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BRASIL

Karl Marx se casa (1843)

Este é o sétimo texto de uma série sobre a vida de Karl Marx

Wesley Carvalho, de Niterói, RJ

Kreuznach no século XIX. Autor desconhecido.

Com o fechamento da Gazeta Renana, Karl novamente se via na necessidade de se sustentar financeiramente. Através de seus contatos, verificou possibilidades de ocupação na Suíça, Saxônia, Bélgica e França. Do governo prussiano, vieram-lhe duas propostas de emprego. Provavelmente, uma tentativa de cooptar uma das vozes mais críticas contra a monarquia. Karl recusou ambas as propostas. Ainda em março, foi para Holanda visitar um tio e discutir a possibilidade de adiantamento da herança, o que parece ter conseguido, pois teria dinheiro até o resto do ano. Seu plano político e profissional orbitava ainda na imprensa: pretendia lançar um jornal que tivesse “uma honestidade impiedosa”. Em maio, Ruge e Froebel decidiram financiar um novo periódico em que Marx fosse editor[1].

Parte de suas preocupações financeiras resultava do desejo de obter condições de se casar com Jenny von Westphalen. Em carta a seu amigo Ruge, Karl fala não apenas da paixão por sua noiva, mas das pressões que ela e ele vinham passando. O pai de Jenny, Ludwig, era um dos principais amigos de Karl, e havia dado seu consentimento ao noivado. Seu falecimento, entretanto, deu espaço para o meio-irmão de Jenny, o conservador Ferdinando, desaprovar o casamento da moça da família com um ateu radical. Do lado de Marx, sua mãe, Henriette, não vinha tendo boas relações com os Westphalens. Outros familiares também teriam parte na oposição ao casamento, por motivos religiosos e políticos.

Mas as dificuldades de Jenny não se resumiam a isso. Em uma sociedade que só passaria a aceitar mulheres na universidade no início do século XX, ela passou quase toda sua juventude confinada com seus estudos no interior da Alemanha nutrindo expectativas em relação a seu noivo a quem chamava (perdoem bisbilhotar a intimidade do casal) “meu querido javali selvagem”. Até Karl ter condições de se casar, foram sete anos de noivado. Jenny havia demonstrado bastante independência em relação às expectativas sociais sobre mulheres quando, sendo mais velha, se comprometeu com Karl que era então ainda um universitário. Em 1843, ano do casamento, ele era, apesar da pouca idade, uma figura de alta reputação intelectual entre seus conhecidos e havia se projetado desde o ano anterior como um opositor ao governo na imprensa. Andava com cabelo despenteado, barba por fazer e traje abotoado incorretamente. Como sinal de seu radicalismo, fumava charuto em público quando a etiqueta demandava cachimbo em espaços particulares. Jenny tinha 29 anos quando se casou com ele, então com 25. Essa união tem importância não apenas como parte da vida privada de Marx, mas porque ele teria em Jenny uma parceira intelectual e política durante sua vida[2].

Jenny havia se mudado com a família de Tréveris, cidade onde conheceu Marx ainda na infância, para Kreuznach. Ali, em 19 de junho, o casamento se deu em uma igreja protestante, com uma cerimônia com pouquíssimas pessoas presentes. No contrato de casamento, Karl fez duas concessões à noiva. Ela seria beneficiária da futura herança que Marx receberia da mãe. Pelo contrato, Jenny também não tomaria responsabilidade por nenhuma dívida contraída anteriormente ao casamento (e Karl tinha algumas), que também ficava impedida de ser paga com qualquer propriedade comum do casal. Como presente de casamento da mãe de Jenny, receberam um serviço de jantar de prata, enxoval de linho e dinheiro para a lua-de-mel na Suíça, onde estiveram em uma estância bastante popular entre recém-casados. Durante a viagem, que incluiu outros destinos, permitiam que amigos que os visitavam nas hospedarias do caminho se servissem do dinheiro que haviam recebido de presente, o que logo lhes deixou o bolso vazio. Retornaram para Kreuznach, onde viveram temporariamente na casa da mãe de Jenny. Em julho, já estavam esperando sua primeira filha[3].

Decidiu-se que o jornal que Karl e seus companheiros estavam planejando seria sediado em Paris. Antes de partir, entretanto, os recém-casados estiveram ainda por mais algumas semanas na pequena cidade alemã. Neste período, Marx estudou intensamente (como sempre) e produziu manuscritos que evidenciaram mudanças na sua perspectiva política e teórica.

Notas:

[1]              SPERBER, Jonathan. Karl Marx. A nineteenth century life. Londres: Liveright Publishing, 2013. p. 96. JONES, Gareth. Karl Marx: greatness and illusion. Cambridge: Belknap Press, 2016. p. 124.  GABRIEL, Mary. Amor e Capital. A saga familiar de Karl Marx e a história de uma revolução. Zahar, 2013 (capítulo “Kreuznach, 1843”). MCLELLAN, David. Karl Marx: his life and thought. Londres: the Macmillan Press, 1973. p. 62.

[2]              MCLELLAN, David. Karl Marx…p. 64-5;  JONES, Gareth. Karl Marx…p.124; SPERBER, Jonathan. Karl Marx...p. 42, 97;  GABRIEL, Mary. Amor e Capital…(cap. “Colônia, 1842”). SEGRILLO, Angelo. Karl Marx. Uma biografia dialética.. Curitiba: Appris, 2019. p. 58. Ver também nossos textos anteriores “Karl Marx estudante de Direito (1835-1841)” e “Karl Marx: relações familiares e problemas financeiros (1836-1841)”.

[3]              GABRIEL, Mary. Amor e Capital…(cap. “Kreuznach, 1843”); JONES, Gareth. Karl Marx…p. 125; MCLELLAN, David. Karl Marx…p.66; SPERBER, Jonathan. Karl Marx...p.97.

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Vida de Marx