Se enganam aqueles que ainda hoje acreditam que a questão sobre o desenvolvimento sustentável – ou simplesmente a “questão verde” – seja coisa apenas de ecologistas ou dos amantes da “natureza” idealizada. A busca por um modo de produção que se enquadre dentro da eficiência para com os recursos naturais e com poluição e desperdício zero não só já é uma realidade como tal questão ditará o jogo geopolítico mundial. Nessa corrida, países como EUA e Brasil se encontram na retaguarda, demonstrando como a decadência produtiva vem junto com um pensamento decrépito, senil e anacrônico.
Grande parte dos noticiários ocidentais tardam a anunciar uma realidade: a questão verde é a única questão capaz de mobilizar amplos países na construção de uma cooperação mundial em torno da máxima eficiência com os recursos naturais e de zero emissão de carbono. Certamente, cegos pela ideologia central do capitalismo – aquela que tem nos EUA seu maior representante e que tarda a morrer – cujo cerne é uma arcaica noção de capitalismo do começo do século XIX que vê os recursos naturais como coisas que devem literalmente serem queimadas.
Aparentemente, em cabeças como de Trump, Bolsonaro ou Morrison ainda vivemos a época do carvão, logo, a solução para a atual crise ambiental e econômica é a produção de mais “riqueza” através da literal queima dos recursos naturais para movimentar a máquina capitalista “no tranco”, essa ideologia recusa-se em aceitar que as transformações que este mesmo capitalismo engendrou sobre o mundo forçam-nos a mudar a forma como encaramos a atividade econômica e a produção de riqueza.
Neste negacionismo irracional irrompe um novo agente do cenário internacional que pode encaminhar a questão para um plano concreto, trata-se da China. Na contra-mão dos Estados Unidos que negam as mudanças climáticas e abandonam acordos firmados, assim como seus correlatos, Brasil, Austrália etc, encontram-se os chineses, o país que até pouco tempo era encarado como a “marca da poluição” – certamente em parte por uma certa tendência a detratar o país pela mídia ocidental – hoje se apresenta como um agente real capaz de viabilizar uma saída para a crise ambiental em parceria com outras potências.
Evidentemente, a China tem muito a ganhar com isso, com os Estados Unidos se isolando da Europa abre-se margem para uma mudança geopolítica nunca antes vista desde o fim da segunda guerra mundial. A China vem expandindo sua zona de influência sobre Ásia, África e agora a Europa, o monumental projeto econômico da nova “rota da seda” vem na esteira das mudanças e readequações dos chineses em relação às emissões de carbono e busca por fontes alternativas de energia.
Não está suficientemente claro como a mudança de modo de produção se dará concretamente, entretanto, muitos teorizam que a transformação para um modo de produção verde com uma lógica de mercado é possível. Não entrando nesta questão do mercado – contudo é preciso frisar que a “questão ambiental” é uma das variantes da lógica de apropriação privada e mercadológica dos recursos naturais e que qualquer mudança de paradigmas produtivos necessariamente terá que abolir a lógica de mercado – está claro que a nova baliza econômica se dará entre os países menos poluentes contra os mais. E nesse novo jogo geopolítico a busca pela energia renovável e a reciclagem de lixo terá um papel estratégico, não é a toa que atualmente a China já é o principal importador de materiais recicláveis no mundo. Além disso, o país inaugura constantemente novas instalações como usinas de energia que usam o lixo como fonte, somado a isso ainda temos questões como o reflorestamento em massa do país – a maior floresta artificial do mundo se encontra na China em Saihanba, província de Hebei – isso para ficar em apenas alguns exemplos.
Outro ponto de destaque nessa corrida pela energia limpa é o investimento maciço chinês em fontes experimentais com potencial de praticamente produzir energia ilimitada, como é o caso do reator de fusão nuclear – apelidado de “mini sol chinês” – na cidade de Hefei. Os primeiros passos para a expansão chinesa através de uma liderança que atravesse o modo de produção capitalista e sua produção de carbono já foram lançados, os europeus neste jogo percebem que a liderança estadunidense pode levar a humanidade ao caos e a uma marcha irracional para mudanças climáticas imprevisíveis e catastróficas. Tudo indica que a mudança de hegemonia sobre o mundo se dará, inevitavelmente, através da nova marcha pelo modo de produção verde.
Evidentemente, a questão climática se apresenta como crucial, necessária e urgente, contudo, como já esbocei em outros textos, é preciso entender “crise ambiental” como parte da crise social que tem como seu centro a expansão desenfreada da desigualdade social. Sem compromisso para enfrentar esse problema e abolir as diferenças de classe uma hipotética solução para a “questão verde” poderá dar tempo, mas não será suficiente para solucionar os problemas internos do modo de produção, sem a socialização da riqueza como um todo as fissuras sociais ainda permaneceram, ou seja, a alternativa posta na ordem do dia é a construção de um modo de produção sustentável que mantenha as diferenças de classe.
* Militante da Resistência/PSOL na Zona Leste de São Paulo (SP).
Comentários