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MUNDO

Cúpula de Singapura: questões-chave sobre as negociações Trump-Kim

Por: Paulo Aguena, São Paulo/SP

Sem dúvida, o encontro entre Donald Trump e Kim Jong-Un realizado na semana passada, 12 de junho, no luxuoso hotel Capella na ilha de Sentosa, em Singapura, foi um fato marcante que ganhou as manchetes dos meios de comunicação mundial.

Todas as partes diretamente e indiretamente envolvidas – EUA, Coreia do Norte, Coreia do Sul, China, Rússia, e mesmo o Japão – saudaram o encontro e fazem um balanço positivo dele. Abriu-se, claro, uma disputa aberta para ver quem capitaliza mais seu resultado.

De fato, a declaração assinada conjuntamente por Trump e Kim tem uma grande importância. Significa um ponto de inflexão na escalada de tensão entre os EUA e a República Popular Democrática da Coreia (RPDC) que vinha em um crescente no último período. Especialmente para os países da região, trata-se de um grande alívio. Afinal, a questão em causa envolve a possibilidade de um conflito nuclear.

No entanto, é preciso tomar com muito cuidado o resultado da reunião, começando por analisar o próprio conteúdo da declaração construída em Singapura. O balanço do ocorrido é complexo e o futuro é, todavia, ainda muito incerto, para dizer o mínimo. A partir dela é necessário trabalhar com distintas hipóteses e cenários que vão desde um novo acordo fracassado – mais um dentre os tantos já ocorridos ao longo da história -, passando por uma desnuclearização que signifique uma capitulação de uma das partes, até por uma desnuclearização nos marcos de uma possível reunificação da península coreana. Todas essas hipóteses estão sobre a mesa, embora o Pentágono a princípio trabalhe com a política de impor uma capitulação a Kim, enquanto este visa, no mínimo, tirar alguma vantagem política e econômica da reaproximação.

Afinal, qual o conteúdo da declaração da cúpula de Singapura?

Analisemos cada um dos quatro principais pontos do documento assinado por Trump e Kim, sabendo que seu conteúdo genérico impõe um alto grau de interpretação:

1. Os Estados Unidos e a RPDC se comprometem a estabelecer novas relações entre os Estados Unidos e a Coreia do Norte, de acordo com o desejo de paz e de prosperidade dos povos dos dois países.”

O ponto demonstra uma intenção de ambas as partes no sentido de modificar a relação existentes até então entre os dois países, estabelecendo um acordo sob os critérios da paz e da prosperidade. Em outras palavras, a intenção de alcançar um acordo que garanta a desnuclearização da península coreana em troca de ajuda econômica dos EUA à RPDC, a começar pelo fim do embargo. A palavra “intenção” é importante. Ela significa que nem a desnuclearização, nem o fim do embargo começam a partir da cúpula. O que se abre é a discussão de um possível caminho para atingir esses objetivos.

2. Os Estados Unidos e a RPDC unirão seus esforços para construir um regime de paz duradoura e estável na península coreana.”

O texto afirma que os EUA e a RDPC “unirão esforços para construir um regime de paz duradoura e estável na península coreana”. Observemos que não se trata ainda de um compromisso direto, mais precisamente, de um tratado de paz para substituir o armistício assinado no final da Guerra da Coreia, em 1953. Ou seja, a guerra segue interrompida por um cessar-fogo com o compromisso de unir esforços para que um possível tratado venha a pôr um ponto final nela.

3. Reafirmando a declaração de Panmunjom de 27 de abril de 2018, a RPDC se compromete a trabalhar para a desnuclearização completa da península Coreana.”

Neste ponto, Kim reafirma seu compromisso com a declaração assinada em conjunto com o presidente da Coreia do Sul, Moon Jae-In em abril passado, no encontro ocorrido na simbólica cidade de Panmunjon, visando alcançar a paz e a desnuclearização da península coreana. Mas não atende ao objetivo de Washington de um desmantelamento “completo, verificável e irreversível” (CVID) do arsenal nuclear da Coréia do Norte. Tampouco fornece um cronograma ou medidas de verificação delineando quais serão tomadas para alcançar a desnuclearização.

Ao mesmo tempo continua pouco claro o que se entende por desnuclearização, uma divergência que vem se acumulando. A interpretação norte-coreana vai mais além do abandono do seu programa nuclear. Ela inclui a retirada das tropas dos EUA ao longo das duas fronteiras, além do sistema de defesa antimíssil THAAD instalado na Coreia do Sul. De imediato, Trump se compromete a suspender os exercícios militares dos EUA com a Coreia do Sul – fato que recebido como uma surpresa pelo governo sul-coreano -, enquanto Kim suspende os testes nucleares com lançamentos de mísseis. Uma diminuição necessária da tensão para remover as desconfianças e abrir caminho para uma nova fase em que se discutirá todo um procedimento com vistas a atingir os objetivos dos pontos 1 e 2.

4. Os Estados Unidos e a RPRC se comprometem a recuperar os restos mortais de prisioneiros de guerra e desaparecidos em ação, incluindo a repatriação imediata daqueles já identificados.”

Uma das questões pendentes da Guerra da Coreia de 1950-53 é a recuperação e repatriação dos restos mortais de prisioneiros de guerra e soldados que desapareceram em combate. As informações variam, mas dos EUA seriam em torno de sete mil soldados. Este é um ponto que neste momento Kim pode concordar sem grandes problemas, sabendo que em 2005 houve uma tentativa frustrada de solucionar a questão.  A princípio, ficou pendente a questão dos cidadãos estrangeiros desaparecidos depois do armistício, particularmente os japoneses  – em torno de 700 – sequestrados por agentes norte-coreanos nos anos 70-80. Posteriormente, através de contato telefônico, Trump buscou aliviar a tensão garantindo ao primeiro-ministro Shinzo Abe que os japoneses também estariam contemplados na formulação.

 

A nova estratégia de Defesa e Segurança Nacional dos EUA e a suposta conexão Irã-Coreia

As novas estratégias de segurança e defesa nacional foram anunciadas pelos EUA em dezembro do ano passado e janeiro desse ano, respectivamente. Elas significaram uma mudança ao colocarem o “poder de Estados” como prioridade de sua estratégia militar apontando direta e explicitamente para a China e a Rússia, denominados “estados revisionistas”. Em seguida, apontam para o Irã e a Coreia do Norte, considerados estados “desonestos” e uma ameaça à paz mundial. No discurso anunciando a nova estratégia de segurança, Trump faz o balanço que os EUA “negligenciaram a ameaça nuclear na Coreia do Norte, fecharam um acordo desastroso, fraco e incompreensível com o Irã, e permitiram que os terroristas, como o EI, ganhassem o controle sobre vastas extensões de território em todo o Oriente Médio.

Por outro lado, os EUA vêm trabalhando com a informação da existência de uma conexão Irã-Coreia em torno à questão nuclear. A hipótese com que trabalham é que a Coreia do Norte estaria armazenando material nuclear para o Irã como uma solução para os limites impostos pelo acordo iraniano em troca de dinheiro, petróleo, etc. Ao mesmo tempo, o Irã continuava realizando testes avançados de mísseis balísticos apesar das resoluções do Conselho de Segurança da ONU proibindo essa atividade. A conclusão a que chegaram é que provavelmente os dois países estariam com uma política conjunta. Enquanto a Coreia do Norte desenvolvia uma ogiva termonuclear, o Irã trabalhava no sistema de lançamento de mísseis. Prova disso seria uma reunião entre altos funcionários do Irã e da Coreia do Norte realizada após o teste bem sucedido da RDPC em setembro de 2017, para tratar sobre o que poderia ser inclusive uma arma termonuclear.

Foi essa avaliação que provavelmente levou Trump a tomar uma decisão praticamente simultânea em relação aos dois países. Depois de uma campanha internacional contra os dois estados considerados “desonestos”, em maio, os EUA romperam o acordo nuclear com o Irã (JCPOA) (1) e retomaram as sanções contra o país acusado de descumprir o acordo nuclear e financiar o terrorismo internacional. Agora, em junho, antecedido por inúmeras reuniões e encontros preparatórios em meio às ameaças mútuas, concretizou-se a iniciativa do encontro de Sentosa entre Trump e Kim.

 

As tentativas anteriores de acordos com a Coreia do Norte

Há pouco mais de 30 anos, em 1985, embora a Coreia do Norte já tivesse um programa nuclear desde 1980, ainda fazia parte do Tratado de Não-Proliferação de armas nucleares (NPT). Em 1987, após 20 anos de colaboração da ex-URSS, a RPDC começa a operar o reator nuclear de Yongbyon. Em 1990, os EUA descobrem esse terceiro reator em funcionamento e inicia-se um conflito para que a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) fizesse inspeções nas instalações nucleares do país. Em paralelo, desde o final dos 70, a RPDC iniciou seu programa de mísseis trabalhando numa versão do Scud B soviético que veio a ser testado em 1984.

Com o colapso da ex-URSS, em 1991, o país perdeu sua principal fonte de financiamento e armamentos. Além disso, a RPDC passou por uma série de desastres naturais que significaram um duro golpe em sua agricultura. Mais de três milhões de pessoas morreram entre 1994 e 1998, devido a uma onda de fome. Nessa situação, o regime passou a desenvolver armas nucleares como uma forma de sobreviver se protegendo das ameaças externas, particularmente da ofensiva dos EUA.

Em 1994, os EUA tentaram fechar um acordo acenando com ajuda financeira em troca do fim do programa nuclear norte-coreano, mas ele fracassou. Em setembro de 2002, a nova estratégia de segurança nacional anunciada pelos EUA – a “Doutrina Bush” – colocou a RDPC como parte do “eixo do mal”. Em 2003, a Coreia do Norte terminou deixando o Tratado de Não-Proliferação de armas nucleares. Três anos depois, fez seu primeiro teste atômico. Em 2005 tem início a construção de um novo acordo, o chamado Acordo das 6 Partes envolvendo os EUA, Rússia, China, Japão, Coreia do Sul, além da própria RPDC. Após várias rodadas de negociações, a iniciativa terminou fracassando. Em 2006 a RDPC realiza seu primeiro teste nuclear.

As negociações entre as partes ocorreram ainda em outras oportunidades resultando em acordos de curta duração, mas sem nunca alcançar uma solução que levasse ao fim do programa nuclear da RPDC. Com a chegada de Kim Jong-Un ao poder, em 2011, o programa ganha um novo impulso. O raciocínio básico de Kim é ter armas capazes de chegar aos EUA para evitar um ataque e fortalecer o regime na mesa de negociações.

 

A desnuclearização é um caminho difícil e pode resultar num novo fracasso

Depois da Cúpula de Singapura, uma próxima reunião entre as delegações dos dois países está prevista para ocorrer em breve. Nela deverão ser estabelecidos os passos concretos para o compromisso atingido na terça (12). Mas o caminho a ser percorrido, como já vimos em outros momentos, é longo e difícil.

A possibilidade de que o resultado pretendido pelos EUA seja alcançado – se é que pode ser alcançado – será através de um processo prolongado de negociações tediosas e de implementação ainda mais demorada que viesse a persuadir Kim Jong-Un e seus aliados de que eles poderiam confiar completamente nas garantias de segurança dada pelos EUA. Em outras palavras, isso só seria possível através de uma abordagem chamada de “faseada” (por fases) das negociações da desnuclearização. Nem Washington, nem Pyongyang concordarão em antecipar o processo com as concessões mais delicadas e de maior custo econômico e político. Mesmo que eles mostrassem alguma flexibilidade política nesse aspecto, o processo em si inevitavelmente consumiria muitos meses, provavelmente até anos. O caso do Irã, por exemplo, levou em torno de 22 meses de negociações.

Negociar o desdobramento das fases, seu sequenciamento e cronograma, bem como as etapas recíprocas que facilitariam a consecução de cada uma, será uma tarefa complexa, dados os variados interesses e preocupações das partes envolvidas. Mesmo os EUA, por exemplo, teriam que fazer consultas regulares com Tóquio e Seul para garantir que seus interesses fossem garantidos. Feito isso, ainda sobra ainda o desafio de implementar as etapas acordadas e verificar sua conclusão para satisfação mútua.

Bem, a cúpula de Singapura concluiu o que seria a primeira fase com os EUA suspendendo os exercícios militares e a RPDC os testes nucleares. O secretário de estado Mike Pompeo está agora trabalhando duro na segunda fase que visa garantir o cronograma e seu sequenciamento. Esse é sentido das próximas reuniões. A eliminação efetiva das capacidades nucleares e o dispendioso e demorado desmantelamento de infraestrutura devem necessariamente ocorrer numa fase bem posterior. Assim, o roteiro para a desnuclearização conduzirá a um objetivo a ser atingido, na melhor das hipóteses, apenas a médio prazo.

 

O modelo de acordo a ser adotado é na verdade uma questão de estratégia geopolítica

A retirada dos EUA da JCPOA deixa claro que a questão de fundo da desnuclearização da RPDC envolve uma questão de estratégia geopolítica. Isso é o que explica que os EUA não aceitem o modelo do Acordo Iraniano, ainda que ele tenha se dado sob o critério da verificação.

Existe o argumento que o Irã estava violando o JCPOA e que a UE e a AIEA faziam vistas grossas porque “foram compradas”, na medida que estavam mais interessadas em manter negócios com o país. Mas, independentemente disso, Trump alega também que o JCPOA restringia as atividades nucleares do Irã apenas por um período limitado. Traduzindo, ele não atendia ao critério da irreversibilidade. Acrescenta ainda que o acordo não foi capaz de deter o programa de mísseis balísticos. E, por fim, alega que a liberação de US$ 100 bilhões de ativos internacionais do Irã foi usada como “um fundo para armas, terror e opressão” no Oriente Médio.

O conselheiro de segurança nacional dos EUA, o falcão neoconservador John Bolton, empossado em março desse ano, chegou a falar publicamente que o modelo de acordo a ser seguido com a RDPC seria o da Líbia. Como se sabe, essa declaração abriu uma crise que quase comprometeu a presença de Kim na cúpula de Singapura. Não é por acaso: em 2011, sete anos depois de ter anunciado o fim das atividades nucleares na Líbia em 2003, Kadafi terminou sendo deposto por grupos rebeldes opositores apoiados pela Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), sendo capturado e morto, depois de ser sodomizado em público.

Embora a declaração de Bolton mais pareça uma provocação, Kim realmente teme que seu fim seja o mesmo. Justamente por isso desenvolveu seu projeto nuclear. Assim, Pyongyang não vai baixar a guarda facilmente.

Durante as negociações de 2005, a delegação norte-coreana chegou a propor a Índia como modelo de acordo. O país não faz parte do NPT, sendo apenas acompanhado como membro da AIEA. É parte de acordos que lhe impõem alguns limites, mas que não lhe impedem de ter armas nucleares e até mesmo de ter comércio nuclear com o resto do mundo. Claro, na época os EUA não aceitaram a proposta norte-coreana de adotar modelo semelhante ao da Índia. Sua localização e seu papel no sistema de estados não é o mesmo que o dela, ou seja, um ponto de apoio para os EUA no Indo-Pacífico. Israel é outro caso ilustrativo. Embora tenha armas nucleares, Israel não faz parte do NPT porque se recusa a afirmar ou negar essa condição. Os EUA aceitam essa situação justamente porque Israel é um aliado fundamental no Oriente Médio.

 

Um ponto importante: o futuro da península coreana

Existe uma alternativa ao modelo anunciado por Bolton para a RDPC. No marco de uma desnuclearização, os EUA podem tentar tirar Pyongyang da esfera de influência da China. Ela vem acompanhando tudo muito de perto até porque realmente teme ser passada para trás.

Existe a hipótese de que se alcance a desnuclearização da península, dando em troca garantias econômicas e de defesa realmente efetivas e duradouras à RPDC. Nessa hipótese, uma das variantes é que a desnuclearização venha a desembocar na unificação capitalista da península coreana sob a influência dos EUA. Isso não é fácil, principalmente considerando a disputa com a China. Mas a cúpula entre as duas Coreias realizada simbolicamente em Panmunjom – um povoado que se encontra na zona desmilitarizada que separa os dois estados à altura do paralelo 38 norte, onde foi assinado o armistício de 1953 e que serve de lugar para encontros -, realizada em abril passado, previamente à cúpula de Singapura, pode estar dizendo algo neste sentido.

Desde sua eleição para presidente da Coreia do Sul em maio de 2017, Moon Jae-In vinha tentando abrir um diálogo com Kim Jong-Un. Esse resistia, enquanto tanto os EUA quanto o Japão desaprovavam. Mas a decisão das duas Coreias de realizar em comum os Jogos Olímpicos de Pyongyang em fevereiro-março desse ano significou uma mudança de rumo que culminou na cúpula de Panmunjom. A declaração conjunta que saiu do encontro confirmou um ponto de inflexão na relação entre os dois países ao abrir caminho para um tratado de paz depois de 65 anos do fim da guerra. Frente a isso, depois de tentar mostrar que esse resultado só foi possível graças à sua pressão sobre Pyongyang, Trump não teve outra alternativa senão reconhecer o fato consumado, sob pena de perder as rédeas do processo. Isso pode ter incidido na mudança de sua política em direção a Kim, depois de meses de uma escalada na tensão entre os EUA e Coreia do Norte.

As modificações ocorridas nos últimos tempos nas duas Coreias explicam a reaproximação de Panmunjom. A eleição de Moon (Partido Democrata) tem como pano de fundo uma mudança na situação sul-coreana. Um processo de mobilização que ficou conhecido como a “revolução das velas” terminou levando à queda da ex-presidenta Park Geun-Hye (Partido da Libertação, antigo Grande Partido Nacional rebatizado em 2007), filha do ditador Park dos anos 60-70, acusada de corrupção. Moon é um democrata no plano político e liberal no econômico. Diferente dos governos de Park Chung-hee, pai da presidenta deposta em 2017, que colaborou com a ocupação japonesa e apoiou a presença das tropas norte-americana no país, Moon, além de ser contra a militarização da Coreia do Sul e querer reestabelecer a paz com a Coreia do Norte, é também a favor da reunificação da península coreana.

Kim, por sua vez, tampouco é igual aos seus antecessores. Na verdade, é um reformador. Nas comemorações do ano novo de 2017 começou a aparecer de traje civil e tem cada vez mais modificado os termos clássicos adotados pela nomenclatura. Ele tem dispensado o uso de termos como as ideias de “Juche” (construção socialista à coreana) e o “Kimilsungism-Kimjpngilism” (honrar o pensamento dos predecessores). Ao mesmo tempo em que a desigualdade social aumenta, a Coreia do Norte já possui um sistema econômico híbrido com uma parte da economia estatal, um mercado legal e um ilegal e a corrupção como mecanismo. Como na China dos 70, o país está em marcha a uma transição ao capitalismo. Uma parte da burocracia se torna empreendedora e o consumismo alcança setores cada vez maiores da população.

Teriam os EUA girado à desnuclearização da RPDC tendo em vista a reunificação da península coreana? Essa hipótese, em que pese encontrar o difícil obstáculo da influência chinesa, não pode ser descartada e poderia estar associada à frase de Trump de que a partir da cúpula Singapura “algo muito grande estaria para acontecer”. A alternativa Kadafi não é fácil de ser imposta a Kim. As armas nucleares lhe dão um poder de dissuasão e uma garantia. Em que pese a tremenda pressão econômica, política e militar dos EUA, o fato é que, por ora, Pyongyang conseguiu virar o jogo saindo do isolamento em que se encontrava.

Uma nova tentativa de acordo fracassada talvez seja o mais provável diante de uma ordem mundial questionada e marcada por uma polarização EUA x China. Mas quem vai pagar o enorme custo político de uma nova tentativa de acordo fracassado? Aliás, Trump tirou dividendos da Cúpula de Singapura aumentando sua aprovação interna junto à população. Isso é muito importante tendo em vista que nas eleições legislativas de novembro próximo os republicanos estão atrás dos democratas. Assim, nesse quadro de incertezas, nenhuma hipótese deve ser descartada. Por ora, é esperar para ver.

NOTAS
1 –
O acordo nuclear com o Irã, denominado Plano de Ação Conjunta Global (Joint Comprehensive Plan of Action – JCPOA, em inglês), foi um acordo multilateral assinado por um grupo de países – o P5E+1, composto pela China, Estados Unidos, França, Reino Unido, Rússia, mais a Alemanha construído sob o critério da verificação in loco.