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EDITORIAL

A Lava Jato no banco dos réus

Editorial de 03 de outubro de 2019

Nas últimas semanas, o noticiário voltou a ser pautado por fatos relacionados à Lava Jato, os quais podem levar à mais séria derrota da operação policial-judicial que mudou o cenário político nacional.

Primeiro, a Segunda Turma do STF votou, por maioria, pela anulação da condenação do ex-presidente da Petrobras, Ademir Bendine, dado o fato de que a defesa não teve direito à última palavra na fase das alegações finais. Para preservar o princípio constitucional da ampla defesa e do contraditório, chegou-se à conclusão de que os réus devem se pronunciar após os delatores.

Esse entendimento foi majoritário também no Plenário do STF, que reúne os onze ministros. Falta agora a definição a respeito da aplicação dessa tese aos outros processos semelhantes. A depender do que for decidido, inúmeros processos da Lava Jato poderão retroceder à fase de alegações finais na primeira instância do Judiciário, inclusive a condenação de Lula no caso do sítio de Atibaia.

Segundo, houve um pedido, aparentemente inusitado, assinado pelos procuradores da Lava Jato, entre eles Deltan Dallagnol, para que fosse concedido a Lula a progressão para o regime semiaberto, que redundaria, por sua vez, em prisão domiciliar para o petista. Ante a iminência do julgamento da suspeição de Sérgio Moro, no processo do Triplex do Guarujá, que pode levar à soltura do ex-presidente nas próximas semanas, os procuradores fizeram uma explícita jogada política: favorecer a saída de Lula da prisão em Curitiba com o intuito de evitar a anulação do processo e, com isso, a obtenção da liberdade plena do preso político. Lula, por sua vez, se colocou, corajosamente, contra o pedido da Lava Jato, argumentando que não trocará sua dignidade pela sua liberdade.

Além disso, houve a surpreendente confissão de Rodrigo Janot de que planejou assassinar Gilmar Mendes, em pleno STF, para depois se suicidar. Em seu livro lançado, “Nada menos que tudo”, o ex-Procurador Geral da República relata, em diversas passagens, a ação política da Lava Jato e a obsessão dos procuradores pela prisão de Lula.

Importa registrar, também, que está pendente no STF a decisão acerca da prisão em segunda instância. Atualmente, está valendo o entendimento de que a condenação em segunda instância é suficiente para a decretação da prisão do réu. Essa tese está em flagrante contradição com o texto da Constituição Federal, que estabelece no inciso LVII, do art. 5º, que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”, ou seja, até todos os recursos da defesa se esgotarem, o investigado não pode ser preso. De acordo com que noticiou a jornalista Monica Bergamo nesta quarta (3), é possível que esse tema vá ao Plenário do STF na próxima semana.

Os reveses que a Lava Jato vêm acumulando estão diretamente ligados aos vazamentos, pelo The Intercept e outras mídias, das conversas entre procuradores e o juiz Sérgio Moro, nos quais ficou transparente a atuação ilegal e criminosa da operação, cujo objetivo era, além dos angariar benefícios financeiros (palestras, ligações com escritórios de advocacia) aos próprios agentes da Lava Jato, interferir diretamente na vida política do país, patrocinando o golpe parlamentar de 2016 e abrindo caminho, ao prender Lula, à vitória eleitoral de Bolsonaro em 2018.

A #Vazajato não só ampliou o desgaste da operação como gerou também outra conseqüência: muitas organizações da esquerda que mantinham um apoio a esta operação, ou apenas faziam exigências a ela, começam – uma a uma – a abandonar essa política equivocada. Esperamos que essa correção de rumo, mesmo que parcial, possibilite uma unidade política em torno do combate unificado ao caráter reacionário da Lava Jato e a defesa dos direitos democráticos de Lula.

Entendemos que o posicionamento pelo fim da prisão política do petista como parte da luta mais geral contra o golpe e sua agenda reacionária de destruição de direitos e conquistas do povo trabalhador, bem como em defesa das liberdades democráticas, seriamente ameaçadas pela escalada autoritária representada pelo governo Bolsonaro. Negar a defesa ou a importância desta bandeira é deixar de dar o combate democrático a um aspecto central do projeto de extrema direita em curso em nosso país.

A defesa dos direitos políticos de Lula, mais uma vez, não se confunde com qualquer apoio ao seu projeto político de conciliação de classes. Fomos da oposição de esquerda aos governos do PT de aliança com a velha direita e, hoje, seguimos lutando contra a política de colaboração de classes de sua direção. Evidenciada, por exemplo, no apoio que os governadores do PT e de outros partidos de oposição (PDT e PSB) estão dando a pontos fundamentais da contrarreforma da previdência social de Guedes e Bolsonaro.

Tendo em conta as decisões cruciais que serão tomadas pelo STF nas próximas semanas, é necessário intensificar a campanha pela anulação do processo fraudulento que condenou Lula, pelo restabelecimento da garantia constitucional de prisão somente após julgamento em última instância e de exercício do direito democrático da ampla defesa e do contraditório. Por outro lado, é preciso exigir investigação e punição às práticas corruptas e ilegais perpetradas pelos principais agentes da Lava Jato.

Em defesa das liberdades democráticas!

Lula Livre!