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BRASIL

Aulas em EAD e alunos de inclusão, será que há alguma possibilidade?

Paula Nassr*, de Porto Alegre, RS
USP Imagens

EaD na USP

Nesses tempos complicados de COVID-19, ao pensarmos na situação da educação em todos os níveis, preocupa deveras a situação de estresse das famílias e dos educandos ao relatarem as dificuldades em conseguir efetuar tarefas online. Os pais não possuem técnicas para alfabetizarem, por exemplo, a não ser que sejam professores dessa área. Podemos imaginar a situação das mães e pais que, também, estão fazendo trabalhos remotos e, desse modo, não encontram tempo e disposição para auxiliarem seus filhos.

Ademais, há os familiares que estão tendo de sair para trabalhar, que não podem estar em casa com seus filhos. Estamos falando daquelas famílias em que há uma boa rede de wi-fi e um nível de escolaridade que permite que as atividades possam acontecer. Por outro lado, há famílias sem acesso de qualidade ou sem acesso nenhum à internet, sem aparelhos celulares e computadores suficientes e adequados para poderem usar as plataformas de EAD, o que impossibilita que efetuem as atividades em casa, além do que não possuem estrutura e condições econômico-sociais que possam fazer das suas casas espaços para que as tarefas sejam efetuadas da melhor forma.

Outro empecilho é que não podem auxiliar nas tarefas, se o grau que possuem de escolaridade não for compatível com o que os filhos estão aprendendo na etapa escolar. É sabido que o processo ensino-aprendizagem precisa de tempo, espaço e condições que possibilitem o bom aproveitamento do conteúdo e das atividades propostas. E como ficam os alunos com necessidades especiais, que em situações educacionais presenciais, já passam por situações bem adversas?

Alunos com necessidades especiais na educação à distância

Os alunos com necessidades especiais já estão sem suas terapias de forma presencial, o que os desorganiza, pelo fato de saírem das suas rotinas. Não estarem sendo atendidos em suas escolas também causa transtorno e desordem. As atividades à distância não se adaptam de forma adequada a todas as formas de necessidades, as quais vão desde dificuldades visuais, auditivas, de motricidade, locomoção até as cognitivo-intelectuais. As plataformas utilizadas, principalmente nas redes públicas de ensino, não contemplam a diversidade e inclusão. Para sermos bem enfáticos, os espaços educacionais presenciais estão ainda engatinhando quando o assunto é educação inclusiva, imaginem se as atividades remotas irão contemplar as angústias e dificuldades pelas quais passam alunos e familiares que vivem as proezas do processo de tentar se incluírem nas plataformas de educação à distância. Esse grupo sofre, ademais do que já foi relatado anteriormente, também, por não conseguir em casa acessar as técnicas que somente os professores com formação em educação especial e das salas de recursos podem lhe oferecer.

As pessoas com espectro autista, por exemplo, precisam de rotina para se sentirem mais reguladas, para evitar as crises comportamentais. Não estarem indo a espaços que costumam frequentar e não conviverem com as pessoas com as quais estão habituadas, as levam a ter mais crises e dificultam a concentração para realizarem, minimamente, as tarefas adaptadas para elas. Os familiares que precisam atender esses alunos de inclusão se sentem impotentes em relação a todas essas dificuldades. É uma sobrecarga emocional, não poder ajudar um filho e não receber um retorno operacional que faça ser menos frustrante, é desanimador!

No município de Porto Alegre, temos mais de três mil alunos com necessidades especiais matriculados, que precisam de atendimento em salas de integração e recursos, contudo a plataforma Córtex que está sendo implantada para as atividades remotas não oferece nenhum tipo de instrumento adaptado aos casos de inclusão e as professoras e professores não receberam nenhum tipo de capacitação para poderem lidar com essa demanda. Não podemos, como sociedade, como órgãos públicos e privados educacionais, como educadoras e educadores, como pais e familiares fazer de conta que essas dificuldades não existem, em todas as esferas, desde as que apresentam menos dificuldades até as que não apresentam nenhuma possibilidade de ensino-aprendizagem e inclusão. O ensino à distância é uma situação emergencial nesse caso incomum que estamos vivendo, precisamos ter um olhar mais empático, mais realista da demanda, especialmente, das escolas públicas e dos casos de alunos com necessidades especiais.

A vida e a saúde física e mental devem estar em primeiro plano; não podemos fazer com que o espaço de ensino EAD seja reprodutor de ansiedades, frustrações, exclusões e reprovações. E mais: não podemos esquecer que nada substitui o vínculo, a afetividade, as trocas sociais que o convívio nos espaços educacionais oferece; quando essa pandemia passar, que saibamos respeitar mais a Educação, valorizar mais o trabalho dos professores e professoras, que possamos oferecer espaços com mais inclusão, mais acolhimento e aceitação das diferenças.

 

Paula Nassr é professora da rede municipal de Porto Alegre.

 

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