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BRASIL

As investidas do governo Bolsonaro contra a renda emergencial básica

Alana Barbosa Rodrigues*, Micheli Burginski** e Paulo César de C. Ribeiro***

Os ataques do governo do presidente Jair Bolsonaro às condições de sobrevivência da classe trabalhadora, em especial contra as camadas historicamente mais oprimidas, não cessam. No dia 14 de maio, foi sancionada por Bolsonaro a Lei 13.998/2020, que faz alterações na lei que criou o insuficiente auxílio emergencial no valor de 600 reais. A lei 13.998/2020 institui que “o beneficiário do auxílio emergencial que receba, no ano-calendário de 2020, outros rendimentos tributáveis em valor superior ao valor da primeira faixa da tabela progressiva anual do Imposto de Renda Pessoa Física fica obrigado a apresentar a Declaração de Ajuste Anual relativa ao exercício de 2021 e deverá acrescentar ao imposto devido o valor do referido auxílio recebido por ele ou por seus dependentes”. Pela tabela hoje vigente para o Imposto de Renda, isso significa que os beneficiários que tiverem, durante o ano de 2020, renda total superior a R$ 28.559,70, estarão sujeitos a devolução.

A partir do também autorizado na mesma lei, o governo federal vem sinalizando que poderia fazer a extensão do pagamento do auxílio por mais seis meses – originalmente previsto para três meses – mas pagando o absurdo valor de 200 reais.

No momento da sanção, Bolsonaro já havia vetado na lei os itens que garantiam a ampliação do pagamento para setores e segmentos sociais antes não contemplados. Segundo a Agência Senado, o projeto especificava profissões que estariam aptas a receber o auxílio, como motoristas de aplicativos, pescadores, diaristas e ambulantes de praia; a possibilidade do recebimento cumulativo do auxílio com o Bolsa Família; a aplicação, de imediato, do novo critério de renda familiar per capita máxima para recebimento do Benefício de Prestação Continuada (BPC); e a possibilidade de homens solteiros chefes de família receberem em dobro o benefício emergencial.

Passados dois meses e meio desde que o Ministério da Saúde declarou oficialmente os primeiros casos de transmissão comunitária da Covid-19 em território brasileiro, especificamente nas cidades de São Paulo e Rio Janeiro, seguimos com insuficientes e muitas vezes desastrosas medidas por parte dos governos federal, estadual e municipal, para conter o avanço da doença e proteger nossa população. Indicada pela Organização Mundial de Saúde como a mais eficiente medida de proteção das pessoas contra o vírus, as ações de distanciamento social começaram a ser aplicadas ainda em março, mas nunca atingiram um alcance mais amplo. Muitos são os fatores que contribuíram para isso. A inoperância do governo federal e sua postura genocida de minimização da gravidade da pandemia e sua tentativa a todo momento de forçar o afrouxamento das políticas de distanciamento, apoiado por setores da burguesia industrial, comercial e financeira, está entre as principais causas.

O necessário distanciamento social, enquanto não se avança no desenvolvimento de fármacos e vacinas para combater a doença, tem impacto direto para as trabalhadoras e trabalhadores, tanto para os/as que possuem vínculos formais de trabalho quanto – e principalmente – para os/as que trabalham informalmente e sem nenhuma proteção social. De uma hora para outra milhões de pessoas se viram com salários reduzidos ou, numa situação ainda pior, sem qualquer tipo de renda para garantir seu sustento. Embora seja possível observar os impactos nos diferentes segmentos da sociedade, os/as que mais sofrem são a população das favelas e periferias, as pessoas sem moradia e em situação de rua, os/as negros/as, as mulheres, a população LGBTQI+, as populações tradicionais e os povos originários, que foram jogados/as, em muitos casos, numa situação de quase indigência.

As forças políticas de esquerda tiveram papel fundamental na luta para pressionar o Estado a assumir medidas emergenciais de assistência, para que a classe trabalhadora tivesse condições de sustento e de vida. A defesa dos direitos trabalhistas para aqueles/as que tinham vínculo formal de emprego e a criação de uma renda emergencial básica para os/as que ficaram sem renda se destacam entre essas ações. Foi nesse sentido que, depois de muitas cobranças, com atraso e ainda com um valor insuficiente, o Congresso Nacional aprovou o auxílio emergencial no valor de 600 reais.

O governo do Presidente Jair Bolsonaro e do Ministro Paulo Guedes, ferrenhos capatazes dos interesses da burguesia, depois de muito relutar, apresentaram proposta legislativa para um auxílio no valor de 200 reais, o que já demonstrava seu total descaso com a vida de toda a população mais pobre. Bolsonaro moveu todos os seus esforços para impedir que um auxílio maior fosse aprovado, mas, para evitar uma derrota mais desgastante, em acordo com Rodrigo Maia, presidente da Câmara Federal, cedeu ao ainda insuficiente auxílio de 600 reais, mas bem superior ao proposto por ele.

Desde a aprovação do auxílio, todos os tipos de dificuldades foram apresentados pelo governo federal para fazer os pagamentos. A inicial indefinição sobre como cadastrar as pessoas para receber o auxílio, a utilização de um aplicativo que apresentou diversos problemas, uma fila de cadastros que tem ainda hoje em análise mais de 5 milhões de pedidos sem respostas e a negativa de pagamento a mais de 40 milhões de proponentes, mostram algumas dificuldades impostas. Tudo isso indica a má vontade do governo Bolsonaro em pagar para quem realmente precisa, o auxílio que será, para muitos, a única forma de renda no período que durar a pandemia e, muito provavelmente, também no período posterior a pandemia.

As novas medidas aprovadas na Lei 13.998/2020 se somam a esse conjunto de ações criminosas contra a classe trabalhadora. Cabe destacar a responsabilidade da Câmara e do Senado Federal que aprovaram a lei sancionada por Bolsonaro, assumindo assim, mais uma vez, seu papel subalterno em relação aos interesses do capital. Ao aprovar o auxílio no valor de 600 reais, quando havia propostas maiores em análise, ao abrirem a possibilidade de devolução destes valores, ao autorizarem a extensão do benefício, delegando a Bolsonaro e sua equipe a determinação do valor, mostram sua cumplicidade com os interesses do capital.

Ao mesmo tempo em que liberam trilhões para a burguesia que demite e reduz os salários de milhões de trabalhadores e trabalhadoras, estes agentes do capital empurram para a miséria uma significativa parcela da população. Nossa pauta enquanto lutadores/as pelos interesses da classe trabalhadora é pelo imediato aumento do valor do auxílio emergencial e sua extensão pelo período que for necessário e para os segmentos de trabalhadores/as que não foram incluídos, para garantir a vida de nossa classe. Não denunciar e não cobrar essas medidas de forma clara e direta nos colocará na condição de cumplicidade em relação a essas medidas. Devemos exigir os avanços necessários e repudiar de forma clara todas as medidas que retiram direitos e oprimem ainda mais a classe trabalhadora.

* Alana Barbosa Rodrigues é Assistente Social no Hospital Geral de Palmas. Militante do Fórum de Saúde do Tocantins, da Frente Nacional contra a Privatização da Saúde e da Resistência/PSOL/ Tocantins.

**Micheli Burginski é professora do Curso de Serviço Social e do Programa de Pós-graduação em Serviço Social da UFT. Militante do Fórum de Saúde do Tocantins, da Frente Nacional Contra Privatização da Saúde e da Resistência/PSOL/Tocantins.

***Paulo César de C. Ribeiro é Cientista Social e professor da EPSJV/Fiocruz. Militante do Fórum de Saúde do Rio de Janeiro, da Frente Nacional Contra a Privatização da Saúde e da Resistência/PSOL/Rio de Janeiro