A decisão do ministro Edson Fachin, do STF, de anular as condenações de Lula da Silva na Lava-Jato e restaurar seus direitos políticos representa uma relevante vitória democrática, certamente a mais importante dos últimos anos. A condenação e prisão de Lula, ao arrepio do devido processo legal, foi peça chave na ascensão de Jair Bolsonaro ao Palácio do Planalto. A ordem bombástica de Fachin provavelmente tem como objetivo preservar a Lava-Jato do julgamento da suspeição do ex-juiz Sérgio Moro, que deve ser pautado na 2a turma do STF nessa terça-feira, dia 9, podendo, a depender do resultado, desmoralizar por completo a República de Curitiba. Em todo caso, a decisão de Fachin, que deve ser confirmada no Plenário do STF, produz uma reviravolta no tabuleiro político, ao colocar Lula novamente no centro do palco.
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Para se ter dimensão exata do que está em jogo, é preciso ter em conta o significado da Lava-Jato na vida nacional nos últimos seis anos. Como se sabe, a operação persecutória foi fundamental para a desestabilização e o impeachment de Dilma Rousseff. Com a consagração do golpe parlamentar, Michel Temer colocou em marcha um programa de destruição de direitos sociais e trabalhistas. Nesse período, por exemplo, foram aprovados a Reforma Trabalhista, a Emenda do Teto dos Gastos, diversas privatizações e a intervenção militar no Rio de Janeiro.
Em 2018, apesar da ofensiva reacionária, Lula aparecia em 1o lugar nas pesquisas para a corrida presidencial. Sua prisão, antecedida e acompanhada de uma brutal e frenética campanha midiática de criminalização do PT e do conjunto da esquerda, abriu as portas para o crescimento da candidatura de Jair Bolsonaro. No segundo turno, a Lava-Jato e a burguesia brasileira abraçaram o capitão fascista. O juiz que havia condenado Lula, em um processo fraudado, tornou-se Ministro da Justiça de Bolsonaro.
Bolsonaro assumiu a presidência com Lula na cadeia. Nos dois últimos anos, o país convive com um governo genocida, autoritário, neoliberal e perversamente destrutivo. A lista de crimes de Bolsonaro preenchem incontáveis páginas, mas basta, aqui, registrar que a política do atual governo está produzindo uma mortandade sem precedentes no país. Com a pandemia à deriva e a vacinação a passos de tartaruga, mais de 266 mil brasileiros já morreram oficialmente de covid-19. Sérgio Moro e a Lava-Jato romperam com o governo Bolsonaro em meados do ano passado, mas carregarão para sempre a responsabilidade de terem ajudado a levar o genocida ao poder.
Nossa posição contrária às condenações de Lula e pela restituição de seus direitos políticos decorre de uma avaliação — confirmada por evidências materiais reveladas nos diálogos criminosos de Moro e procuradores no aplicativo Telegram — de que a Lava-Jato sempre serviu à ofensiva reacionária da classe dominante e do imperialismo norte-americano contra a classe trabalhadora e a esquerda brasileira.
Essa opinião não apaga as críticas de esquerda que devem ser feitas a Lula e ao PT. A opção de formar governos em alianças com setores da burguesia cobrou seu preço, preservando um regime político corrupto controlado pela direita, e excluindo o protagonismo das mobilizações populares. O programa social-liberal aplicado nos governos do PT, que consistia em garantir altos lucros aos grandes capitalistas com algumas concessões aos trabalhadores, sem reformas de fundo, manteve a estrutura social e econômica capitalista profundamente desigual. A escolha de aplicar um plano de ajuste liberal contra os trabalhadores com Joaquim Levy, logo após a vitória sobre Aécio em 2014, desmoralizou a base social de apoio ao governo Dilma, deixando o PT sem capacidade de enfrentar a ofensiva golpista que se desenhava.
Se a decisão de Fachin for confirmada pelo Plenário do STF, Lula e o PT voltam com força ao centro da disputa política nacional. Esse retorno trará consigo enorme responsabilidade. Qual será a estratégia de Lula e do PT daqui para frente? Apostar na mobilização e organização do povo trabalhador para derrotar o governo genocida de Bolsonaro? Construir o projeto de um governo de esquerda, sem alianças com a direita e a burguesia, para fazer mudanças estruturais ancorado na força da mobilização popular, a única capaz de neutralizar a reação conservadora? Ou Lula e o PT tentarão reeditar as alianças com setores da direita, agradar o mercado financeiro e ficar, de novo, refém da profundamente reacionária burguesia brasileira? Acreditamos que o PSOL, força emergente da esquerda brasileira, tem plena razão quando afirma que é preciso lutar por um governo dos trabalhadores e oprimidos, sem alianças com a direita e sustentado na mobilização do povo, para realizar mudanças profundas em benefício da grande maioria do nosso povo.
ESPAÑOL
Brasil – Una gran victoria democrática
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