O 21 de março e a luta internacional contra o racismo

Por Jean Montezuma e Lucas Scaldaferri

“Porque estamos recebendo todas essas pessoas desses países de merda?”
(Donald Trump, presidente dos EUA, sobre a aceitação de imigrantes do Haiti e da África)

“Eu fui num quilombo. O afrodescendente mais leve lá pesava sete arrobas. Não fazem nada. Eu acho que nem para procriador ele serve mais”
(Jair Bolsonaro)

 

As citações acima dão uma ideia de como pensam os chefes de Estado de duas das maiores economias do planeta. No entanto, infelizmente, Trump e Bolsonaro não estão sozinhos no que diz respeito a reprodução de ideias conservadoras e abertamente racistas. Uma nova extrema direita se levantou em todo mundo. Na Europa chegaram ao poder na Itália com Giuseppe Conte, na França tiveram expressão eleitoral de massas com Marine Le Pen. O ódio aos imigrantes, a xenofobia, a intolerância religiosa, criminalização, genocídio e encarceramento em massa, são algumas das armas dessa direita que, sem nenhum pudor, vocifera à plenos pulmões o seu “direito” de ser escancaradamente racista.

O 21 de março é uma data internacional, instituída pela ONU, como dia internacional de combate a discriminação racial. Trata-se de uma homenagem as vítimas do Massacre de Sharpeville, cidade da África do Sul, onde em 21 de março de 1960, 69 pessoas foram fuziladas pela policia do regime do apartheid. Se tratava de um protesto pacífico que foi brutalmente reprimido por aquele Estado racista. Outras 200 pessoas foram feridas naqueles mesmo dia. Não satisfeito com tamanha barbárie, o regime do Apartheid iniciaria uma verdadeira devassa recrudescendo a perseguição contra ativistas, criminalizando organizações e prendendo lideranças. Poucos anos depois Nelson Mandela viria a ser preso, permanecendo no cárcere por 27 anos, de onde sairia para se tornar o primeiro presidente Sul-africano pós regime do Apartheid.

Pautar o 21 de março deve significar a reafirmação da necessidade diária, incansável e incontornável de se combater o racismo em suas mais variadas formas. Massacres como o de Sharpeville não ficaram no passado. Nós os vivemos e revivemos nas periferias dos grandes centros urbanos do nosso país. Segundo dados do Atlas da Violência divulgados em 2017, só no ano de 2015 tivemos 41.592 negros e negras assassinados no Brasil. O alto nível de letalidade das policias também é um dado alarmante. Somente no Estado da Bahia ocorreram em 668 mortes decorrentes de ação policial no ano de 2017. O projeto de lei anticrime de Sérgio Moro, ministro da justiça e segurança pública de Bolsonaro, acena para uma ainda maior cumplicidade com essa letalidade ao propor atenuar, flexibilizar e até mesmo isentar de investigação esses casos. A violência sem limite dos fascistas também se direciona para as lideranças, vide o bárbaro assassinato da vereadora Marielle Franco. Quanto mais se investiga, mas se revela que o seu assassinato está conectado com as engrenagens racistas do Estado Brasileiro. Uma outra faceta cruel do racismo é o encarceramento em massa, que faz da população carcerária brasileira, com 726 mil presos, a terceira maior do planeta.

Nos Estados Unidos, o American Way of life ou sonho americano, tem sua face perversa traduzida no pesadelo vivido pela população negra. A autointitulada maior democracia do mundo possui a maior população carcerária do planeta, cerca de 2,1 milhão de presos. Sob o governo de Trump, grupos da extrema-direita supremacista sentem-se à vontade para expandir suas atividades realizando passeatas e organizando bandos fascistas. O recrudescimento da violência policial também provoca tensões. Segundo dados divulgados pelo coletivo de pesquisa Mapping Police Violence, 1.100 pessoas foram assassinadas em decorrência da ação policial. Não por coincidência o mapeamento das cidades e localidades onde se concentram a absoluta maioria dessas mortes tem sintonia com as regiões de maioria negra da população.

Na Europa não é diferente e o aumento do racismo e da xenofobia no continente cresce em ritmo acelerado junto com o avanço dos partidos de ultra direita. No final do ano passado a Agência dos Direitos Humanos (vinculada a União Europeia) divulgou uma pesquisa feita em 12 países, que teve como questão central o racismo sofrido pela população negra de primeira e segunda geração. Os dados coletados com 5.803 pessoas são reveladores de uma Europa racista e violenta para com os negros e negras: um terço dos entrevistados relataram já ter sofrido racismo; um em cada dez negros disseram que a raça foi responsável por não conseguir alugar uma habitação; um em cada dez disseram que sofreram abordagem policial nos últimos 12 meses, e metade deles acreditaram que a motivação teria sido racial; os negros são duas vezes mais susceptíveis aos empregos de baixa qualificação

O crescimento do racismo é uma tendência mundial e precisa ser enfrentado a partir de um forte internacionalismo militante, que enquadre os dramas nacionais, como no Brasil, numa perspectiva global de crise do sistema capitalismo e que articule oprimidos e explorados de todos mundo. Neste dia 21 de março nos somamos na luta contra todas formas de racismo.