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MUNDO

Reintegrar Richie Venton: demitido pela IKEA em Glasgow por defender os trabalhadores da Covid

Por Richie Venton, delegado sindical da Usdaw demitido
Divulgação/Reinstate Richie Venton

Fui demitido pela IKEA [empresa sueca fabricante de móveis] por defender a saúde e a subsistência dos trabalhadores no meio da pandemia da COVID-19 e por cumprir os deveres que qualquer representante sindical decente eleito faria.

Desde fevereiro, eu sempre argumentei que qualquer pessoa doente ou auto-isolada da pior pandemia assassina em um século deveria receber 100% de seu salário médio completo.

Não deveria ser colocado no benefício de doença da empresa; não deveveria ser penalizado com pontos de ausência por doença; não deveria ser excluído totalmente do benefício de doença da IKEA, por exceder o limite de pontos, mas deveria receber seu salário médio completo.

Argumentei que isto era essencial para evitar que os trabalhadores enfrentassem a odiosa escolha entre a ruína financeira ao receber £95 (R$695) por semana, da Statutory Sick Pay (SSP – Seguro por Doença) ou a ruína de sua saúde e a de outros, arrastando-se para o trabalho, potencialmente infectando uma força de trabalho de 540 pessoas.

Quando a IKEA – que obteve lucros de £11,2 bilhões (R$82 bilhões) em 2019 – anunciou que a partir de 1º de junho, os salários seriam suspensos para os trabalhadores licenciados, devido à COVID-19, eu repeti este caso e então informei aos membros do sindicato, que me elegeram como seu representante, sobre os planos da empresa e minha oposição a eles, como seu representante sindical.

Ao fazer isso, fui demitido, sob uma acusação falsa de “quebra de confidencialidade”.

Isto é criminalização da atuação sindical, para limpar o caminho para ataques ainda piores aos direitos e condições do pessoal da IKEA. Não foi por acaso que conseguimos o maior índice de filiação ao sindicato entre as lojas da IKEA no Reino Unido e na Irlanda; mais do dobro de filiações do que a segunda loja mais organizada.

Cerca de uma semana depois de ter sido silenciado e depois demitido, a IKEA lançou uma nova e cruel política de licença por doença – a ser aplicada a partir de 1º de setembro – o que significa que os trabalhadores não receberão um centavo do seguro doença da IKEA após duas licenças em um ano, ou após dez dias no total durante doze meses. Eles terão que viver com £95 (R$695) da SSP.

No início, esta política incluía as licenças por Coronavirus. Era uma receita para desastres, doenças e potencialmente até mesmo morte. Após minha demissão, os membros do sindicato se reuniram, votaram unanimemente para exigir minha reintegração e a reversão destas novas políticas brutais da empresa, e exigiram uma votação de greve.

A publicidade maciça que se seguiu, e a onda de solidariedade de todo o movimento sindical, forçou a IKEA a uma retirada parcial. Eles removeram as licenças do Coronavirus desta política punitiva.

Não é por acaso que esta reviravolta foi declarada em 28 de agosto, no mesmo dia em que a primeira página do Scottish Daily Record expôs a verdade por trás da minha demissão e da brutal política doentia da IKEA.

Esta é uma vitória parcial pela postura que tomei, a solidariedade dos membros do sindicato na IKEA de Glasgow e a vasta solidariedade em torno da campanha “Reintegre Richie Venton”.

Isto significa que todos os trabalhadores da IKEA no Reino Unido e na Irlanda, pelo menos agora, têm a garantia de receber os benefícios do seguro por doença da empresa, com base em suas horas de contrato, sem exclusão através de qualquer limite de pontos, para as licenças por COVID-19.

No entanto, a nova política viciosa de licenças – que poderia significar que alguém fora do trabalho por até dois dias, em duas ocasiões diferentes, vai passer a receber £95 (R$695) da SSP – pois este critério permanece para todas as outras doenças. E eu continuo demitido, privado de minha renda.

Mais de 8.000 pessoas assinaram a petição online, exigindo minha reintegração; mais de 300 sindicalistas, desde representantes e ativistas até líderes nacionais, assinaram a Declaração Sindical Conjunta, iniciada pela University and College Union (UCU – Sindicato das Universidades e Colégios) da Strathclyde; e 49 deputados de 5 partidos diferentes assinaram a Early Day Motion (Moção do Primeiro Dia), apresentada em Westminster, pelo deputado Chris Stephens.

Várias filiais do Sindicato decidiram criar uma campanha e um fundo de solidariedade, chamado Scottish Workers Solidarity Fund (Fundo de Solidariedade dos Trabalhadores Escoceses).

Sou o primeiro delegado sindical de qualquer sindicato na Escócia a ser demitido por resistir às políticas perigosas da empresa em meio à pandemia do Coronavirus. Mas a menos que a política da IKEA seja derrotada, outros empregadores seguirão o mesmo caminho, pois se juntarão à corrida para cortar empregos, cortar salários, reduzir os planos de saúde e de seguridade, sob o pretexto da crise do Coronavírus.

Meu caso revela a terrível situação salarial dos doentes no Reino Unido e a necessidade de uma ação conjunta para 100% do salário médio para qualquer trabalhador doente – e para QUALQUER doença.

Trabalhadores que dependem de £95 (R$695) por semana – dos quais, de qualquer forma, dois milhões de trabalhadores estão excluídos, porque estão abaixo do limite de renda de £120 (R$878), e que é negado a todo trabalhador autônomo – é uma receita para o aumento de doenças e desastres, à medida que a Covid-19 aumente novamente.

Precisamos nos unir para defender a saúde dos trabalhadores e não a riqueza dos patrões!

Acesse o site ‘Reinstate Richie Venton’ (Reintegrar Richie Venton) [https://reinstaterichieventon.com/] para atualizações da campanha, para enviar moções aprovadas em outros sindicatos, para assinar a petição online, etc.

Pedidos de moções por e-mail, mensagens de solidariedade e promessas de doação para o Scottish Workers Solidarity Fund, favor enviar para [email protected]

 

Notas adicionais

Richie Venton foi demitido de seu emprego na loja IKEA em Glasgow, Escócia, em julho de 2020. Venton começou a trabalhar para a multinacional sueca de móveis e entrou para o Union of Shop, Distributive and Allied Workers (Usdaw – Sindicato de Trabalhadores Comerciais, Distribuidores e Aliados) em 2008. Em 2009, ele foi eleito delegado sindical em seu local de trabalho com 400 pessoas. Durante a última década, Venton aumentou a filiação à Usdaw empresa de 15% para 70%. Ele também abriu novos caminhos para ajudar a estabelecer a primeira rede nacional de representantes sindicais na IKEA. Em fevereiro de 2018, Venton foi eleito para um dos dois cargos escoceses, dos 15 membros do Conselho Executivo (EC) da Usdaw.

Venton é bem conhecido por suas décadas de ativismo socialista. Ele foi um dos principais membros da Militant Tendency (Tendência Militante), o grupo trotskista liderado por Ted Grant e Peter Taaffe que trabalhou durante décadas no British Labour Party (Partido Trabalhista Britânico). Nos anos 80, ele foi um dos organizadores, em tempo integral, da área de Liverpool, na época em que as forças em torno do ‘Militant’ lideravam o Liverpool City Council (Conselho Municipal de Liverpool). No final de 1985, o então líder do Partido Trabalhista Neil Kinnock lançou uma caça às bruxas contra o Militant, que ele chamou de ″maggot in the body of the Labour Party″ (um larva no organismo do Partido Trabalhista). Venton e outros foram expulsos do Partido Trabalhista um ano depois.

Em 1992, Venton estava em Glasgow ajudando a coordenar as campanhas eleitorais para o recém-formado Scottish Militant Labour (SML) e seu porta-voz, Tommy Sheridan. Nessa época, Sheridan era um líder da All-Britain Anti-Poll Tax Federation (ABAPTF – Federação Britânica Anti-Poll Tax) e estava na prisão devido ao seu papel em um protesto contra o “Poll Tax” (imposto de votação ou imposto por cabeça). Ele primeiro se apresentou nas eleições gerais como candidato a Glasgow Pollok e ficou em segundo lugar com 6.287 votos (19,3%). Poucas semanas depois, nas eleições municipais, Sheridan e três outros candidatos do SML foram eleitos para a Glasgow City Council (Conselho Municipal de Glasgow). Foi a primeira vez na história escocesa que um vereador foi eleito mesmo quando estava preso.

Venton passou a ser membro fundador do Scottish Socialist Party (SSP – Partido Socialista Escocês) e é o atual organizador nacional do local de trabalho e organizador nacional do partido. Ele escreveu o livro Break the Chains [Quebrar as correntes] (2015) sobre a luta contra a pobreza, o trabalho ocasional, e a necessidade de “unchain the unions” (desacorrentar os sindicatos). Suas outras obras incluem os panfletos 1919 Revolt on the Clyde and the Lagan [1919 A Revolta nos rios Clyde e Lagan] (2019), que cobre as greves maciças que irromperam há um século tanto em Glasgow quanto em Belfast, Irlanda do Norte; Class not Creed, 1968 [A Classe, não Credo] (2018), que documenta o início dos “Troubles” (perturbações) na Irlanda do Norte e o que ele descreve como “a oportunidade perdida da Irlanda para o socialismo, não o sectarismo”; e 1917: Walls Come Tumbling Down [1917: As Muralhas se Desmoronaram] (2017) sobre a Revolução Russa de outubro de 1917 e a ascensão do estalinismo.

Este artigo foi originalmente publicado em inglês como “Sacked by IKEA for defending workers from Covid” [http://www.left-horizons.co.uk/index.php?section=10&page=923] (Demitido pela IKEA em Glasgow por defender os trabalhadores da Covid) em 13 de outubro de 2020 no site da Left Horizons (Horizontes da Esquerda), um site é dirigido e administrado por socialistas que são membros ativos do British Labour Party (BLP – Partido Trabalhista Britânico).

Notas adicionais por Bobby Sparks