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BRASIL

Subnotificação aumenta incertezas em Minas Gerais

Carine Martins e Alexandre Zambeli
Prefeitura BH / Fotos Públicas

Nos últimos dias a imprensa tem dado destaque para MG alegando a lenta propagação de casos de COVID-19 no Estado. Porém os números mostram que a doença vem avançando sim por aqui.

Segundo dados oficiais no boletim epidemiológico divulgado pela Secretaria Estadual de Saúde do estado de Minas Gerais (SES-MG) a quantidade de vítimas pelo novo coronavírus avança com dois dígitos pelo quarto dia consecutivo. Só em 24 horas, de sexta (22) para o sábado (23), a doença matou 16 pessoas. Já são 217 no total.

Os infectados já somam 6.338 casos confirmados, mas aparentemente há uma enorme subnotificação. Pesquisa feita pela UFMG afirma que o número real de casos seria 16 vezes maior que os dados oficiais. Em toda Minas Gerais até o momento só foram feitos cerca de 20 mil testes (Ceará já fez mais de 85 mil). Segundo Zema os testes estão ociosos e se não há procura ele não vai atrás da população. Porém até onde foi divulgado pela SES-MG o número de casos suspeitos já passava de 101 mil pessoas! Ora, se há sobras de testes porque esses casos suspeitos não foram testados? Além do mais é exatamente a prática de “ir atrás” da população e mapear as ocorrências da doença o papel dos governantes e uma importante forma de controle que ajuda o planejamento das equipes de saúde, visto que um caso assintomático tem potencial de disseminação para outras pessoas que podem potencialmente virem a se adoecer de forma mais grave, podendo mesmo evoluir ao óbito. Este mapeamento também pode balizar a reabertura da economia, como tanto quer Zema.

Outra forma de demonstrar o tamanho da subnotificação é observar os dados de ocorrência de casos de Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG). Para se ter uma ideia em MG o número de pacientes internados com síndrome respiratória até o momento aumentou 637% se comparado à 2019. As informações ainda estão desencontradas. Em 13 de maio Minas Gerais tinha o terceiro maior número de internações por SRAG, atrás de São Paulo e do Rio de Janeiro, mas aparecia apenas na 11ª posição na lista dos casos confirmados de covid-19.

 

Tabela: Óbitos por SRAG nos últimos anos em MG (dados atualizados em 18/05/2020)

Fonte: https://bigdata-covid19.icict.fiocruz.br/

 

Há ainda uma lentidão na atualização das informações dos boletins. Um exemplo foi um homem que faleceu no município de Governador Valadares (região norte) em 2 de abril e só teve o óbito incluído no boletim epidemiológico em 14 de maio. Ou seja 42 dias após o falecimento. Infelizmente este não foi o único casos de demora na atualização de dados observado no Estado.

Um fator preocupante ainda é a interiorização da doença. Dos 853 municípios do estado, 376 já apresentam casos confirmados de COVID-19, 89 apresentaram óbitos e a taxa de letalidade vem crescendo (3,4%). Hoje Minas tem cerca de 70% dos leitos clínicos e de UTI ocupados sendo que segundo estudos da Secretaria Estadual de Saúde ainda não alcançamos o pico da pandemia no Estado, o que está previsto para primeira quinzena de junho. Além disso quase 92% dos municípios de Minas Gerais não têm leitos de Unidade de Terapia Intensiva (UTI). Num estado tão grande como o de Minas Gerais o governo precisa urgentemente regionalizar os leitos de terapia intensiva, seja ampliando hospitais ou criando novos leitos de campanha nas sub-regiões.

Política de Zema

Se os números em Minas não expressam o colapso que alguns estados do Brasil já estão enfrentando, não é graças ao Governador Romeu Zema (NOVO). Subserviente à necropolítica do atual presidente, também escamoteou, o quanto pôde a pandemia global atual. Adepto da ideia de que “o vírus precisa dar uma circulada”, desde de a chegada do Coronavirus no Brasil e o início dos protocolos de isolamento social, decretado por municípios mineiros, Zema proferiu diversas críticas aos prefeitos que decidiram seguir as orientações sugeridas pela Organização Mundial de Saúde. Demorou a determinar restrição do funcionamento de serviços não essenciais, ameaçou diversas vezes o retomar às atividades escolares e se furtou de assinar duas cartas em unidade com os demais governadores contra a postura de Bolsonaro, para tentar ter mais espaço junto ao presidente.

Os servidores do executivo estadual estão sofrendo diretamente as consequências da política de Zema que além de atrasar e parcelar salários, ameaça constantemente a volta ao serviço em pleno crescimento de casos de Covid no Brasil e em MG. O sindicato dos trabalhadores em educação conseguiu uma liminar na justiça para suspender as atividades nas escolas, mas ainda assim o governador passou por cima da decisão e implementou as teleaulas.

Mas é a população mais pobre que amarga as piores consequências da pandemia e da falta de política de Zema. Adepto das ideias de estado mínimo, custou a ter alguma medida para a população mais vulnerável. E quando teve foi vergonhosa: disponibilizou tíquete de R$ 50, apenas para alunos da rede estadual cujas famílias estejam incluídas na faixa de extrema pobreza do CadÚnico, e cujo a renda per capita não ultrapasse míseros R$ 89 mensais!!!

A situação de Belo Horizonte 

Desde o início da pandemia Alexandre Kalil (PSD) e Zema se enfrentam publicamente por divergências na forma de governar frente a existência do Covid-19. Após dois meses de isolamento social e restrição do funcionamento do comércio o prefeito de BH decidiu reabrir o comércio em três etapas. A partir de segunda (25) o retorno envolve salões de beleza, lojas do setor de varejo, como móveis, shoppings populares e papelarias. Bares e restaurantes estão fora da fase inicial de reabertura, assim como shoppings centers. Pessoas pertencentes ao grupo de risco não deverão trabalhar. As outras duas etapas de aberturas estão previstas para 1º e 8 de junho (data próxima a estimativa de pico da pandemia em MG).

A cidade tem hoje 1.351 casos de covid-19 e 39 mortes pela doença (23 ainda estão em investigação). Atualmente, segundo a prefeitura, o nível de transmissão é de 1,09. O índice de transmissibilidade é considerado verde entre 0 e 1; amarelo entre 1,0 e 1,2; e vermelho acima de 1,2. A maioria dos casos notificados na cidade ainda se encontram nos bairros nobres das regiões centrais e sul da cidade.

Os outros dois indicadores, leitos de UTI e de enfermaria específicos para covid-19, estão hoje em 40% e 34%, respectivamente. Belo Horizonte tem 867 leitos para a doença, sendo 220 em UTIs e 647 em enfermarias. A prefeitura afirma que, por parceria com hospitais, pode abrir mais 729 de UTIs e 1.752 de enfermaria, a qualquer momento, mas com o avanço da pandemia no interior do estado e a falta de leitos na maioria das cidades não podemos afirmar que será suficiente.

De todo modo, apesar das aparentes divergências com a política estadual e federal, Kalil segue a mesma lógica de imunização de rebanho, negligencia a necessidade de testagem dando espaço pra subnotificação, lava as mão pra situação dos pequenos e microempresários e implementa uma política insuficiente de assistência as famílias mais carentes. A reabertura do comércio é temida pelos próprios médicos da equipe do governo e as consequências começarão a aparecer daqui a 15 dias.

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