Começa em Brasília o Festival “Nem presa nem morta. É pela vida das mulheres”, por ocasião das audiências no Supremo Tribunal Federal que ocorrerão nos dias 03 e 06 de agosto, onde serão apresentados argumentos favoráveis e contrários a ADPF 442 (Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental), de autoria do PSOL em conjunto com Anis – Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero.
Esta ADPF, que propõe a descriminalização do aborto até a 12º semana de gestação por escolha da mulher, se baseia na contradição que há entre os princípios de dignidade da pessoa humana, liberdade e igualdade da mulher, garantidos pela Constituição de 1988, e a retrógrada lei que criminaliza a prática do aborto, que está no Código Penal, de 1940, e vem desde o Código Criminal, de 1830.
Ou seja, há uma incoerência entre a criminalização das mulheres e seus direitos constitucionais. Recentemente abriu-se uma janela na difícil conjuntura brasileira, pra se debater este tema na sociedade. Em que pese a correlação de forças cada vez mais desfavorável aos trabalhadores brasileiros, os ventos argentinos e as audiências sobre a ADPF no STF recolocaram o debate sobre a mesa. A pauta que historicamente foi tomada pelo movimento feminista do Brasil a partir do eixo da autonomia da mulher em relação ao próprio corpo, começa a dar lugar ao viés da saúde pública e da defesa da vida das mulheres, sobretudo as trabalhadoras negras.
A força dos argumentos está na própria realidade. Quase um milhão de abortos são realizados por ano no Brasil. Mais de 600 internações por complicações são registradas por dia. Significa 9% da mortalidade materna, e é responsável por 25% dos casos de esterilidade. Uma a cada cinco mulheres já abortaram. Na sua maioria, tem religião, são mais velhas e tem filhos. São essas as mulheres que quando morrem deixam filhos e uma família desestruturada, pois muitas dependem delas.
Recentemente o Ministério da Saúde divulgou que nos últimos 10 anos foram gastos cerca de R$ 500 milhões com tratamento de complicações por abortos clandestinos.
Está nítido que este tema é uma questão de saúde pública, de política e planejamento de Estado, e não de opinião ou religião. Não se trata de se posicionar a favor ou contra o aborto, mas de ser a favor ou contra o aborto clandestino. Ele é uma realidade, independentemente da cortina de hipocrisia que existe, as mulheres abortam e muitas morrem pelas consequências de um procedimento mal feito. Segundo o próprio Ministério da Saúde, estas mortes poderiam ser evitadas caso o procedimento fosse feito em um hospital através do Sistema Único de Saúde, já que o procedimento não oferece nenhum risco. Este número cresce na mesma medida em que a crise econômica se aprofunda e os ataques do governo golpista debilitam cada vez mais os serviços públicos. O Estado que criminaliza a mulher que aborta é o mesmo que nega condições dignas a maternidade.
É hora de enfrentar com coragem este debate no Brasil. É mais uma arena de combate a extrema direita que se organiza contra a ADPF. A tarefa é disputar a consciência da classe trabalhadora e da juventude, de um setor mais amplo da sociedade, criar uma massa crítica para que consigamos visualizar alguma possibilidade de vitória mais a frente.
Não é possível fazer cumprir essa tarefa sem a mais ampla frente única em torno ao tema, que envolva os movimentos de opressões, os sindicatos, as organizações da esquerda e setores democráticos da sociedade. É necessário cerrar fileiras em defesa da ADPF.
Sabemos que a descriminalização é limitada, pois queremos o procedimento no SUS e para isso é necessário a legalização. No entanto, essas bandeiras estão atreladas. A luta pela descriminalização não se opõe a legalização, pelo contrário, se ganhamos essa batalha damos um passo a frente pela legalização.
É necessário mobilizar, como está sendo feito durante estes dias em Brasília, e participar dos atos convocados em apoio às argentinas que têm suas vidas decididas no próximo dia 8 de agosto, em votação do projeto (que está sofrendo modificações) no Senado. A Argentina apontou o caminho. Será nas ruas que garantiremos vitórias.
Educação sexual para decidir, contraceptivos para não abortar, aborto legal e seguro para não morrer!
É pela vida das mulheres!
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