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MUNDO

As consequências da mudança da embaixada brasileira para Jerusalém

Por: Diogo Xavier, de Recife, PE
Jack Guez, AFP

Desde o período eleitoral o presidente eleito, Jair Bolsonaro, acena com a possibilidade de mudar a embaixada brasileira em Israel de Tel Aviv para Jerusalém. Essa mudança tem um viés estritamente ideológico, pois não visa avanços práticos no comércio ou nas relações exteriores e se baseia na aliança com um setor evangélico que foi parcela importante na eleição do presidente, assim como pelo alinhamento que se procura ter com o presidente dos Estados Unidos Donald Trump.

Primeiramente vale ressaltar que a cidade de Jerusalém é sagrada para as três maiores religiões monoteístas do mundo (Cristianismo, Judaísmo e Islamismo) sendo também um espaço de disputa entre israelenses e palestinos, desde a criação do Estado de Israel em 1948 que a cidade passa por uma disputa. A Assembleia da ONU de 1947 definiu que Jerusalém permaneceria como cidade de status internacional e que não pertenceria a nenhum dos dois países, no entanto hoje toda a cidade está sob o domínio israelense. Essa disputa permanece e a maioria dos países da comunidade internacional busca manter a neutralidade, optando por manter suas embaixadas em Tel Aviv, e com o reconhecimento da Palestina como um estado livre e soberano. O Brasil também reconhece a Palestina.

Além do significado político, de se aliar ao estado de Israel, que massacra o povo palestino, mudar a embaixada para Jerusalém significa uma provável ruptura das relações com os países da Liga Árabe, organização composta por 22 países e que tem uma relação de comércio relevante para a economia nacional. A Liga é a segunda maior compradora de proteína animal do Brasil com exportações que geraram em 2017 13,5 bilhões de dólares para o Brasil e um superávit nesse mesmo ano de 7 bilhões de dólares. Como medida de comparação as exportações para Israel foram 400 milhões de dólares.

Perder esse mercado é fechar uma porta do agronegócio brasileiro, essencialmente para a carne halal que é produzida especificamente para os países árabes e passam por um rigoroso processo perante as autoridades islâmicas para cumprir os requisitos religiosos. Hoje o Brasil é o maior produtor de carne halal do mundo, que conta com um mercado consumidor de 1,8 bilhão de pessoas.

Apenas Estados Unidos e Guatemala tem suas embaixadas em Jerusalém. No caso norte-americano, a decisão de Donald Trump de transferir a embaixada visa atender os desejos de uma parcela do seu eleitorado que vê em Jerusalém o fim dos tempos. O dispensacionalismo é uma interpretação teológica que coloca a cidade de Jerusalém na posse dos Israelitas como sendo uma condição para a segunda vinda do Messias. Essa ala do protestantismo nos EUA tem uma enorme força entre os republicanos e os grandes empresários que garantiram a eleição do atual presidente. Já a Guatemala seguiu os passos dos EUA com quem tem a maioria do seu comércio e não possui uma relevância no comércio internacional.

Essa decisão ainda não está efetivada assim como não foi anunciado o nome do ministro de Relações Exteriores. Uma medida dessa magnitude já tem reflexos, o mais recente foi o cancelamento da visita do Chanceler brasileiro ao Egito, que aconteceria no dia 08/11 e já mostra que os países enxergam com maus olhos a decisão.

A política internacional do próximo governo é ainda nebulosa, mas pelas declarações do futuro ministro da Economia que falou que “O MERCOSUL não é uma prioridade” fica nítido uma tentativa de realinhar o Brasil com os EUA, no entanto desde os anos 90 o comércio internacional passou por profundas modificações e hoje a China é o maior parceiro do Brasil e aumenta sua influência significativamente na América do Sul.

O último ano foi marcado por uma guerra comercial forte entre EUA e China que nesse contexto o Brasil goza de uma posição confortável por conta da sua neutralidade que permite a manutenção das relações com os dois lados e o recebimento de investimento das duas potências. Abrir mão dessa posição vantajosa num momento de crise econômica pode custar muito caro para o próximo governo.

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