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Protestos pré-Stonewall: enfrentamento, irreverência e bom humor

Este é o terceiro de sete textos desta coluna no Especial Stonewall 50

Protesto na cafeteria Compton’s. O cartaz à direita diz algo como “seja drag no espaço aberto”.

Travesti Socialista

Travesti socialista que adora debates polêmicos, programação e encher o saco de quem discorda (sem gulags nem paredões pelo amor de Inanna). Faz debates sobre feminismo, diversidade de gênero, cultura e outros assuntos. Confira o canal no Youtube.

Apesar da importância da Revolta de Stonewall, 50 anos atrás, ela foi antecedida e preparada por várias manifestações e ações anteriores. Ocorreram várias manifestações na década anterior a Stonewall, apesar das leis que tornavam crime o simples fato de ser LGBTQI. Pacíficas ou com enfrentamento físico, realizadas por três ou centenas de pessoas, protestos ou apresentações artísticas, dezenas de manifestações nos EUA ajudaram a pavimentar o caminho da famosa revolta. Apresento as manifestações que considero mais notáveis e criativas.

Nos EUA, a legislação penal é estatal e, na época, em todos os seus estados havia alguma tipificação penal contra LGBTQI, comumente da relação homossexual e do uso de roupas “inadequadas ao seu sexo”.

Entre, sente-se, molhe o bico e seja gay

Na década de 1960, nos EUA, popularizou-se uma forma de protesto chamada sit-down (sente-se) ou sit-in (entre e sente-se), geralmente convocados por ativistas antirracistas contra estabelecimentos que recusavam atender pessoas negras. Manifestantes entravam e ocupavam os lugares, permanecendo sentadas por horas.

Em 1965, o restaurante Dewey’s, na Filadélfia, passou a recusar atendimento a “homossexuais e pessoas vestindo roupas não-conformes”. Três adolescentes expulsas do local convocaram um protesto à maneira do movimento antirracista.

Em 25 de abril, adolescentes e ativistas da Janus Society foram ao restaurante vestindo-se adequadamente com “roupas do sexo oposto” e ocuparam as mesas. 150 pessoas tiveram seu atendimento recusado e a polícia foi chamada para retirá-las do local. Os dois rapazes, a moça e Clark Polak, da Janus Society, foram levadas à prisão por “conduta desordeira”.

Panfletagem em frente ao Dewey’s, ocorrida entre 26 e 30 de abril de 1965.

Sete dias depois, foi realizado outro sit-in, no qual a polícia recusou-se a prender os envolvidos. Após quatro horas, o dono do restaurante entrou em acordo e revogou a regra de não-atendimento.

Em Nova York, 1966, três ativistas da Mattachine Society tiveram a ideia de realizar um sip-in (entre e tome um gole) na presença de jornalistas. O plano era entrar e afirmar “Somos homossexuais. Somos tranquilos, não queremos confusão, apenas uma bebida”. O estabelecimento escolhido era o Village, no qual havia uma placa: “If you are gay, please go away” (Se você for gay, por favor vá embora). O jornalista do New York Times fez uma entrevista com o gerente no dia anterior. No dia marcado, as portas estavam fechadas.

Após terem sido atendidos em dois bares, chegaram ao Julius, no qual o barman serviu a bebida, mas colocou a mão sobre o copo. A foto deste ato foi publicada no jornal. O caso foi levado à justiça e estabeleceu um precedente jurídico: estabelecimentos não poderiam recusar atendimento a homossexuais.

Um ano antes de Stonewall, outro protesto aconteceu no Griffith Park, em Los Angeles, recebendo o nome de gay-in (entre e seja gay). Este parque era um local onde muitas pessoas LGBTQI eram alvo de perseguição, assédio e agressão pela polícia. O evento repetiu-se nos anos seguintes, como mostra o cartaz abaixo.

Cartaz convocando um “entre e seja gay” no Griffith Park, 1970, no qual se lê “Gay-in perto da roda-gigante do Griffith Park em 5 de Abril. Venha acompanhado… abrace e dê a mão a seus irmãos e irmãs”.

Trabalhadoras do sexo que só querem trabalhar

Muitas LGBTQI, principalmente mulheres trans negras, não encontram espaço no mercado de trabalho e recorrem à prostituição. Em vez de garantir moradia e emprego, o Estado tenta “resolver o problema” enviando a polícia. Ainda hoje, quando não existe lei contra o “uso de roupas do sexo oposto”, mulheres trans negras são frequentemente presas e agredidas física e sexualmente por policiais. Meio século atrás, nos EUA, ser trans era crime e a violência era ainda maior.

Em 1959, LGBTQI frequentavam o café 24 horas Cooper’s Donuts, em Los Angeles, várias delas mulheres trans prostitutas. Na madrugada, dois policiais entraram no estabelecimento e pediram documentos. Conforme dizia a lei, quem estivesse com aparência que não correspondesse ao sexo registrado, seria presa. Cinco pessoas seriam presas, mas outras clientes do bar atiraram café, copo e lixo nos policiais, que acabaram fugindo.

O uso de café na madrugada é facilmente explicado: prostitutas trabalham à noite.

Um caso parecido ocorreu na cafeteria Compton’s, em São Francisco, em agosto de 1966. O gerente, com receio pela “imagem” da cafeteria, chamava a polícia. Cansadas de serem levadas presas, o grupo Vanguard, de drag queens e mulheres trans jovens que eram moradoras de rua ou trabalhadoras do sexo, organizaram piquetes em frente ao bar. Após chegar ao local, um dos policiais decretou a prisão de uma delas e esta jogou café em seu rosto. Iniciou-se um confronto que deixou um rastro de destruição e repetiu-se nos dias seguintes.

Uma rua onde prostitutas batem ponto é considerada “suja”. Se elas forem travestis, o local é visto como “imundo”, muitas pessoas se enojam, passam longe ou atiram pedras. Quando a polícia desce o cacete, a sociedade aplaude. Se o governo e a sociedade não nos quer nas esquinas, que nos ofereça emprego!

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stonewall 50 anos