Isabel Cristina, mulher negra e lutadora

Katia Ferreira*, do Rio de Janeiro, RJ

Auxiliar de Serviços Gerais do MS, nascida e criada em Duque de Caxias, no Rio de Janeiro, Isabel Cristina foi casada, mãe de 3 filhos e avó. Daquelas que deu certo em uma família dirigida por mulheres negras e fortes. Não podemos esquecer de Maria Helena, sua mãe. Se tratavam pelos nomes, não tinha esse papo de mãe, se chamavam pelos nomes.

Surgiu em uma assembleia no local de trabalho, Pam 404, na Brigadeiro Lima e Silva no Centro de Caxias. Logo vimos o seu potencial, como ela dizia: ” É BOM SER MULHER NEGRA”.

Começou sua militância na base da Saúde Federal do Sindsprev/RJ. Partidariamente, começou na Convergência Socialista, PSTU e por último estava no PSOL.

No ano de 1994, foi para a Conferência Interamericana Pela Igualdade Racial, em Salvador. Quando voltou, decidiu militar no Movimento Negro. A primeira coisa que fez foi tirar o seu apelido. No seu local de trabalho, todos a chamavam de XUXA, disse que a partir daquela data ela se chamava ISABEL CRISTINA. Quem a chamasse pelo apelido, ela iria ignorar.

Criou o Departamento de Gênero, Raça e Etnia no Sindsprev/RJ e logo fez parte  da Comissão Antirracista da CUT/RJ. Acreditava também que a questão racial tinha que ser unificada na esfera sindical, organizando vários encontros e debates com as categorias organizadas e não organizadas no Rio de Janeiro.

Foi dirigente do MNU e do Movimento de Mulheres Negras. Era daquelas que quando fazia uma intervenção, se fazia um silêncio sepulcral. Convencida da política, aplicava até às últimas consequências.

Tinha outra característica: sua religiosidade. Em momento algum escondia. Camdomblecista na veia, pedia licença das tarefas para “deitar o santo”. Vestia branco às segundas e sextas-feiras. E os turbantes? Cada um mais lindo que o outro. Que saudades…

A vida era dura com ela. Tinha dias de chorar, porque saía de casa e deixava arroz e ovo para as crianças se alimentarem. Era muito prole, mas rapidamente enxugava as lágrimas, abria aquele sorriso e dizia: “vamos mudar isso, é pra isso que milito”.

Para Isabel, tarefa dada era tarefa cumprida.

Tinha sempre uma política para tocar em prol da luta antirracista e por uma saúde pública e de qualidade.

Transitava em todos os setores do movimento, dos mais à direita à extrema esquerda. Nos fóruns, disputava a política e, perdendo ou ganhando, logo estava ela sorrindo com os companheiros adversários.

Uma das suas pérolas: entrava no avião e a tripulação só falava com ela em inglês. Não conseguiam imaginar que uma mulher preta, pobre e de Caxias pudesse andar de avião. Bizarro, né?

Era conhecida como a Rosa Negra do Movimento Sindical. Tinha um brilho próprio. Onde chegava abalava. Pelo sorriso e respeito.

Uma das suas últimas empreitadas foi fazer o Intercâmbio dos sindicalistas negros com a Comunidade Angolana. Dizia que a luta racial é internacional e que tínhamos que saber e conhecer tudo sobre o nosso país de origem.

O Cônsul de Angola foi no seu enterro… era danada!!!

Já pensaram se ela estivesse viva vendo o que foi o Movimento Vidas Negras Importam? Deve estar muito feliz.

Mas tinha uma saúde frágil. Era cardiopata grave, tinha o coração grande na essência da palavra. Fazia tratamento no INCOR de São Paulo. O tratamento era para o coração parar de crescer, sabia que podia ir a qualquer momento, podia dormir e não acordar.

Por isso, vivia tão intensamente. Só tinha que dormir e ver os filhos e, por último, a neta.

Estava na fila do transplante, mas quis os Orixás que ela nos deixasse no dia 30 de março de 2009. Acordou, falou com a irmã e voltou a dormir… não acordou… aos 43 anos.

ISABEL CRISTINA, PRESENTE!!!!!

 

*Militante da Resistência Feminista do Rio e da Resistência/Psol