Pular para o conteúdo
Especiais
array(1) { [0]=> object(WP_Term)#20186 (10) { ["term_id"]=> int(4399) ["name"]=> string(19) "Ditadura nunca mais" ["slug"]=> string(19) "ditadura-nunca-mais" ["term_group"]=> int(0) ["term_taxonomy_id"]=> int(4399) ["taxonomy"]=> string(9) "especiais" ["description"]=> string(0) "" ["parent"]=> int(0) ["count"]=> int(71) ["filter"]=> string(3) "raw" } }

Rever a Lei de Anistia

Relatório da CIA comprova envolvimento direto do general Geisel em execuções. Comissão de Direitos Humanos do Senado realiza uma Audiência Pública para discutir os crimes da ditadura

André Freire

Historiador e membro da Coordenação Nacional da Resistência/PSOL

No último dia 10 de maio, veio à tona na imprensa brasileira documentos liberados pela CIA, a Agência de Inteligência dos EUA, que confirmam que execuções sumárias de líderes da resistência contra a ditadura militar foram autorizadas pelo alto-escalão militar, inclusive pelo ex-ditador Ernesto Geisel, que ocupou a Presidência da República.

Nos documentos liberados pela CIA, constava um Relatório de número 99, do ano de 1974, que narrava que Geisel teria avalizado as execuções sumárias durante o governo o presidente militar anterior, Emilio Médici. O texto do Relatório fala em 104 execuções sumárias e que Geisel concordou também em seguir com a essa política de assassinatos durante seu governo.

O referido relatório foi elaborado pelo então diretor da CIA, William Egan Colby, e foi endereçado ao secretário de Estado dos EUA, Henry Kissinger. Embora sua liberação data do início do ano, ele foi divulgado mais amplamente agora, pelo jornalista e pesquisador da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Matias Spektor.

A importância deste relatório é oferecer uma comprovação cabal de que as execuções partiram do centro do poder dos militares brasileiros. Uma prova muito relevante, vinda de uma fonte insuspeita. Afinal, a CIA e o governo dos EUA apoiaram abertamente o golpe de 1964 e a ditadura no Brasil e na maior parte da América Latina.

Diante da forte repercussão negativa e da pressão da opinião pública, em especial das entidades democráticas que lutam pelos direitos humanos e pela punição dos crimes da ditadura, quatro dias depois o governo brasileiro, através de sua Embaixada em Washington, solicitou oficialmente ao Departamento de Estado dos EUA o acesso a estes documentos.

Nesta quinta-feira, dia 24 de maio, a Comissão de Direitos Humanos do Senado Federal vai realizar uma Audiência Pública para discutir os crimes e assassinatos praticados pelos agentes do Estado Brasileiro durante a ditadura militar. Esta atividade vai abordar também o relatório da CIA e sua implicância na discussão sobre a memória e a punição destes assassinatos, de seus executores e mandantes.

Mas, como já era de se esperar, a postura do governo ilegítimo de Temer está longe de ser positiva. O ministro da Defesa, General Joaquim Silva e Luna, fez essa afirmação absurda: “Para o Ministério da Defesa esse tema aí, ele se esgota na Lei da Anistia. A partir daí é uma atividade de historiadores e, se houver demanda, para Justiça”.

Apesar de revoltante, a declaração do ministro de Temer (o primeiro militar na Defesa após muitos anos) nos coloca de frente da grande discussão envolvida na divulgação deste Relatório da CIA: é necessário e urgente rever a Lei de Anistia, que data do ano de 1979, quando ainda perdurava a ditadura militar em nosso país. Essa Lei tem um grande mérito: anistiou os presos, perseguidos e exilados políticos. Mas, ao mesmo tempo, carrega em si uma grande contradição, extremamente reacionária: essa mesma Lei anistiou também os militares que praticaram crimes, perseguições, torturas e assassinatos durante o “período de chumbo” da ditadura militar.

Não é só a esquerda socialista e os ativistas dos direitos humanos que levantam a discussão sobre a revisão da Lei de Anistia. Recentemente, em fevereiro desse ano, a própria Procuradora Geral da República, Raquel Dodge, nomeada por Temer, pediu ao Supremo Tribunal Federal (STF) que desarquive o caso do assassinato do ex-deputado Rubens Paiva, na prática questionando a abrangência da aplicação da Lei da Anistia, de 1979. De forma imediata, a cúpula das Forças Armadas reagiu violentamente contra a iniciativa, defendendo que nada seja revisto e a impunidade  mantida.

No dia 15 de maio, já depois da divulgação do Relatório da CIA, a Procuradora Geral da República, enviou um recurso ao STF para que seja aceita a denúncia contra o coronel reformado Audir Santos Maciel, por assassinato e ocultação de cadáver, durante o período da ditadura militar.  No seu Parecer, Raquel Dodge pede que o STF analise a ação movida pelo PSOL, que discute a revisão de elementos da Lei de Anistia.

Por isso, devemos aproveitar toda a discussão aberta pela divulgação dos documentos da CIA, para retomar e fortalecer o importante debate sobre a revisão da Lei de Anistia de 1979. Para que o Brasil deixe de constar, de forma vergonhosa, na lista de países que não puniram nenhum dos torturadores e assassinos do período tenebroso da ditadura militar. Muito diferente de outros países do Cone Sul, como Argentina e Uruguai, que vem de forma paulatina, mais ou menos rápida, realizando punições a estes criminosos de Estado.

 

Bolsonaro apoia novamente os crimes da ditadura

Jair Bolsonaro, deputado federal e pré-candidato do PSL a Presidência da República, aproveitou toda a discussão referente ao relatório da CIA para mais uma vez destilar seu ódio e demonstrar  total comprometimento e apoio a ditadura militar brasileira.

O líder atual da extrema-direita chegou a insinuar de que o relatório teve a motivação de atingir a sua candidatura ao Palácio do Planalto. E, dando novamente demonstrações inequívocas de suas inclinações fascistas, comparou as graves informações de execuções contidas no relatório a tapas numa criança: “Quem nunca deu um tapa no bumbum de um filho, e depois se arrependeu?”

As declarações de Bolsonaro, além de criminosas, são mais uma demonstração de que a sua candidatura é uma ameaça às já parcas liberdades democráticas que o povo trabalhador tem direito. Portanto, enfrentar seu projeto político, de forma combativa, mobilizada e unitária, é uma das grandes tarefas da esquerda socialista na conjuntura atual brasileira.