Pular para o conteúdo
BRASIL

Presos relatam humilhação e tortura policial após chacina no Jacarezinho

Defensora afirma: “Foram relatos de uma das maiores violações de direitos que já vi na minha carreira”

da redação
Reprodução

Nesta quinta-feira, 27, foram revelados trechos dos relatos de seis presos durante a chacina no Jacarezinho, nos quais são descritos casos bárbaros de tortura e violência policial. O material foi coletado durante as audiências de custódia. Além de agredir com chutes no rosto, joelhadas e com fuzis, a polícia é acusada de obrigar as vítimas a carregarem pelo menos dez corpos, alguns com vísceras expostas e faces dilaceradas.

Um dos detidos contou que foi levado até um beco onde estavam muitos corpos e chegando lá um policial teria empurrado seu rosto como se o fosse esfregar “nas tripas do moleque que estava para fora”. Outra vítima relatou a agressão com as armas policiais. “[Fui agredido] Sim. Com fuzil. Na cabeça, nos braços e nas costas”, afirma. Suas marcas, porém, não teriam sido registradas no exame médico na ocasião. 

A defensora pública Mariana Castro, coordenadora do Núcleo de Audiências de Custódia, participou das sessões e afirma que um dos presos ainda narrou ter visto policiais assassinando dois homens dentro de uma casa, na ação do dia 06 de maio. “Foram relatos de uma das maiores violações de direitos que já vi na minha carreira. As narrativas foram de muito sangue, muitos mortos pelo chão, carregar corpos enviscerados, além das agressões psicológicas e físicas. Foi bastante impactante”, declarou no dia das audiências, conforme reportagem do jornal Folha de S. Paulo. Ao menos quatro dos presos são negros e têm entre 21 e 33 anos e a maioria responde por tráfico de drogas.

Na quarta-feira, 25, a Polícia Civil divulgou que impôs um sigilo de cinco anos em informações de todas as operações relacionadas ao período em que o Supremo Tribunal de Federal (STF) restringiu a ação policial nas favelas devido à pandemia. Os nomes dos policiais envolvidos na operação que deixou 28 mortos no Jacarezinho não foram revelados. 

Intimidação e cena do crime alterada

Presos disseram que algumas das agressões não constam no corpo de delito porque as vítimas teriam se sentido constrangidas com a presença de policiais no Instituto Médico Legal (IML) durante a realização do exame. Além da crueldade e humilhação, há ainda evidências que comprometem a perícia que a polícia fez no local.

Os depoimentos coincidem com a afirmação feita pela Defensoria Pública no dia seguinte a chacina, quando afirmou que pelo menos três cenas de crime haviam desfeitas antes que a perícia pudesse chegar. Em uma delas, segundo a defensora Maria Júlia, o corpo de um homem que foi morto numa via pública foi retirado – uma foto mostraria o homem já morto numa cadeira e em outra, que teria sido tirada mais tarde, a mesma cadeira aparece ensanguentada, já sem o corpo.

Criminalização de liderança

Após a chacina, a Polícia Civil fez uma coletiva defendendo a ação no Jacarezinho e o governador Claudio Castro, desde então, tem se pronunciado na defesa da operação. Ao mesmo tempo, fake news foram divulgadas e repercutidas na imprensa contra Rumba Gabriel, liderança comunitária histórica do Jacarezinho, militante do PSOL e defensor dos Direitos Humanos e assessor da deputada estadual Dani Monteiro, presidenta da Comissão de Direitos Humanos. Em nota, a deputada considera que a acusação faz parte de uma estratégia para desviar o foco das investigações sobre a Chacina do Jacarezinho.