Pular para o conteúdo
EDITORIAL

O 1° de maio e os desafios dos trabalhadores

Editorial de 30 de abril de 2020

Em 2020, o 1° de maio, dia de luta dos trabalhadores, acontece num momento em que lutamos, literalmente, por nossas vidas. O novo coronavírus já contaminou mais de 3 milhões e já tirou mais de 200 mil vidas em todo o mundo. Só nos EUA, são mais de 1 milhão de casos confirmados e cerca de 60 mil mortes. No Brasil, alcançamos a marca de mais de 5 mil mortes e mais de 70 mil casos confirmados, com sistemas de saúde já entrando em colapso em várias cidade, dando lugar a cenas dramáticas.

“O vírus não é democrático”: quem mais sofre são os trabalhadores pobres, negros e as mulheres

Dados divulgados pela prefeitura de São Paulo não deixam dúvidas sobre a realidade que se repete por todo o país: o vírus contamina os ricos, mas quem mais morre são os pobres e negros nas periferias. Na cidade com números mais altos da Covid-19 no país, o risco de morrer pela doença é até 10 vezes maior em bairros com piores condições sociais. Apesar do Morumbi, bairro nobre da Zona Sul, concentrar o maior número de casos, é a Brasilândia, bairro da periferia, que tem o maior número de mortos. Os números mostram também que os pretos têm 62% mais chance de morrer por Covid-19 na cidade do que os brancos.

Nas periferias, a contaminação é facilitada pelas condições precárias e a manutenção do isolamento social é dificultado, entre outros motivos, pelo desemprego e trabalho informal e autônomo. Quando infectados, os mais pobres só têm como alternativa o sistema público de saúde, que tem um número menor de leitos de UTI em comparação com o sistema privado e já está sobrecarregado.

A realidade das mulheres, que já era difícil, piorou com a pandemia. No estado de São Paulo, os atendimentos da Polícia Militar a mulheres vítimas de violência aumentaram 44,9% em março de 2020 em comparação a março de 2019. No Rio Grande do Norte, as notificações de estupro e estupro de vulnerável dobraram em relação a março de 2019. No Mato Grosso, os casos de feminicídio quintuplicaram. Se considerarmos que a subnotificação deste tipo de crime já era uma realidade e que se acentua devido à quarentena e ao isolamento social, os dados são ainda mais alarmantes.

No final de abril, mulheres de diversos países lançaram o “Manifesto Feminista Transfronteiriço para sair juntas da pandemia e mudar o sistema”. Além do aumento da violência, o manifesto aponta que “a crise ataca as diferentes condições materiais de reprodução, intensificando e tornando mais precário o trabalho produtivo e reprodutivo (…). Por um lado, o sistema patriarcal descarrega o cuidado dos idosos e das crianças nas mulheres, aumentando o peso do seu trabalho doméstico. Por outro lado, existem muitas mulheres – enfermeiras, médicas, trabalhadoras da limpeza, caixas, operárias, farmacêuticas – que devem estar em primeira linha nesta emergência trabalhando em condições de risco à sua saúde, com longas horas e muitas vezes com salários insignificantes. O trabalho doméstico e de assistência, assim como muitos empregos precários ou informais, é frequentemente realizado por mulheres negras migrantes, afro-descendentes ou indígenas (…)”.

O vírus não é a única ameaça à vida dos trabalhadores

A fome, o desemprego, a retirada de direitos, a redução salarial, a violência doméstica são inimigos perigosos e também mortais para os trabalhadores. No Brasil, temos cerca de 40 milhões de trabalhadores informais. Na pandemia, tendo sua renda muitas vezes reduzida a zero e sem qualquer direito trabalhista, são os que mais sofrem, juntamente com os desempregados, que somavam cerca de 12 milhões no país antes da pandemia, número que infelizmente deve crescer exponencialmente.

O auxílio emergencial de R$ 600,00, maior do que os R$ 200,00 propostos por Bolsonaro, é muito importante e fará diferença na vida de muitas famílias, mas é insuficiente e, infelizmente, está combinado com uma série de medidas provisórias que preveem redução salarial, inclusive com negociação individual entre empregadores e empregados, sem participação dos sindicatos, e que não protegem os trabalhadores contra as demissões.

As tarefas dos trabalhadores e o 1° de maio

Ao mesmo tempo em que a pandemia avança e uma crise econômica e social sem precedentes ameaça os direitos da classe trabalhadora, Bolsonaro mostra ser o principal aliado do vírus: segue com sua postura negacionista, defendendo e trabalhando contra o isolamento social, desprezando o sofrimento de milhares que perdem seus familiares e lançando mão de uma ofensiva golpista contra os direitos democráticos. Hoje, mais do que nunca, para salvar vidas, empregos e direitos democráticos, é necessário tirar Bolsonaro da Presidência.

Não podemos, neste momento, sair às ruas. Mas podemos organizar nossas forças para aumentar a pressão pelo Fora Bolsonaro e Mourão, pela convocação de eleições livres e diretas antecipadas. Nesta luta, não podemos ficar a reboque de figuras como Rodrigo Maia que, mesmo diante de todas as evidências, nega-se a aceitar um pedido de impeachment contra Bolsonaro.

Defendemos a unidade com setores burgueses para lutar por direitos democráticos contra a ofensiva golpista de Bolsonaro. Mas, para lutar pelos direitos da classe trabalhadora, só podemos contar com nossas próprias forças. A convocação de um 1º de Maio unificado das Centrais Sindicais foi uma iniciativa positiva. Mas os convites aos representantes da burguesia foram um grave erro, que inclusive custou a ruptura de alguns setores com o ato, como a Frente Povo Sem Medo, o Fórum Sindical, Popular e de Juventudes de Luta por Direitos e Liberdades Democráticas, a CSP Conlutas e a Intersindical ASS e, portanto, uma divisão entre os representantes da classe trabalhadora.

Dória, que se enfrenta com Bolsonaro pensando em 2022, mas que, em meio à pandemia, nega-se a prorrogar o acordo coletivo dos metroviários, não é aliado dos trabalhadores. Witzel,com sua política de extermínio dos negros e favelados e que, em meio à pandemia, envia para votação projeto de lei que permite privatizar o patrimônio dos trabalhadores, como as universidades públicas e a água, não é nosso aliado. Maia, que comandou a Reforma da Previdência e as votações das medidas provisórias que permitem reduzir nossos salários durante a pandemia, também não pode ser nosso aliado. A defesa das poucas liberdades democráticas contra a ofensiva de Bolsonaro é a unidade que podemos ter com eses senhores.

Por isso, é um grave erro das centrais sindicais a decisão de convidá-los para o ato de 1° de maio da classe trabalhadora. O nosso 1° de maio, data histórica e simbólica de luta, deve ser uma expressão da frente única dos trabalhadores para lutar em defesa dos seus direitos e contra Bolsonaro.

Quem é bem vindo na frente única da classe trabalhadora?

Representantes de setores da burguesia são bem vindos em unidades mais amplas para defesa das liberdades democráticas ou qualquer outra reivindicação pontual que possamos ter em comum com eles. Mas não cabem na unidade da classe trabalhadora em torno ao seu programa de classe, pois aqui temos interesses antagônicos. Na unidade da nossa classe cabem e são necessários todos os seus representantes: centrais sindicais, partidos políticos e movimentos sociais.

Erram aqueles que convidam figuras como Dória, Witzel e Maia para o 1° de Maio da classe trabalhadora. Mas erram também aqueles que querem construir a frente única excluindo Lula e o PT. Isso não é frente única. Não se combate uma direção ignorando-a. Diferenças com o programa de conciliação de classes de Lula e do PT podem e devem ser debatidas no interior da frente única da classe, mas não podem impedir que a frente única se conforme, pois ela é uma necessidade da classe trabalhadora para lutar por seus direitos e sua vida e não poderá representar uma verdadeira unidade da classe se não contar com suas principais direções e lideranças. Evidentemente, erram também as principais direções da classe quando se negam a colocar como sua principal tarefa a conformação da frente única. O PT, a CUT e Lula devem colocar suas forças a serviço desta tarefa estratégica.

A frente única é necessária para que não fiquemos a reboque de lideranças burguesas como Maia, para que não deixemos a classe trabalhadora a mercê da Rede Globo, para que tenhamos condições de apresentar nosso programa de classe e de lutarmos por ele, para que tenhamos condições de assumir o protagonismo na luta contra Bolsonaro. A luta para avançar nesta tarefa é a fundamental e mais estratégica neste momento.

A serviço desta estratégia, neste 1° de maio saudamos e estaremos ao lado, mesmo que por enquanto virtualmente, daquelas e daqueles que lutam todos os dias contra Bolsonaro, mas também contra Dória, Witzel e Maia . Que durante 2020 possamos avançar na construção da nossa frente única. Que em 2021 possamos ter um 1° de maio que unifique a classe trabalhadora em defesa de seu programa.

Viva o 1° de Maio da classe trabalhadora!

Salvar vidas, defender os direitos e empregos, fortalecer o SUS, taxar as grandes fortunas!

Fora Bolsonaro e Mourão! Por eleições diretas e livres antecipadas!*

Golpe não, Ditadura Nunca Mais!

Marcado como:
1 de maio