Pular para o conteúdo
Especiais
array(1) { [0]=> object(WP_Term)#3879 (10) { ["term_id"]=> int(4457) ["name"]=> string(20) "50 anos de Stonewall" ["slug"]=> string(20) "50-anos-de-stonewall" ["term_group"]=> int(0) ["term_taxonomy_id"]=> int(4457) ["taxonomy"]=> string(9) "especiais" ["description"]=> string(0) "" ["parent"]=> int(0) ["count"]=> int(7) ["filter"]=> string(3) "raw" } }

A semana do Orgulho LGBTI+: o fervo das lutas

Carlos Henrique de Oliveira e Felipe Alencar*, de São Paulo, SP
EBC

Parada LGBT de SP

A semana do orgulho LGBTI+ começou segunda-feira, em São Paulo, e já começou o aquecimento dos eventos do ativismo. Tradicionalmente, a semana do feriado de Corpus Christi é quando se realiza a Parada do Orgulho LGBTI de São Paulo, a maior marcha, e também festa, de todo o mundo, relacionado à pauta do orgulho de ser não-hétero, não-hegemônico. Esse ano será uma semana antes do dia 28 de junho, dia do Orgulho LGBTI+.

Nesta data, há 50 anos atrás, um grupo de travestis negras, lésbicas, gays e drag queens decidiram dar um basta contra a violência policial que reprimia cotidianamente a comunidade LGBTI+ que frequentava o bar Stonewall Inn, localizado entre os números 51 e 53 da Rua Christopher, no bairro de Greenwich Village, em Nova York. Até hoje essa luta é lembrada como Revolta de Stonewall.

Uma das manifestantes que teve papel central na organização da Revolta de Stonewall foi Marsha P. Johnson, latino-americana, transsexual, negra, trabalhadora sexual que foi às ruas virando carros da polícia e fazendo da Revolta de Stonewall um marco para que no mundo fosse celebrada a Parada do Orgulho LGBTI+.

Lembrar de Marsha P. Johnson e todas as outras pessoas envolvidas nessa rebelião é reavivar a memória da radicalidade, do engajamento de pessoas excluídas e criminalizadas num momento em que não se tinha acesso a direitos civis para a população LGBTI+.

E no Brasil de 2019 isso ganha maior relevância, pois estamos em pleno governo de extrema-direita, declaradamente LGBTfóbico, racista e machista.

 

Criminalização da homo-transfobia no Brasil: uma grande conquista, mas precisamos de mais!

Começamos junho num paradoxo: conseguimos que fosse aprovada na quinta, 13 de junho, a criminalização da homofobia e da transfobia pelo Supremo Tribunal Federal, uma pauta reivindicada pelo movimento social LGBTI+ há muitos anos. No entanto, nessa mesma semana, ainda assistimos a homofobia do próprio presidente, que diz que empregadores não vão dar empregos a homossexuais por conta da criminalização da homofobia. Ou seja, o presidente da República não respeita uma decisão da Suprema Corte, incentiva que a norma seja burlada com um estilo de LGBTfobia disfarçada, fingindo não ser. Igual ao racismo brasileiro, que também é sem ser, que também se escamoteia, se esconde e se sofistica.

Bolsonaro ao dizer isso, estimula que as empresas não contratem pessoas LGBTI+, além de sinalizar, para sua base de apoio mais reacionária na sociedade, que as pautas da comunidade LGBTI+ são ruins para a própria comunidade. Para o governo, bom mesmo é continuar como está: o país sendo o que mais mata e agride a comunidade LGBTI+.

Mesmo pesando a consideração de que apenas criminalizar opressões, sem levar em consideração a obsolescência do cárcere como forma hegemônica de punição e do impacto causado pelo encarceramento em massa na população negra e pobre, criminalizar a LGBTIfobia no Brasil representou um marco histórico importante no embate político, haja vista o momento reacionário em que estamos imersos.

Se tivéssemos perdido o julgamento no STF, sairíamos muito mais enfraquecidas do jogo das correlações de força, numa situação ainda muito pior do que a que já vivemos. Mas tudo isso não anula a complexidade e a situação paradoxal do momento: há avanços, há resistências, lutas em curso. Mas a maré do protofascismo ainda está revolta.

 

É por nossas vidas: resistir aos ataques contra a comunidade LGBTI+

Para Bolsonaro não bastou ter assumido nas eleições uma política esclarecidamente sexista e LGBTIfóbica, suas ações enquanto governo afetaram diretamente as vidas de LGBTI+s: foi fechado o Departamento de Aids e Hepatites Virais, que já foi referência mundial, e tantas outras políticas públicas voltadas aos mais pobres, à população negra, às LGBTI+, foram sendo desmontadas vertiginosamente. Existe no país uma caça às bruxas e uma guerra contra a inventada “ideologia de gênero”.

Por isso, a importância de se mobilizar para as Paradas do Orgulho é crucial. É necessário lembrar que ano passado, 420 pessoas LGBTI+ foram assassinadas no país. Que existe um contingente de milhares de LGBTI+ que estão morrendo ano a ano por doenças tratáveis como a tuberculose e aids. Que a Igreja Católica, em sua última orientação sobre educação sexual e de gênero, orienta a cirurgia compulsória de pessoas que nascem intersexo, para “normalização dos corpos”, e ainda bate na tecla da negatividade da “ideologia de gênero”.

A tese da ideologia de gênero foi se sofisticando na extrema-direita, até ser atrelada a supostas conspirações entre os movimentos LGBTI+, feminista, a ONU, movimentos israelitas de esquerda e toda a esquerda mundial, e esse proselitismo “gayzista, comunista e feminista” seria um dos responsáveis pela degradação ética, aumento de violência sexual, corrupção, aborto clandestino e mais uma série de desgraças sociais que foram sendo associadas ao “pecado” da população LGBTI+.

Precisamos ter em vista que a ministra Damares prescreveu como política pública para o enfrentamento às infecções sexualmente transmissíveis (IST) o celibato e a demonização do aborto em casos de estupro.

Com a declaração de que agora “inicia-se uma nova era no país” onde “menino veste azul e menina veste rosa”, e que a educação para a diversidade de gênero e sexualidade não deve existir na escola, condenando a Holanda por supostamente “sexualizar bebês e ensinar-lhes a masturbação”, a ministra Damares aponta para o que seria as agendas dos direitos humanos do atual governo brasileiro: o não-reconhecimento das individualidades e das identidades trans e não-binárias, o tratamento das sexualidades dissidentes como algo imoral, e portanto, inadequado para crianças e adolescentes até mesmo como assunto não-erótico e, por fim, a associação cabal entre as pautas LGBTI+ com a sexualização de crianças e até mesmo com a pedofilia.

Isso, além de perigoso para incitar o ódio da sociedade civil, abre portas para que soluções disfarçadas de “proteção à infância e à família” sejam, na verdade, maneiras de retirar direitos já conquistados pelas LGBTI+.

 

LGBTI+ precisam ferver o país pelo Orgulho de se libertar do sistema

A pauta da emancipação de gênero e sexual andam juntas, são indissociáveis; e a extrema-direita sabe disso. Quando Damares e Bolsonaro atacam, numa mesma entrevista, o aborto, o feminismo, o movimento negro, as LGBTI+ e ainda pratica aidsfobia (aumentando o já grande estigma da aids em quem vive com HIV/aids e quem é LGBTI+), eles atacam o inimigo central do status quo: a ideia de que podemos ter autonomia dos corpos e, muito além disso, que com corpos autônomos consigamos nos organizar coletivamente, criar táticas anti-sistêmicas para romper com as amarras deste capitalismo racista, machista e LGBTIfóbico.

É por nossas vidas que chamamos para a luta.

É urgente que os movimentos sociais LGBTI+ se convirjam, façam alianças entre si e com os demais setores do movimento e da classe trabalhadora e resgatar a radicalidade lá nas lutas de Stonewall.

Para que o nosso orgulho não seja só o orgulho individual, vendido pelos setores do Pink Money e do capital, que pode ser acessado pelo consumo ou bolhas gourmetizadas de espaços privados. Que nosso orgulho também se construa coletivamente, num sentido de emancipação plena de todas e todos.

 

Em São Paulo, temos um ciclo de eventos e atos que começam já na quinta-feira, a saber:

  • 20/06 (quinta-feira): Feira da diversidade LGBTI+ no Anhangabaú
  • 20/06 (quinta-feira): festa Parada Preta LGBTI+ no Largo da Batata, a partir das 21h00. Link: https://www.facebook.com/events/609632056185477/
  • 21/06 (sexta): 2ª Marcha do Orgulho Trans e Travesti. Link:
  • 22/06 (sábado): XVII Caminhada de Mulheres Lésbicas e Bissexuais. Link: https://www.facebook.com/Caminhada.Les.Bi/
  • 23/06 (domingo): Parada do Orgulho LGBTI+, que contará com um bloco da esquerda antifascista, contra Bolsonaro. Para quem é de São Paulo ou quem irá para a Parada, nós convidamos para nos encontrar a partir das 9h no cruzamento da Avenida Paulista com a Rua Augusta, para agitação, panfletagem, entrega de adesivos anti-Bolsonaro, e diálogo com quem estiver na Parada do Orgulho LGBTI de São Paulo. Link do Bloco: <https://www.facebook.com/events/315659982702828/>

 

E estejamos atentas também nas datas das Paradas e Marchas dos outros municípios e estados. Precisamos nos articular de todas as formas contra o fascismo brasileiro. Pelas vidas de LGBTI+.

 

*do núcleo LGBT da Resistência SP