“o incontestável imperativo da proteção ambiental se revelou inadministrável, em virtude das correspondentes restrições necessárias aos processos de produção em vigor exigidas para sua implementação. O sistema do capital se mostrou impermeável à reforma, até mesmo de seu aspecto obviamente mais destrutivo.”
Itsvan Meszaros
Em seu clássico Para Além do Capital Rumo a uma teoria da Transição, Istvan Meszaros nos alerta para o fato de vivemos sob o signo fatal da incontrolabilidade do Capital:
“A sombra da incontrolabilidade, pelas razões discutidas acima em relação a todos os quatro conjuntos de problemas associados aos limites absolutos do sistema do capital, está cada vez mais escura. Sob as condições de sua ascendência histórica, o capital teve condições de administrar os antagonismos internos de seu modo de controle por meio da dinâmica do deslocamento expansionista. Agora estamos diante não apenas dos antigos antagonismos do sistema, mas também da condição agravante de que a dinâmica expansionista do deslocamento tradicional também se tornou problemática e, em última análise, inviável”.(Meszaros,2002)
Meszaros trata do concurso de quatro contradições fundamentais: a da contradição entre Produção x controle, a contradição entre Estado nacional e Mercado Mundial, a contradição entre Família patriarcal e demandas de igualdade substantiva das mulheres , por fim o crescente desemprego estrutural .
Meszaros nos adverte que
“Com relação à forma como o sistema do capital espezinha o tempo (em perfeita correspondência à desastrosa interferência nas determinações objetivas da causalidade) na vã convicção de que sempre conseguirá se safar, basta que nos lembremos do legado atômico. Mesmo que se queira cultivar a ideia de que os desastres nucleares jamais acontecerão, apesar das dezenas de milhares de armas nucleares (e nada à vista para controlá-las e eliminá-las, com a remoção das causas de sua existência), nem mesmo a maior credulidade poderá minimizar o peso deste legado atômico, pois ele significa que o capital está impondo cegamente a incontáveis gerações – que se estendem no tempo por milhares de anos – a carga de, mais cedo ou mais tarde e com certeza absoluta, ter de lidar com forças e complicações totalmente imprevisíveis. O futuro distante da humanidade terá de ser perigosamente empenhado porque o sistema do capital deverá sempre seguir seu rumo de atuação dentro da mais estreita escala de tempo, desprezando as consequências, mesmo que estas apontem a destruição completa das condições elementares da reprodução sociometabólica.” (Meszaros,idem).
O caráter auto expansionista do capital,sua orientação total para o valor de troca em expansão permanente, e sua incapacidade para um planejamento no sentido genuíno do termo o tornam uma fonte de perdulário e perigoso papel de dissolvente das relações sociometabolicas entre homem e natureza.
A teoria marxista estabelece um ponto em que as alterações quantitativas se alteram em qualitativas, este momento é o qye as forças produtivas se transformam em forças destrutivas e o caráter relativamente progressivo das formas históricas de produção se transformam em seu contrário.
Submetidos ao objetivo meramente expansiva de “mais de si mesmo”, onde riqueza ao invés de ser vista como na visão marxiana como “tempo disponível humanamente significativo” é vista como “coleção de mercadorias” em escala crescente, as forças produtivas estão voltadas ao sociometabolismo da barbárie. O incremento da produção de máquinas de guerra com capacidade de destruir a vida na Terra varias vezes, de mercadorias descartáveis, o amplo desperdício de recursos e o motor “fóssil” do capitalismo global indicam ao lado da precarização global do trabalho, aquilo que poderíamos chamar com “Achille Mbembe de “devir negro do mundo” que é a tendencia crescente da superexploração do trabalho constituir o “regime de reprodução ideal” do capital .
Daí que usamos a obra do magiar para salientar o coneito de crise estrutural do Capital, que significa uma crise que : “põe em questão a própria existência do complexo global envolvido, postulando sua transcendência e sua substituição por algum complexo alternativo. (…) uma crise estrutural não está relacionada aos limites imediatos mas com os limites últimos de uma estrutura global.” (Meszaros,2011)
O capital atinge o grau máximo desta contradição ao colocar em risco os próprios fundamentos do sociometabolismo com a “ativação dos limites absolutos do capital”.
“A civilização capitalista industrial moderna é um trem suicida que avança, com rapidez crescente, em direção a um abismo: as mudanças climáticas, o aquecimento global. Trata-se de um processo dramático que já começou, e que poderá levar nas próximas décadas a uma catástrofe ecológica sem precedentes na história humana: elevação da temperatura, desertificação das terras, desaparecimento da água potável e da maioria das espécies vivas, multiplicação dos furacões, elevação do nível do mar – até que Londres, Amsterdã, Veneza, Xangai, Rio de Janeiro e demais cidades costeiras fiquem debaixo d’água. A partir de um certo nível de elevação da temperatura, será ainda possível a vida humana neste planeta? Ninguém pode responder com segurança a esta pergunta.” (Lowy, 2019).
A partir da década de 50 ficou claro que a escala de círculo de círculos ,para usar uma imagem hegeliana,em expansão constante começava a esgotar o planeta,o fino equilíbrio que permite a reprodução da vida entrou em processo de colapso. Este colapso apenas anta dia a após dia em que o capital continua sua saga sangrenta e poluente pelo globo em busca de maus valor,recursos naturais e energéticos
A manutenção de um custo energético maciço, a adoção de estratégias de curto prazo para a resolução de problemas como crise energética,aquecimento global não podem levar outra conclusão a não ser a de que o Capital é perdulário e incapaz de resolver as contradições colocadas acima, esta “segunda contradição”,no dizer de O Connor se coloca para Além da contradição entre as forças produtivas e as relações sociais de produção, ou melhor é sua consequência lógico – histórica,levou a uma contradição entre as relações sociais de produção e as condições naturais de produção,os próprios fundamentos materiais da vida estão ameaçados.
Daí torna – se patente que um modelo de produção por mais democrático que seja não poderá se calcar nos mesmos fundamentos produtivos das sociedades anteriores e da atual, assim como Marx e Lenin defenderam que é preciso destruir o Estado burguês e construir outro aparelho para a transição, será necessário superar as formas produtivas vigentes em sua natureza intrínseca e perdulária. Escrevi em artigo referente a obra do filósofo magiar que :
“Se queremos contrapor uma alternativa societária histórica e ambientalmente viável ao domínio do capital, devemos ter a “sustentabilidade” no seu sentido genuíno, como centro de nossa concepção de crescimento, como o ecossocialismo defende é preciso outro modelo de desenvolvimento que estabeleça um sociometabolismo que medeie as necessidades do ser social e da preservação do ecossistema.” (Silva, 2019)
Conforme Michael Lowy :
“O núcleo do ecossocialismo é o conceito do planejamento democrático ecológico, no qual a própria população, não “o mercado” ou o comitê central do partido comunista tomam as decisões sobre a economia. No início da Grande Transição para este novo modelo de vida, com seu novo modo de produção e consumo, alguns setores da economia terão de ser suprimidos (por exemplo, a extração de combustíveis fósseis implicados na crise climática) ou reestruturados, enquanto novos setores são desenvolvidos. A transformação econômica deve ser acompanhada de uma ativa busca de pleno emprego, com condições iguais de trabalho e remuneração. Está visão igualitária é essencial tanto para construir uma sociedade justa como para atrair o apoio da classe trabalhadora para a transformação estrutural das forças produtivas.
Em última instância, tal visão é irreconciliável com o controle privado dos meios de produção e do processo de planejamento. Em particular, para que investimentos e inovações tecnológicas sirvam ao bem comum, a tomada de decisões deve ser retirada dos bancos e empreendimentos capitalistas que atualmente a controlam e colocada sob domínio público. Então, a própria sociedade — nem uma pequena oligarquia de donos de propriedade, nem uma elite de tecno-burocratas — irão democraticamente decidir quais linhas produtivas serão privilegiadas, e como os recursos serão investidos em educação, saúde e cultura. Grandes decisões nas prioridades de investimento – tais como terminar todas instalações a base de carvão ou direcionar subsídios agrícolas à produção orgânica – seriam tomadas por voto popular direto. Outras, menos importantes, seriam tomadas por grupos eleitos, em suas relevantes escalas, nacional, regional ou local.” (Lowy 2018)
Para que o socialismo do século XXI supere os limites do século XX e esteja a altura daquilo que Itsvan Meszaros chamou de “O desafio é o fardo do Tempo Histórico ” é preciso que tomemos o Ecossocialismo como central no nosso debate sobre a Atualização Programática da Revolução Socialista Mundial.
Somente se estabelecermos as mediações materiais e institucionais através das quais o verdadeiro Poder popular enquanto a ditadura democrática do proletariado se estabeleça, e para isto devemos estar cientes dos desafios colocados pela Grande transição necessária, é que o poderemos evitar a hecatombe planetária e parar a Roda da História na qual este Anjo da Morte chamado Progresso que tem dizimado os povos oprimidos e explorados do mundo e agora ameaça o próprio ecossistema planetário.
Nossa organização deve inscrever no seu programa a consciência clara de realizar uma ampla mudança das formas de produção não só no sentido de expropriação dos expropriadores mas no sentido de estabelecer a sustentabilidade ao lado da radical democratização de todas as esferas da vida coletiva como princípios reguladores da transição para além do Capital.
Neste sentido é preciso colocar na ordem do dia a superação da anarquia capitalista, do seu caráter eminentemente autoritário caracterizado pela separação radical entre controle x produção,onde a imensa maioria da humanidade é subsumida aos objetivos autoexpansionistas impostos a ferro e fogo pelas personificações do capital auxiliados por aparato militares e policiais.
“Por último, o planejamento democrático ecológico representa o pleno exercício, pela sociedade, de sua liberdade para controlar decisões que afetam seu destino. Se o ideal democrático não concede o poder de tomada de decisão a uma pequena elite, por que o mesmo princípio não deveria ser aplicado para as decisões econômicas? Sob o capitalismo, o valor de uso – o valor de um produto ou serviço ao bem estar – existe apenas a serviço do valor de troca, ou valor no mercado. Deste modo, muitos produtos na sociedade contemporânea são socialmente inúteis, ou desenhados para serem rapidamente substituídos (obsolescência programada). Em contraste, em uma economia ecossocialista planejada, o valor de uso seria o único critério para a produção de bens e serviços, com consequências econômicas, sociais e ecológicas de longo alcance.
O planejamento seria focado em decisões econômicas de larga escala — não as de pequena escala, que podem afetar restaurantes locais, mercados, pequenas lojas ou empreendimento artesanais. Mais importante, tal planejamento é consistente com a autogestão, pelos trabalhadores, de suas unidades produtivas. A decisão, por exemplo, de transformar uma planta de produção automobilística para produzir ônibus e bondes, seria tomada pela sociedade como um todo, mas a organização e o funcionamento internos do empreendimento seriam democraticamente administradas pelos trabalhadores. (Lowy idem).
Como salientam Sabrina Fernandes e Thiago Avila :
“ a sociedade do século 21 se encontra diante de um grande desafio histórico. Coube a nós lutar a grande batalha de nosso tempo: enfrentar um sistema que, com uma sede insaciável de lucro e acumulação, utiliza diversos mecanismos para explorar as pessoas, oprimir povos e setores sociais e ainda destruir a Natureza colocando em risco a própria vida na Terra. Enfrentar o capital para construir, em seu lugar, uma nova sociedade do Bem Viver é o principal desafio de nossa geração.” (Avila e Fernandes 2018 www.subverta.org.br )
Nossos antepassados diziam “Socialismo ou barbárie ” nós devemos inscrever em nossa Bandeira : Proletários e povos explorados e Oprimidos de todo Mundo Uni vos e Lutai:Ecossocialismo ou Extinção! !!!
*Sóstenes é militante da Resistência/PSOL em Feira de Santana (BA).
Referencias bibliográficas
Avila, Thiago e Fernandes, Sabrina. Construindo uma Alternativa de Transformacao no Brasil e no Mundo. 2018 in www.subverta.org.br
Meszaros, Itsvan. Para Alem do Capital. Rumo a uma Teoria da Transicao. Boitempo Editorial 2011
Lowy, Michael. Historia Razoes e Etica do Ecossocialismo. In outraspalavras.net. 2019
Silva, Sostenes B.Rodrigues. Itsvan Meszaros, A humanidade sob o signo da incontrolabilidade do capital in www.esquerdaonline.org.br/teoria
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