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BRASIL

Ritmo de crescimento das mortes no Brasil já é mais de cinco vezes superior à média mundial

Gilberto Calil

O quadro reúne os dados dos 15 países com maior número de mortes registradas. Tomamos como referência principal o ritmo de crescimento do número de mortos, tendo em vista que o patamar de subnotificação dos casos no Brasil inviabiliza qualquer comparação da evolução do número total de casos. Entendemos que o cálculo do ritmo de crescimento é mais revelador do a simples comparação dos números absolutos ou dos índices de mortes por milhão de habitantes, tendo em vista que a expansão do Covid-19 se iniciou em momentos diferentes e a pandemia encontra-se em estágios totalmente distintos.

O ritmo de crescimento mundial do número de mortes vem diminuindo de forma consistente. Há 20 dias era 58%, há 10 dias era 37% e agora está em 24%, uma redução que comprova a efetividade das medidas de contenção através de política de isolamento social adotadas de forma rigorosa em muitos países. 

A situação do Brasil continua se degradando rapidamente. Além de dividir com o México o maior ritmo de expansão das mortes, temos também o maior ritmo de expansão do número de casos, que aumentou 132% em 14 dias. Registramos na última semana 5.736 mortes e 104.200 novos casos, um número altíssimo, considerando-se a baixa testagem. Há 45 dias, 0,5% dos mortos eram do Brasil, e hoje este índice já chega a 6% (mais do que o dobro do percentual da população brasileira em relação à população mundial). Nos últimos dias, entre 15 e 20% dos mortos registrados no mundo eram do Brasil.

O Brasil chega a um ritmo de crescimento que é mais de cinco vezes superior à média mundial em 14 dias, tendo crescido 122%, abaixo apenas do México (126%) e muito superior a todos os países que vêm na sequência: Canadá (43%), Suécia (30%) e Estados Unidos (27%). Todos os países diminuíram o ritmo de expansão em relação ao levantamento de dois dias atrás, mas é impactante a diferença entre os índices do Brasil e do México em relação aos demais países. Os Estados Unidos seguem diminuindo diariamente o ritmo de expansão, e embora permaneçam com perto de 30% das mortes diárias do mundo, já reduziram o percentual de novos casos a 20% do total mundial. Dois terços dos países tiveram aumento do número de mortes inferior a 20% no período de 14 dias, o que conjuntamente com nítida redução dos novos casos e do número de casos ativos indica uma expressiva melhora do quadro. A China registra apenas uma morte há 24 dias.

Brasil e México são, também, disparadamente os dois países com menor número de testes. O número de testes por milhão de habitantes que Brasil (3.462) e México (1.442) é absolutamente inexpressivo e várias vezes inferior aos demais países com números análogos de mortes e casos. Na relação entre testes realizados e resultados positivos, o Brasil tem números ainda piores, com 2,5 testes realizados por resultado positivo.  

O elevado ritmo de crescimento das mortes no Brasil contraria a tendência internacional de melhora da situação e indica um enorme agravamento do quadro nacional. Já tendo passado de 19.000 mortes oficializadas, o país deveria ter já um ritmo de crescimento diário de novos casos abaixo de 1% para ao menos ter a expectativa de começar a reduzir o ritmo de crescimento das mortes em duas a três semanas. No entanto, o crescimento de casos vem aumentando 6% a 7% ao dia. Tornam-se cada dia mais urgentes políticas efetivas de isolamento social e inclusive de lockdown em várias regiões. Medidas deste tipo foram adotadas por todos demais os países muito antes de chegarem no trágico patamar em que estamos no momento. Nosso isolamento social continua sendo relaxado e sabotado pelas autoridades federais, com cumplicidade explícita do grande empresariado, produzindo a conjunção trágica entre altas taxas de crescimento das mortes e dos novos casos, em um cenário de subnotificação generalizada. No país, os números de mortes e de casos estão dobrando a cada 12 dias, enquanto no mundo em ambos os casos os números dobram em 30 dias. Somos já o segundo país com mais mortes diárias, o segundo país com mais novos casos diários (mas já com números muito próximos aos EUA, que realizam dezenas de vezes mais testes), o segundo país com o maior ritmo de crescimento de mortes (depois do México), o país com maior ritmo de novos casos diários, o segundo país do mundo com maior número de pacientes internados em estado grave (19% do total mundial, mesmo não com números não atualizados há mais de vinte dias)

Os Estados Unidos seguem com um elevado ritmo de aumento das mortes, ainda que com tendência de redução, estando em 27% em 14 dias, mantendo expressivo número de mortes diárias e inúmeros focos regionais. Itália, Espanha, França, Bélgica e Alemanha conseguiram reduzir a expansão dos novos casos a menos de 0,2% ao dia (índice 30 vezes menor que o Brasil). Nos últimos dias, o número de mortes no Brasil já foi superior a Reino Unido, Espanha, Itália, França, Alemanha, Bélgica e Holanda somados.

Outros países, situados na América Latina, África, Ásia e Oriente Médio, embora com número ainda menos expressivo de casos ou de mortes, vêm tendo crescimento bastante superior à média mundial, com perspectiva de rápido agravamento da situação. Dentre estes, tiveram crescimento do número de casos superior a 100% nos últimos 14 dias: Haiti (5.9x), Tajdiquistão (5.6x), Guatemala (2.8x), Kuwait (2.79x), Bolívia (2.49x), Afeganistão (2.4x), Honduras (2.32), África do Sul (2,3x), Bangladesh (2.28x), Chile (2.23x), Congo (2.17x) Índia (2.11x), Omã (2.08x), Catar (2.06x), Gana (2.03x). Outros, com crescimento abaixo de 100% no período, estão já entre os 20 com maior número de mortos: Peru (1.9x), Rússia (1.86x) e Equador (1.25x).

De outro lado, há um crescente número de países com a situação estabilizada e que praticamente não tem tido novos casos, como Coréia do Sul, Taiwan, Vietnã, Nova Zelândia, Eslovênia, Cuba, Uruguai e Paraguai, todos eles com expressiva redução do número de casos ativos. 

É imprescindível e urgente reduzir o ritmo de crescimento do número de casos e do número de mortes no Brasil, pois a manutenção destes índices projeta um cenário cada vez mais terrível. Se por hipótese considerarmos que este ritmo se mantenha o mesmo (2.22 vezes a cada 14 dias), o número de mortes no Brasil atingiria 41.944 em 03/06, 93.117 em 17/6 e 206.720 em 01/07. Não se trata de uma previsão, mas de projeção do que pode ocorrer caso não sejamos capazes de diminuir o atual ritmo de forma muito mais vigorosa. Para isto, são inadiáveis medidas para ampliação do nível de isolamento individual, associadas à garantia de efetivas condições de sobrevivência ao conjunto dos trabalhadores, em especial aos mais precarizados. Um pequeno aumento ou uma pequena diminuição no percentual produz um grande efeito em cascata nos números em dois ou três ciclos, o que reforça a urgência do reforço das medidas protetivas.