A atualidade de Lenin para nossos dias (um diálogo com The Intercept)


Publicado em: 23 de janeiro de 2020

Marxismo

Lucas Scaldaferri, de São Paulo (SP)

Esquerda Online

Esse post foi criado pelo Esquerda Online.

Marxismo

Lucas Scaldaferri, de São Paulo (SP)

Esquerda Online

Esse post foi criado pelo Esquerda Online.

Compartilhe:

Ouça agora a Notícia:

Um texto ruim, onde os autores desconhecem a história da revolução russa e o papel de Lênin, foi oferecido pelo The Intercept ao público brasileiro. O site vem cumprindo um papel progressivo e decisivo ao divulgar a corrupção do sistema judiciário brasileiro, em especial o autoritarismo do herói da extrema direita, da direita e da centro-direita: Sérgio Moro. Isso, todavia, não impede que seja criticado.

O bom jornalismo não é aquele que concordamos, mas sim o que se baseia em uma profunda análise dos fatos e se orienta pela busca da verdade. O texto “elogiar ditadores é a melhor maneira de a esquerda continuar perdendo” é um artigo político que causa confusão e falsa polêmica na esquerda, justamente porque o prestígio do site Intercept se encontra basilado na busca pela verdade.

O texto é anacrônico e, ao contrário do que seus autores pensam, não ajuda em nada no debate público brasileiro. Na verdade contribui com a visão deturpada de que comunismo e nazismo são irmãos siameses.

Quem foi Lênin?

Lênin foi o líder político mais importante do século XX. Seu legado de organização e educação dos de baixo, teve como um dos seus méritos inserir na arena política a massa dos despossuídos, dos subalternos que até então só serviam para a servidão capitalista. A cidadania burguesa com o direito dos trabalhadores votarem foi uma conquista do movimento operário, anterior a Lênin na verdade. Mas foi com o comunista russo que a participação política do proletariado ganhou contornos estratégicos orientando a luta política para a conquista da hegemonia e do poder do Estado.

Lênin lutou durante anos contra uma ditadura terrível. Soube aproveitar as brechas democráticas e transitar para ilegalidade quando o cerco fechava. No exílio seguiu estudando e orientando seus camaradas de partido dentro da Rússia. Outro grande mérito de Lênin foi ter percebido que a luta dos trabalhadores não terminaria com o fim da ditadura do Czar, mas superando a democracia dos ricos, como ele chamava a democracia liberal burguesa.

Mas o líder dos bolcheviques, como entrou para história sua corrente política, acreditava que a luta para derrotar o capitalismo não terminava nas fronteiras nacionais da mãe russa. O sistema econômico, político e militar que colonizava povos, gerava guerras e a espoliação de nações precisava ser destruído. Seu combate nesse sentido era apresentar uma saída contra o imperialismo.

Teria sido Lênin um ditador sanguinário?

A coalizão liderada pelos bolcheviques tomou o poder em 1917 na Rússia realizando um feito histórico e que mudou definitivamente a história. Para Lênin o mais importante era livrar o povo da fome, realizar reforma agrária no latifúndio semi-feudal que resistia ao novo século e poupar as vidas ceifadas na guerra imperialista iniciada em 1914.

Não é lembrado que no dia da revolução dos operários e camponeses quase não teve mortos. Qualquer capital brasileira tem mais mortes violentas numa noite de sábado do que tiveram as cidades russas de Petrogrado e Moscou durante a insurreição revolucionária. O movimento das massas russas foi tão forte e avassalador que tomou o poder sem derramamento de sangue.

Violento mesmo foi a reação dos liberais do restante da Europa que financiaram uma sanguinária guerra civil na Rússia, levando o país ao caos. A autodeterminação do povo russo de construir a República dos Sovietes foi um insulto ao pensamento liberal ocidental.

A democracia dos ricos é a ditadura do capital

A democracia liberal tolera a miséria e a exclusão da maior parte da humanidade para que uma minoria possa seguir vivendo no luxo. Em um país como o Brasil um punhado de 6 capitalistas concentrava, em 2017, segundo estudo da Oxfom, a mesma riqueza que metade da população brasileira, ou seja, 100 milhões de pessoas.

A democracia dos ricos é recheada de um conteúdo antidemocrático contra o povo. É num sentido uma espécie de ditadura contra os pobres, afinal como exercer direitos democráticos trabalhando 12h por dia, com a barriga vazia ou com água poluída em casa?

A atualidade de Lênin para os tempos sombrios de Bolsonaro

Lênin foi um verdadeiro arquiteto da organização política para o combate. Apostou todas as fichas nas saídas coletivas para o povo e na forma partido para a vanguarda. Mesmo nos momentos mais difíceis de repressão e tirania, buscou explicar que os lutadores não poderiam atuar de maneira espontaneista ou com atitudes vanguardistas, pois ambas levariam ao afastamento das massas trabalhadoras. A melhor forma de combater um inimigo poderoso é estando organizado, apostando na construção coletiva e democrática.

Lênin foi o pensador mais influente das lutas de resistência na América Latina, na África, Oriente Médio e Ásia. Todo movimento de libertação nacional que triunfou no terceiro mundo teve a influência das suas ideias. Num país governado por um subserviente do imperialismo ianque, a luta antiimperialista é tarefa fundamental.

Os editores do Intercept, infelizmente, não compreendem nem a grandeza do pensamento de Lênin e tampouco os fundamentos da luta política contra o governo neo-fascista de Bolsonaro. Acreditam que vão parar a sanha autoritária do capitão gerando gentileza e com diálogo. Com este pensamento, estarão em desvantagem, justamente quando o neofascismo criminaliza Glenn Greenwald e toda a equipe do portal. Nós estaremos, sem dúvida, na defesa de Glenn e do Intercept. Mas, para defender as conquistas democráticas normatizadas na semi-destruída Constituição de 1988, a esquerda brasileira e todos os que defendem as liberdades estariam melhor preparados se conhecerem os fundamentos  do pensamento leninista.


Contribua com a Esquerda Online

Faça a sua contribuição