Um dia depois do Brasil ultrapassar a China na triste marca dos números de óbitos por Covid-19 e o então Presidente da República Jair Bolsonaro dizer literalmente “E daí…” para os brasileiros e seus familiares falecidos pela doença, o governador Romeu Zema (Novo) e sua Secretária de Estado de Educação, Júlia Sant´Anna, resolvem dar novos encaminhamentos para o retorno às atividades presenciais nas escolas. Definitivamente, são tempos difíceis e a luta pela saúde e dignidade uma tarefa daqueles que prezam pela vida.
Pelo visto, a integridade física e mental dos trabalhadores e dos estudantes não se inscrevem na lista de prioridades desses governantes… Contextualizando os fatos, existe uma briga judicial em curso no estado de Minas Gerais, na qual o Sindicato Único dos Trabalhadores em Educação de Minas Gerais (SindUte) entrou com um pedido na justiça local para suspender qualquer encaminhamento sobre o teletrabalho e retorno presencial dos trabalhadores da educação estabelecido pela Secretaria de Estado de Educação. O TJMG manteve a interrupção até o dia 27 de abril, quando autorizou o retorno dos gestores escolares ao trabalho para mapear, planejar e garantir junto à SEE-MG o cumprimento das determinações legais para uma possível retomada das atividades pelos vice-diretores, secretárias, Assistentes Técnicos da Educação Básica (ATB) e Auxiliares de Serviços da Educação Básica (ASB). Essa premissa está sendo autorizada pelo governo a partir da Resolução SEE Nº 4310/2020, que dispõe sobre as normas para a oferta de Regime Especial de Atividades Não Presenciais, e institui o Regime Especial de Teletrabalho nas Escolas Estaduais da Rede Pública de Educação Básica e de Educação Profissional, em decorrência da pandemia Coronavírus (COVID-19), para cumprimento da carga horária mínima exigida.
São vários os problemas anunciados com essas orientações no que diz respeito ao direito à educação, saúde, ao trabalho com dignidade e segurança. A começar, citamos o artigo 22 da referida resolução que atribui ao Gestor Escolar a elaboração de um “plano de escalonamento/rodízio de servidores que, excepcionalmente, executem suas atividades em regime presencial na unidade escolar”. Cabe, portanto, ao gestor convocar os servidores e apresentar os esclarecimentos aos órgãos superiores para devido acompanhamento do cumprimento das atividades.
O Coletivo de Gestores Articuladores Independentes tem demonstrado insatisfação com as medidas adotadas pela SEE-MG, uma vez que põe em risco a saúde dos diretores ou coordenadores das escolas e, ademais, os torna moralmente corresponsáveis pela saúde de seus servidores. Esta preocupação foi manifestada publicamente em 14 de abril, quando anunciaram também “repudiar toda e qualquer medida que vise inibir, perseguir ou tenha como intenção a tentativa de diminuir e descaracterizar a luta dos Diretores Escolares das escolas estaduais de Minas Gerais de defender a vida dos servidores neste momento de crise” (GRUPO INDEPENDENTE DE GESTORES ESCOLARES, MANIFESTO, 14 de abril de 2020). As angustias foram novamente repassadas à secretária Julia Sant´Anna em reunião do Coletivo com a SEE-MG, em 28 de abril de 2020.
Assim como manifestaram os gestores, nos chama a atenção a insistência por parte da secretaria em manter as atividades presenciais nas escolas em meio a uma pandemia, que já traz uma letalidade assustadora. Também nos impressiona a necessidade de convocar os Auxiliares de Serviços de Educação Básica, que cuidam da manutenção e limpeza das escolas e, portanto, devem realizar suas atividades em regime presencial. Esses servidores encontram-se na situação de maior vulnerabilidade porque correspondem à categoria que ganha menos, necessita de transporte coletivo (em muitos casos, utiliza mais de uma linha de ônibus) e, muito agravante, cuida de seus pais idosos ou filhos, que estão em casa por conta da pandemia.
O círculo de maldade se agrava quando as orientações da SEE determinam que, caso os trabalhadores do grupo de risco não possam exercer suas funções presencialmente, sejam afastados e cumpram a carga horária excedente em até 12 meses, caso dos efetivos, e até o final do contrato, caso dos designados. A nosso ver isso é desrespeitoso e desumano, uma vez os trabalhadores estão em casa para garantia da saúde física e mental e colaborando para uma orientação de isolamento social recomendada pela Organização Mundial de Saúde, Ministério da Saúde e Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais.
De acordo com pesquisadores, para interromper o ciclo de contaminação da Covid-19, o isolamento social é o mais indicado, já que faltam tratamentos específicos, vacinas e leitos hospitalares disponíveis, no caso de um aumento considerável de contágio da doença. Dessa maneira, convocar os servidores significa ir na contramão do que defendem os especialistas em saúde pública e infectologistas.
Vale reforçar que os salários dos trabalhadores da educação em Minas Gerais estão sendo pagos atrasados e por parcelas, sendo que parte dos servidores, principalmente os Diretores, não receberam ainda seu 13º salário de 2019 e o governador não sabe dizer se terá arrecadação suficiente para o cumprimento da folha de pagamento em maio.
Por tudo isso, colocamo-nos em defesa pela vida e repudiamos qualquer ação vinda da Secretaria de Estado de Educação que possa provocar a quebra do isolamento social. Defendemos que se tenha diálogo com os trabalhadores a partir de todas as categorias e que não se ignore os anseios de todos pela dignidade, segurança e valorização dos trabalhadores!
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