Os petroleiros do país estão em greve desde o 1º dia de fevereiro e já é a maior greve desde 1995, quando paralisaram as suas atividades por 32 dias. São 113 unidades do Sistema Petrobras em greve, em 13 estados do país, com adesão de mais de 20 mil petroleiros, de acordo com a Federação Nacional de Petroleiros (FNP). A principal pauta é o fechamento da Fábrica de Fertilizantes Nitrogenados (Fafen-PR), localizada em Araucária (PR), que terá como consequência a demissão de mil funcionários diretos, perda de arrecadação para o município e o estado do Paraná e o aumento da dependência de importações de fertilizantes no país que se diz o celeiro do mundo (saiba mais aqui).
Mas a greve também é contra toda a privatização que assola a Petrobrás e as suas perigosas consequências. O que a direção da Petrobras chama calhordamente de “desinvestimentos”, que no bom português significa privatizações, já acumula cerca de US$ 30,1 bilhões desde 2016 (ou R$ 130,3 bi, no câmbio de hoje), ano onde houve uma virada na política da estatal. Os brasileiros já perderam ativos (total ou parcialmente) como a BR Distribuidora, TAG, Liquigás, incontáveis campos de petróleo e ainda pretendem vender muito mais, como metade do parque de refino do país, pertencente à Petrobras, todas extremamente lucrativas e eficientes.
Mas a análise pormenorizada do processo de privatização, fundamental no debate público, não será tratada aqui. Neste artigo quero falar sobre uma questão específica, que tem tudo a ver com esta privatização e a diminuição do peso da Petrobras no setor de refino e distribuição, a política de preços para os produtos refinados e como isto aumentou imensamente os preços dos combustíveis e do gás de cozinha.
Dois meses depois do impeachment da presidente Dilma, Pedro Parente, que assumiu a presidência da Petrobras nomeado por Michel Temer e com todo apoio do mercado, mudou a política de preços para os produtos resultantes do refino de petróleo da estatal. Apesar dos preços dos produtos do setor de petróleo e derivados serem livres desde 2002, o peso da estatal, que possui 98% da capacidade de refino do país, acaba determinando o seu preço, e por isto a política da Petrobras é tão importante para a formação do preço da gasolina, diesel e botijão de gás.
A nova política de preços da estatal passou a ter como base “dois fatores: a paridade com o mercado internacional – também conhecido como PPI e que inclui custos como frete de navios, custos internos de transporte e taxas portuárias – mais uma margem que será praticada para remunerar riscos inerentes à operação, como, por exemplo, volatilidade da taxa de câmbio e dos preços sobre estadias em portos e lucro, além de tributos” (Fatos e Dados, Petrobras). Ou seja, ao invés de levar em consideração o mercado interno e o custo de sua produção, o preço destes produtos passaram a variar junto com a Europa e EUA. O primeiro efeito desta mudança foi um imenso aumento nos preços, como pode ser visto nos gráficos 1 e 2.
Gráfico 2 – Preço médio do botijão de gás (GLP) em Reais no território nacional (ago/16 a fev/20)
Como podemos ver, desde a entrada de Temer, em agosto de 2016 (a adoção da política de preços foi feita dois meses depois) houve um aumento de 32% no gás de cozinha, 25% na gasolina e 19% no diesel-10. Além disto, houve momentos onde o preço ficou ainda maior, como outubro de 2018, onde os valores chegaram a um aumento acumulado de 29% e 20%, se comparado ao mesmo mês inicial.
Na justificativa para a adoção desta nova política, estava que a Petrobras perdia dinheiro por não vender seus produtos tão caros quanto no mercado internacional, prejudicando seus acionistas. Mas por que este argumento não é suficiente?
A Petrobras é uma empresa pública, formada com tributos pagos por brasileiros, em um contexto onde a iniciativa privada não dava conta da exploração e produção de petróleo no país. Na década de 1950, a iniciativa privada era incompetente para o assunto, e apenas com a criação de uma estatal o país passou paulatinamente a ser uma referência internacional na produção de petróleo, chegando à níveis tecnológicos de ponta para a produção em águas profundas e ultra-profundas (como no pré-sal). Sendo assim, a Petrobras deve servir ao povo, e não a uma pessoa que comprou um punhado de ações desta empresa.
Hoje, 95% dos domicílios brasileiros consomem o gás de cozinha. O aumento de 32% no preço do botijão, jogou pessoas de volta ao fogão à lenha – só na década de 1990 que mais brasileiros passaram a cozinhar com o gás de cozinha do que com lenha (!!!). Quando aumenta o preço do botijão, todas as famílias passam a pagar mais para consumir aquele mesmo produto, o que faz diminuir a renda disponível na economia, transferindo riquezas das famílias para os acionistas da Petrobras. O mesmo ocorre para a gasolina e o diesel, como todas as mercadorias e serviços precisam de deslocamento, em qualquer economia o aumento deste produto tem um efeito cascata, prejudicando todo o restante da sociedade.
Não só, um outro objetivo desta elevação de preços foi permitir que outras empresas entrassem neste mercado. Sim, a Petrobras – desde a gestão de Pedro Parente – trabalha explicitamente para compartilhar o seu mercado com outras empresas (insanidade, entreguismo ou interesses pessoais?). Só em 2019, houve um aumento de 71,4% nas importações de gasolina, transferido uma produção nacional para outro país. Além disto, o aumento a partir da política de preços ainda permitiu que outras empresas crescessem em cima da Petrobras, com aumento da participação de mercado da Raízen (Shell e Cosan) e da Ipiranga. Ou seja, o brasileiro pagou mais, a produção passou a ser ainda mais importada (levando empregos para fora) e a Petrobras ainda perdeu participação de mercado. É uma maravilha para as empresas privadas e estrangeiras!
Por fim, sequer a política de preços é tecnicamente razoável. Em nota técnica (Nota Técnica nº 027/2019/SDR), a ANP sugere que a adoção do mercado europeu (para o GLP esta é a referência) como referência para o gás de cozinha, além de não fazer sentido, pois o maior produtor e exportador do mundo são os EUA (inclusive para o Brasil), fez o preço do gás de cozinha aumentar em 12%. Ou seja, “imprecisões” técnicas agravam ainda mais o problema, piorando a vida do trabalhador brasileiro.
Por isto petroleiros em greve em todo o país estão vendendo botijões de gás por R$ 30, R$ 32 e R$ 40, para dizer que é possível vender combustível e gás no país por um preço justo, onde não piore a vida do brasileiro! E que é fundamental que a Petrobras continue estatal, pois só assim ela poderá garantir que haja preços razoáveis para o mercado brasileiro, pois se dependermos de empresas privadas, só o lucro importará.
Texto publicado também no site Pragmatismo Político.
Comentários