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Colunas

Nossa saída é pela esquerda

Frente Única de partidos de esquerda e movimentos sociais deve liderar a luta pela derrubada do governo Bolsonaro

Scarlett Rocha

André Freire

Historiador e membro da Coordenação Nacional da Resistência/PSOL

A atual crise política é explicada principalmente pelos graves erros e os verdadeiros crimes de Bolsonaro diante da brutal escalada da pandemia da Covid-19 em nosso país, que já significou cerca de 300 mil infectados e a morte de mais de 20 mil brasileiros – apenas segundo os dados oficiais, deixando de lado toda a subnotificação existente.

Como parte desta nova conjuntura política, na última quinta-feira, dia 21 de maio, aconteceram dois fatos importantes e contraditórios, que merecem uma avaliação coletiva entre aqueles que lutam cotidianamente para derrotar o projeto neofascista do bolsonarismo.

Por um lado, foi apresentado ao Congresso Nacional um novo pedido de Impeachment. Até aí nenhuma novidade, afinal já existem mais de 30 pedidos para que o parlamento brasileiro abra um processo de crime de responsabilidade contra o atual presidente.

O fato novo deste pedido é que ele foi construído e apresentado de forma unificada por vários partidos de esquerda (PSOL, PT, PCdoB, PCB, PSTU, PCO e UP), importantes entidades sindicais e movimentos sociais. Ao todo foram cerca de 450 assinaturas representativas, e a adesão segue aberta na internet. Até setores da grande mídia vem apelidando esta iniciativa de “megapedido de Impeachment”.

Em outro sentido, também na última quinta-feira, houve uma reunião conjunta entre Bolsonaro, o presidente da Câmara Rodrigo Maia, o presidente do Senado David Alcolumbre e os governadores. Neste evento, o atual presidente moderou seu discurso das últimas semanas, indicando que pode querer uma trégua e uma negociação com outros poderes. Mas, atenção: Bolsonaro já ensaiou movimentos idênticos a este, para depois voltar mais diretamente para a sua estratégia autoritária e golpista de fechamento do regime e ataques às liberdades democráticas.

A moderação das críticas de Maia, Alcolumbre e maioria dos governadores em relação ao governo tem uma explicação de simples compreensão: todos estes estão de acordo com as medidas econômicas de Guedes, de jogar todo o peso da crise econômica e social sob os ombros do povo trabalhador e a maioria da população. Para estes senhores, representantes diretos dos ricos e poderosos, não está colocada a saída de Bolsonaro agora, para eles bastam declarações tímidas criticando os exageros autoritários de Bolsonaro, seus filhos e aliados políticos. Não devemos ter ilusões que saia destes setores alguma atitude real e concreta para derrotar o projeto golpista do bolsonarismo.

Entretanto, o que mais chamou nesta atenção na reunião e nas declarações após o seu término, foi a moderação mesmo dos governadores do PT (Rui Costa, da Bahia), PCdoB (Flávio Dino, do Maranhão) e demais partidos de oposição. Moderar o discurso diante de acenos genéricos de Bolsonaro se revelam mais um erro dos setores políticos que se colocam como oposição as medidas do governo.

Afinal, também nesta semana, por exemplo, Bolsonaro mudou o protocolo sobre uso da Cloroquina, que agora poderá ser prescrita de forma ampla no SUS, mesmo para casos não graves; avançou na militarização da área da saúde, com nomeações de mais 9 militares de alta patente na estrutura deste Ministério; e seguiu implementando sua política de pressão contra o cada vez mais necessário distanciamento social. Ou seja, seguiu avançando na sua campanha sórdida e genocida contra a vida da maioria.

Esquerda e movimentos sociais devem encabeçar a luta pelo #ForaBolsonaro

A análise combinada destes dois fatos não deve deixar dúvidas. Pelo menos até o momento, não existe nenhuma vontade política da maioria dos partidos da velha direita (dita liberal), maioria no Congresso, de defender o fim deste governo. Por exemplo, não existe nenhuma indicação de que Rodrigo Maia faça algum movimento sério no sentido da abertura do processo de Impeachment. Sequer uma CPI para investigar os crimes de Bolsonaro foi aberta, até agora, no parlamento. Uma vergonha.

E, também, partidos de oposição – como PDT, PSB, PV e Rede – que estão a favor da saída pontual do presidente, se negaram a unificar com o pedido unificado de Impeachment, apresentado pelos partidos de esquerda e movimentos sociais.

Uma conclusão é necessária: a luta efetiva para derrubar o projeto neofascista do bolsonarismo, instalado no Palácio do Planalto, está nas mãos da Frente Única dos partidos de esquerda e dos movimentos sociais, que expressa uma aliança de classe, de todos os explorados e oprimidos.

Setores e figuras da esquerda, como o governador do Maranhão, Flavio Dino (PCdoB), entre outros, vem defendendo que a esquerda busque prioritariamente uma aliança com o chamado “centro político”. Para estes, a única forma de derrotar Bolsonaro seria uma aliança política da esquerda com setores da velha direita, apresentados novamente como progressistas. Esta é a verdadeira estratégia da proposta da Frente Ampla.

Para além das diferenças políticas que temos com a estratégia de conciliação de classes, agora reapresentada com o viés da Frente Ampla, os fatos desta semana demonstram a inconsistência desta saída. Dois fatos demonstram diretamente esta afirmação.

O primeiro, o discurso moderado, em defesa de uma pseudo união nacional com o bolsonarismo, de todos presentes na reunião entre os chefes do Executivo, do Legislativo e dos governos de estado, inclusive dos governadores partidos de oposição; o segundo, a negativa de partidos como PDT, PSB, PV e Rede em se somarem ao pedido unificado de Impeachment apresentado pela esquerda e movimentos sociais, mesmo depois de todas as discussões coletivas realizadas com suas direções.

Estes partidos não querem uma ação realmente conjunta com todos os partidos de esquerda com origem nos movimentos sociais da classe trabalhadora. Na verdade, buscam se apresentar com uma alternativa também contra a esquerda, mais palatável para setores da velha direita, como sempre fez e faz uma das principais expressões deste bloco, Ciro Gomes.

Sem abandonar a disposição necessária de realizar ações pontuais e bem concretas contra o bolsonarismo, em conjunto com todos os setores democráticos que estejam realmente dispostos agir contra este projeto neofascista, a esquerda e os movimentos sociais precisam ter cada vez mais um perfil próprio. A proposta de entregar a direção da resistência democrática ao bolsonarismo para setores da direita apresentada como progressista é um gravíssimo profundo político, de graves consequências para a nossa luta.

Nossa tarefa não é nada fácil. Mas, ela é justa e inadiável, e para sua concretização não existem atalhos. Sem a retomada mais geral das mobilizações da classe trabalhadora e da juventude, será pouco provável um desfecho positivo para a atual crise política, que atenda as justas demandas e reivindicações da maioria do povo brasileiro.

Portanto, devemos abraçar uma estratégia oposta, avançando cada vez mais no fortalecimento da Frente Única construída em torno do pedido unificado de Impeachment, seja na agitação política nas redes sociais, no apoio as atuais manifestações dos trabalhadores dos setores essenciais (principalmente dos Trabalhadores da Saúde) e preparando novas manifestações de rua após o período de distanciamento social.

Afinal, nossa luta é para derrotar todo o conjunto da obra ultra reacionária deste governo neofascista. Por isso, a esquerda e os movimentos sociais devem defender que para preservar a vida da maioria, defender os diretos sociais e às liberdades democráticas é urgente a saída imediata de Bolsonaro do governo, mas não com a posse do seu vice, general Hamilton Mourão.

O sinistro general Mourão é cúmplice direto de Bolsonaro nos crimes contra a vida diante da gravidade da pandemia e nos ataques golpistas contra às mínimas liberdades democráticas. Nossa proposta deve ser a antecipação de eleições presidenciais, realmente livres e democráticas, para seguirmos a nossa luta por um governo realmente do povo trabalhador e da esquerda.