Pandemia na América Latina: mortes avançam e vacinação é lenta

Ge Souza, Rio de Janeiro (RJ)
EBC/Tomaz Silva

Imagem de momento da pandemia, no Brasil. O relatório Panorama Laboral adverte que a crise está exacerbando os altos níveis de desigualdade que existiam antes do início da pandemia.

Enquanto escrevo este artigo o mundo contabiliza números dramáticos na pandemia de Covid-19. São 120.383.174 de casos confirmados e 2.664.383 mortes. Foram vacinadas 363.691.238 pessoas ou 4,7% da população mundial! Muito pouco diante do sofrimento e incerteza de bilhões de pessoas em todo o mundo.

Covid-19 no mundo

Região da OMS

Casos confirmados

% Casos

Mortes

% Mortes

Américas: Norte, Central e Sul

53.160.109

44

1.277.554

48

Europa

41.563.117

34,5

916.160

34

Ásia e Sudeste Asiático

13.986.486

12

213.298

8

Mediterrâneo

6.972.925

7,6

151.561

6

África

2.965.203

2,5

75.213

3

Oceania

1.735.334

1,4

30.597

1

Total

120.383.174

100

2.664.383

100

Fonte: OMS – 17/03/21 (https://covid19.who.int/)

Os EUA, com 29 milhões de casos confirmados e 531 mil mortes, e o Brasil com 11,5 milhões de casos e 283 mil mortes representam, somados, 34% dos casos de contaminação e 30,5% das mortes no mundo. Os dois países juntos representam 7% da população mundial.

A União Europeia e o Reino Unido, com 27 países, representam 7% da população mundial, mas 34,5% dos casos confirmados e 34% das mortes por Covid-19 no mundo. Os casos de Covid-19 e as mortes estão concentrados no continente americano e na União Europeia, com 78,5% dos casos e 82% das mortes. Embora seja uma crise sanitária global, a pandemia do Corona vírus atingiu brutalmente as principais economias do mundo, trazendo o aumento da miséria e da fome para milhões de pessoas.

América Latina e Caribe: aumento da contaminação, das mortes e da miséria

Apesar de representar apenas 8% da população mundial (700 milhões de pessoas), a América Latina e o Caribe são uma das regiões do mundo mais afetadas pela pandemia, registrando 18% dos casos de Covid-19 (20 milhões de infectados) e 25% das mortes (667 mil pessoas) de todo o mundo. O Brasil, pela política genocida do governo Bolsonaro é responsável por 56% dos casos e 42% das mortes na região.

Como em todo mundo, a economia latino-americana e caribenha entrou em crise com a pandemia. Segundo a Cepal/ONU, a região já amargava um crescimento de 0,3% do PIB entre 2014 e 2019. A pandemia só fez piorar essa situação. Em 2020, o PIB caiu 7,7%, a maior contração em 120 anos, e as previsões para 2021 são de um crescimento 3,7%, o que não recupera as perdas anteriores, havendo possibilidade de recuperação apenas em 2024. Segundo dados do BID, as exportações na região sofreram uma contração de 20% e as importações de 19%, em função da queda nas vendas de combustíveis e o aumento do preço internacional da soja. O endividamento dos países aumentou muito, o que vai dificultar a recuperação econômica futura.

O desemprego na região atingiu 44 milhões de pessoas, segundo a OIT. Entre os jovens o desemprego é de 31%. O desemprego entre as mulheres retrocedeu a patamares de 10 anos atrás, sendo estas as que mais sofreram retrocessos em seus direitos na crise sanitária.

A taxa de extrema pobreza atingiu em 12,5% e a taxa de pobreza alcançou 33,7% da população com um total de 78 e 209 milhões de pessoas, respectivamente, segundo a Cepal.

Vacinação atrasada

A região tem 33 países, mas apenas 18 iniciaram a campanha de vacinação de suas populações. Das 364 milhões de doses aplicadas no mundo, 6% foram na América Latina e Caribe, ou seja, 0,03% da população nesta região já foi vacinada com pelo menos uma dose. Todos os analistas econômicos apontam que a recuperação econômica da região (e do mundo), depende fundamentalmente da vacinação em massa, o que ainda está longe de acontecer.

Os motivos da baixa vacinação são, em primeiro lugar, o atraso dos governos nas negociações com a indústria farmacêutica, para adquirir doses em quantidade suficiente para imunizar pelo menos 70% da população. Em segundo lugar, há um atraso mundial na fabricação e distribuição das vacinas e dos insumos para fabrica-las, e mesmo os países ricos, que neste momento já negociaram as doses necessárias para a sua população, estão com dificuldades para receber a quantidade comprada. Em terceiro lugar, os governos da região, pela crise econômica, dependem da distribuição de vacinas da OMS, através do consórcio Covax, que pretende distribuir para os países mais pobres do mundo, 20% das doses necessárias. Este percentual representa vacina para 35 milhões de pessoas ou 0,05% de toda a população latino-americana e caribenha, o que é muito insuficiente. Nesta crise se revelou mais uma vez a incapacidade do capitalismo em resolver os problemas essenciais da humanidade.

Quadro da vacinação na América Latina e Caribe

Países

Doses aplicadas a cada 100 pessoas

Chile

16,78

Barbados

7,67

Brasil

3,67

Costa Rica

2,07

Argentina

1,99

Panamá

1,84

México

1,62

Peru

0,67

Guiana

0,24

República Dominicana

0,24

Colômbia

0,13

Bolívia

0,09

El Salvador

0,09

Equador

0,05

Trinidad e Tobago

0,03

Fonte: O Globo/Cepal – 28/02/21

Os países que não começaram a vacinação: Antígua e Barbuda, Belize, Cuba, Haiti, Bahamas, Guatemala, Honduras, Jamaica, Nicarágua, São Vicente e Granadinas, Uruguai. Na região apenas Cuba está desenvolvendo sua própria vacina, já estando na fase três de testes. O Brasil tem acordo de produção de vacina com dois laboratórios – Coronavac/Butantã e Oxford/Astrazeneca/Fiocruz, mas isto ainda não começou. Atualmente o País faz apenas o envasamento das vacinas. A Venezuela começou sua campanha de vacinação no dia 18/02, tendo sido aplicadas 60 mil doses da vacina Sputinik V, de um total de 2,5 milhões de doses adquiridas através do consórcio Covax/OMS.

Um programa de luta para enfrentar as crises sanitária, econômica e ambiental

O que vemos hoje no mundo é a combinação de uma crise sanitária, econômica e ambiental sem precedentes. O capitalismo para resolver as crises que provoca age como sempre: busca salvar os negócios dos grandes capitalistas, enquanto a classe trabalhadora e os pequenos negócios pagam mais uma vez a crise com desemprego, redução de salários, retirada de direitos, falência e precarização do trabalho. Os setores mais oprimidos pagam pela crise duplamente, ao serem atingidos economicamente e por todo tipo de discriminação e violência. Como sempre, as riquezas são apropriadas individualmente pelos capitalistas e as crises “socializadas” com a maioria da população pobre e oprimida.

É preciso e possível mudar essa realidade. Não queremos mais austeridade ou endividamento do nosso futuro. Que a minoria que se enriquece à custa de nossas vidas nos devolva tudo o que nos pertence. Não pagaremos uma segunda vez pela crise produzida pelos mais ricos. E exigiremos que qualquer plano de resgate tenha como eixo central a garantia de emprego, salário e condições de vida à maioria da população – e não a salvar bancos, o agronegócio e as grandes empresas.

Os trabalhadores devem se unir para lutar para que os capitalistas paguem pela crise, como temos visto em tantas mobilizações pelo mundo. Sigamos os exemplos recentes do Paraguai e Líbano que tomaram em suas mãos a solução para a crise pandêmica, a falta de vacinas e o aumento da miséria, indo às ruas para exigir soluções para a maioria do povo pobre, lutando pela queda de governos, como no Paraguai.

Que os ricos paguem pela crise. Queremos a taxação das grandes fortunas; expropriação das empresas que falirem e que estas passem a ser administradas por seus trabalhadores; cancelamento das dívidas externas dos países semicoloniais e dependentes; defendemos créditos com juros negativos para as pequenas e médias empresas, que empregam grande parte dos trabalhadores em todos os países.

Por um combate efetivo à pandemia. Em defesa do isolamento social e do lockdown, se necessário – como forma de impedir a ampliação do contágio e o colapso dos sistemas de saúde; vacinas gratuitas para todos, já; pelo fim das patentes sobre medicamentos, produtos e equipamentos; pela estatização das grandes empresas de saúde privada e das grandes indústrias farmacêuticas de forma a atender a saúde da população e não os lucros; por investimentos maciços que garantam um sistema de saúde público e gratuito, único e nacionalizado, controlado pelos trabalhadores (usuários e especialistas).

Em defesa dos direitos e de melhores condições de vida dos trabalhadores e seus setores mais oprimidos. Que a quarentena seja acompanhada pela garantia plena da sobrevivência por parte do Estado; por programas de suporte aos que perderam seu emprego, aos precários que não têm contrato regular de emprego, aos que trabalham sob formas disfarçadas de assalariamento como a chamada economia “uberizada”, aos migrantes internos, aos imigrantes indocumentados; pela proibição das demissões e do rebaixamento salarial; que o Estado garanta os salários dos que perderam o emprego ou a renda dos milhões de autônomos e/ou informais que perderam a renda; não à redução de direitos laborais e sociais; fim da desigualdade salarial entre homens e mulheres/negros (as): salário igual para trabalho igual; contra a violência à mulher: pela inclusão dos serviços de denúncia e suporte para mulheres vítimas de violência, como parte dos serviços essenciais que devem ser ofertados pelo Estado.

Em defesa do meio ambiente e dos povos originários. Contra a transformação da natureza em ativo financeiro: pela propriedade estatal sobre todas as riquezas naturais; que a exploração da terra que respeite os limites da natureza e a vida dos povos originários e pequenos camponeses; por um cerco sanitário que garanta os direitos e proteja as nacionalidades e povos originários; pela anulação dos tratados de livre-comércio que destroem a produção agrícola familiar; pela expropriação/estatização das empresas do setor de energia fóssil, mineradoras e demais empresas poluentes e de armamentos, e sua colocação sob o controle dos seus trabalhadores.

Unidade e solidariedade e internacional. O caráter internacional da economia e da política determinada pelo imperialismo exige também uma resposta internacional por parte dos trabalhadores e aliados, e de seus setores mais oprimidos. Para enfrentar as ameaças à vida e à sobrevivência é urgente uma agenda que unifique ações globais, particularmente dos movimentos em defesa dos direitos das mulheres, contra o racismo e pelo clima; é urgente também a unidade dos países devedores: contra as dívidas externas odiosas e ilegítimas. Fora todos os governos que exploram e oprimem a classe trabalhadora. Que se vão todos!