias que reverberam no tempo… As greves contra a inflação da década de 1980, a luta de massas pelo fim da ditadura e as conquistas alcançadas no texto da constituição de 1988 foram produtos de vitórias da classe trabalhadora que vivia um ascenso de lutas naquela época. Houve um salto organizativo da esquerda brasileira, covardemente esmagada pela ditadura no período anterior. A fundação do PT e da CUT, o surgimento de milhares de novas lideranças nos movimentos sociais e na juventude também foram vitórias por direitos civis e democráticos.

Como também todas essas lutas dos anos 1980 forjaram uma liderança que se tornou um dos maiores símbolos da esquerda brasileira e mundial contemporânea. Que já governou o país, já foi preso e depois teve todas suas condenações anuladas, hoje lidera todas as pesquisas de opinião para Presidência da República, sendo até agora a única alternativa de esquerda que pode derrotar Bolsonaro eleitoralmente, leia-se: derrotar o neofascismo que governa! Ou seja, Lula é uma conquista histórica da classe trabalhadora que reverbera no tempo…

Há uma possibilidade real da chapa Lula/Alckmin acontecer…

Embora a simbologia de Lula no universo da esquerda brasileira seja uma vitória histórica da classe trabalhadora, isso não significa que estamos falando que se trata de um triunfo definitivo contra as forças do capital, longe disso. Há muitas fragilidades e limitações nesse processo, a direção do PT e o próprio Lula defendem um projeto de conciliação e alianças com a direita e setores da burguesia. Não apostam na mobilização social dos trabalhadores como instrumento de transformação social e luta política para governar. Querem e estão decididos a construir uma chapa de coalizão, e em caso de vitória, governar com as forças do capital. Se vão conseguir, dependerá da luta política que se desenvolve no país…

Porém a crise interna do PSDB, provocada pelo espaço ocupado pelo bolsonarismo, e com a vitória de Dória nas prévias, abriu uma possibilidade de deslocamentos políticos. Caso Alckmin se decida pela filiação no PSB, as negociações da chapa entre petistas e o quase ex-tucano vão sair do mundo das especulações e entrar na esfera da realidade concreta. O que seria um derrota política importante para a construção de uma frente de esquerda encabeçada por Lula e com um programa de enfrentamento contra a extrema direita e o neofascismo.

O que fazer diante de uma possível chapa Lula/Alckmin?

Ainda existem setores na esquerda que desconsideram todo o cenário perigoso que envolve a força que a extrema direita alcançou no país, e ao mesmo tempo, menosprezam a imensa influência que Lula tem sobre o conjunto do povo trabalhador e da juventude. Não compreenderam até agora que a tarefa prioritária e histórica no momento é derrotar o bolsonarismo, e já que não estamos no mesmo ascenso de lutas da década de 1980, vai ser necessário apostar também na luta politica no terreno institucional. Mais quatro anos de Bolsonaro ou de Moro no poder pode nos colocar diante de um retrocesso histórico, e derrotas também reverberam no tempo…

Nesse momento milhões de pessoas estão depositando esperanças na candidatura de Lula, não só para derrotar Bolsonaro, mas para melhorar as suas condições de sobrevivência, num país tão machucado, magoado e faminto em todos os sentidos. Isso significa que qualquer organização de esquerda, que quiser dialogar com alcance de massas com o povo trabalhador, precisa entender o sentimento majoritário que está no imaginário publico. E a partir desse ponto de referência, fazer recortes, demonstrar diferenças, críticas coerentes e outros caminhos que possam ser ouvidos e ganhar engajamento que tenha consequências politicas. No caso do PSOL, embora seja um partido muito reconhecido na esquerda brasileira, ainda tem um alcance inferior ao PT, mas poderia cumprir um papel especial nesse momento. Como também os setores do PT que são críticos a aliança com Alckmin e às capitulações à direita, também podem exercer uma força de pressão virtuosa, que derrote em muitos aspectos a política de conciliação da direção petista.

A vitória eleitoral de uma frente de esquerda encabeçada por Lula, com um programa de enfrentamento ao neofascismo, seria um acontecimento político muito importante para impor uma mudança na correlação de forças que permita interromper o ciclo de derrotas que a classe trabalhadora e a esquerda vêm sofrendo no último período. Mas essa frente não vai acontecer por mudanças dos astros e nem pela vontade da direção do PT – será uma imposição da luta política, que precisa ter iniciativa, campanha e forças atuantes. A melhor localização para o PSOL e para a esquerda nesse momento é reivindicar a candidatura Lula, no marco de uma frente de esquerda e apoiada na luta dos movimentos sociais, sem Alckmin ou aliança com a direita. Pois é uma tática política que tem aceitação na própria base petista, gera simpatia, tem adesão e pode ter consequências progressivas.

Caso contrário, a outra opção é ignorar, como se não tivesse nenhuma importância deixar milhões de jovens e ativistas da classe trabalhadora naturalizarem como normal uma aliança Lula/Alckmin, se desmanchando no ar a bandeira da frente de esquerda contra o neofascismo. Restando apenas nos lançar num confortável isolamento de uma candidatura própria à Presidência, que não dialoga com quase ninguém, sem influência de massas, posicionando-se num espaço marginal e que certamente terá inclusive consequências legais e institucionais. Ou agora, não tem mais nenhuma importância a luta parlamentar e institucional? O coeficiente eleitoral como um instrumento de exclusão antidemocrático não merece nenhuma preocupação?

Tentar provar uma moral mais combativa, mais de esquerda ou mais revolucionária, não terá nenhuma utilidade nos próximos anos se a extrema direita avançar no país, ou se a política de conciliação de classes da direção petista for a única proposta da esquerda com alcance de massas na disputa política da opinião pública. Ou o nosso time entra com tudo para ganhar corações e mentes para a política da frente de esquerda, ou o PSOL e outros setores da esquerda vão se localizar mal para apresentar uma alternativa consequente para enfrentar a extrema direita.

O Brasil está em recessão econômica, a fome se alastra, a inflação castiga, o desemprego não recua, o pesadelo social é angustiante, e a extrema direita demonstra resiliência, força política e tem ainda muitas cartas para jogar. Não deveria ser motivo de dúvida ou vacilação defender uma frente de esquerda nas lutas e nas eleições nesse momento perigoso da luta política no país. O sectarismo esquerdista somado ao oportunismo conciliador tem poder para nos conduzir rumo a uma derrota com consequências históricas, mas ainda há tempo de rever os rumos.

*Gibran Jordão é membro da direção nacional da Resistência/Psol.

EDITORIAL

Por uma candidatura Lula sem Alckmin e a direita