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EDITORIAL

Bolsonaro socorre os super-ricos e joga o custo da crise nos trabalhadores

Frente Única da esquerda, sindicatos e movimentos sociais propõe programa alternativo

Editorial de 02 de abril de 2020
Marcos Corrêa/PR/Flickr Planalo

O governo confirmou na quarta-feira (1) a Medida Provisória (MP 936) que autoriza corte de salários e jornadas de trabalho durante a crise econômica. As reduções poderão ser realizadas em qualquer percentual, podendo atingir 100%, com prazo máximo de 90 dias.

Os trabalhadores afetados terão direito a uma compensação do Estado que poderá chegar até 100% do que teriam direito de seguro-desemprego em caso de demissão. Além disso, o governo liberou a suspensão de contratos de trabalho por até dois meses. Nesse caso, os trabalhadores receberiam o valor do seguro-desemprego durante esse período.

 Feita em nome da proteção do emprego, a MP prioriza os lucros das grandes empresas

Calcula-se que 24,5 milhões de trabalhadores com carteira assinada serão alcançados pela MP. Feita em nome da proteção do emprego, esta medida prioriza os lucros das grandes empresas, e não a classe trabalhadora. A redução real dos salários, além sacrificar o sustento de milhões de famílias, aprofundará os efeitos da crise, na medida em que a queda na renda dos trabalhadores vai ocasionar a diminuição do consumo, agravando, por consequência, a recessão econômica.

O governo argumenta que a MP preservará empregos. Trata-se de uma inverdade, pois os patrões não estão impedidos de realizar demissões em massa. Se tiverem “boa vontade”, podem aderir voluntariamente ao programa do governo que lhes beneficia. Mas se isso não for vantajoso pra eles, podem simplesmente mandar pra rua centenas de milhares de mães e pais de família. Isto já está ocorrendo: mais de 600 mil trabalhadores foram demitidos em bares e restaurantes nas duas últimas semanas. Apenas o dono do Madero, Júnior Durski, conhecido fã de Bolsonaro, já demitiu 600 funcionários.

A medida correta e necessária seria a proibição de todas as demissões com a manutenção integral dos salários. As pequenas e microempresas com dificuldades financeiras poderiam ser socorridas pelo Estado afim de garantir o pagamento dos salários de seus empregados. As grandes empresas deveriam ser obrigadas, por lei, a zerar seus lucros durante a crise para a manutenção de todos empregos e salários.

Por sua vez, as grandes companhias estratégicas e as ameaçadas de quebrar deveriam ser controladas pelo Estado nesse momento crítico, com o objetivo de colocá-las a serviço das necessidades sociais emergenciais, como produção de respiradores, equipamentos de proteção, transporte de mercadorias e alimentos etc.

Bolsonaro e Paulo Guedes querem socorrer os grandes capitalistas, colocando nos ombros das trabalhadoras e trabalhadores o custo principal dessa crise. Os salários podem ser cortados, mas os lucros exorbitantes dos banqueiros não podem ser taxados. As famílias podem viver como menos, mas as grandes fortunas seguem intocadas.

Para salvar os lucros dos bilionários, sacrificam aquelas e aqueles que garantem a produção e a reprodução da vida. Nesse momento de crise aguda, vemos com nitidez quem faz tudo acontecer. Sem os garis e faxineiras, o lixo e a sujeira se acumulariam. Sem enfermeiras e médicos, os hospitais não funcionariam. Sem operários nas fábricas, os equipamentos e mercadorias básicos não  seriam produzidos. Sem os pequenos agricultores e caminhoneiros, o alimento não seria colhido nem transportado. A classe trabalhadora tudo produz, mas no capitalismo ela é a primeira a ser penalizada.

A injustiça social é cruel. Até mesmo o auxílio aos trabalhadores informais e precarizados (que varia de 600 a 1200 reais), aprovado no Congresso, ainda não foi pago pelo governo Bolsonaro, que parece fazer de tudo para adiar ao máximo a chegada da ajuda emergencial para quem mais precisa.

Assim, Bolsonaro vai criando terreno para o caos social. Além de não combater a disseminação do vírus, o presidente também não parece preocupado em socorrer economicamente os trabalhadores, em especial os mais pobres. Para não morrer de vírus nem de fome, será preciso enfrentar e colocar para fora esse governo criminoso.

Existe alternativa 

Organizações ligadas aos movimentos sociais dos trabalhadores lançaram, na terça (31), uma plataforma emergencial para o enfrentamento da pandemia do coronavírus e da crise econômica.

Ao mesmo tempo em que o vírus avança, aumenta a preocupação de milhões de trabalhadores com a sua sobrevivência.

Diante desta situação, o único setor que pode apresentar um programa consequente, que coloque as vidas em primeiro lugar, é a própria classe trabalhadora e oprimida e suas organizações.

A plataforma de medidas assinada pela Frente Povo Sem Medo e pela Frente Brasil Popular, além de centrais sindicais, movimentos sociais, populares e estudantis, partidos políticos de esquerda, tradições religiosas e entidades da sociedade civil, propõe medidas como o isolamento social horizontal (quarentena), com suspensão de todas as atividades não essenciais; a promoção e fortalecimento da saúde pública, com ampliação dos investimentos e controle do Estado sobre todo o sistema de saúde.

Além disso, a plataforma reivindica garantias para as trabalhadoras e trabalhadores, como estabilidade no emprego e na renda para os trabalhadores formais e renda básica emergencial para os informais; medidas de proteção social, como zerar a fila do Bolsa Família, isentar o pagamento das tarifas de energia elétrica, água e gás e garantir acesso a produtos de higiene para as famílias mais pobres nas periferias das cidades; direito à alimentação para todas as pessoas, a partir da produção e distribuição de alimentos da agricultura familiar e distribuição de cestas básicas.

O programa também defende o direito à moradia digna, a partir de um plano especial para atender as populações mais fragilizadas; reorientação da economia e da destinação de recursos públicos, revogando a Emenda Constitucional 95, que limita os gastos sociais, fortalecendo o papel dos bancos públicos na disponibilização de crédito sem juros, controlando preços de itens essenciais e suspendendo o pagamento das dívidas de estados e municípios com a União, com os bancos públicos e organismos internacionais e autorizando novos empréstimos para investimentos públicos emergenciais.

Ademais do pontos acima mencionados, a plataforma reivindica a suspensão de todas as votações do Congresso Nacional que retirem direitos da classe trabalhadora, bem como a revogação da MP 905, que cria a Carteira Verde e Amarela e a retirada das PECs emergenciais enviadas pelo governo antes da pandemia e que limitam a capacidade de ação do setor público.

Um importante passo na construção da unidade dos debaixo 

A iniciativa das Frentes Povo Sem Medo e Brasil Popular significa um importante passo na imprescindível tarefa de construir a Frente Única dos trabalhadores para lutar por direitos e pela vida. Trata-se da mais ampla articulação entre organizações da classe trabalhadora construída até este momento.

Esta Frente precisa se transformar em um verdadeiro comando de ação da classe trabalhadora, que lute pela implementação das medidas emergenciais e, ao mesmo tempo, construa uma verdadeira rede de solidariedade para auxiliar no atendimento das necessidades mais urgentes do povo pobre, arrecadando e distribuindo recursos financeiros, alimentos, produtos de higiene, medicamentos, etc.

É preciso valorizar e se conectar a outras ações da classe trabalhadora, que vem se auto-organizando diante da ausência de medidas governamentais. Nas periferias e favelas brasileiras, algumas delas mais populosas do que municípios inteiros, moradores e organizações comunitárias estão na linha de frente da adoção de medidas para conter o contágio pelo vírus e garantir condições de sobrevivência a seus moradores. Sindicatos pelo país, além de lutarem para garantir, em suas próprias categorias, o direito à quarentena ou condições de trabalho em segurança em tempos de pandemia, oferecem recursos e instalações para ajudar no tratamento dos doentes.

Mas esta Frente não pode acabar quando conseguirmos derrotar o coronavírus. Se nossa tarefa imediata consiste em garantir a implementação de medidas para proteger a nossa classe em tempos de pandemia, teremos pela frente outras grandes batalhas em defesa da nossa classe. A crise econômica será justificativa para que governos e empresários ataquem de forma dura a classe trabalhadora, e precisaremos tomar as ruas com todas as nossas forças para derrotá-los. A Frente Única que agora se conforma tem este papel estratégico.