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Especiais
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O método dialético de Marx: investigação e exposição crítica do objeto

Eduardo F. Chagas – UFC/CNPq 1*

O método dialético de Marx foi pouco trabalhado, embora constitua um tema de relevância especial para o desenvolvimento da teoria marxista, particularmente o papel que ele exerce na discussão do significado e da relevância dos conceitos de investigação e exposição enquanto momentos que o constituem. Esses momentos constituintes do método dialético de Marx, investigação e exposição, foram, muitas vezes, ou desprezados, por serem identificados, sem resguardar as diferenças, com a dialética hegeliana que, muitas vezes, comprometia o caráter materialista do próprio método de Marx, ou foram recusados pura e simplesmente em nome de um cientificismo atribuído ao pensamento de Marx.2

Ao contrário do método especulativo, próprio da dialética hegeliana, e do empirismo imediato, próprio da economia clássica moderna, que foram incapazes de realizar uma investigação enquanto apreensão da “lógica”, da “racionalidade”, imanente ao próprio real, e uma exposição crítica desse real, enquanto reconstrução, no plano ideal, do movimento sistemático do próprio real, o método dialético de Marx tem como sujeito o próprio real, a lógica da coisa e não a coisa da lógica, do conceito, razão pela qual ele nem é um método subjetivista, tal como o idealismo especulativo acrítico e abstrato, que pressupõe um pensamento autonomizado enquanto demiurgo do real, isto é, um sujeito que dá, a partir da ideia, sentido à realidade, tomando-a como um caos desordenado, nem um método puramente objetivo, como o empirismo acrítico, o positivismo, que toma o pensamento como atividade passiva e a realidade como algo já acabado, pronto, dada imediatamente pela experiência direta, assumindo e ratificando ingenuamente a sua existência empírica, positiva.

Com base nessas considerações preliminares, pode-se dizer que o método dialético de Marx pressupõe, sim, dois momentos inseparáveis: a investigação (ou a pesquisa) e a exposição (ou a apresentação). A investigação, ou o método de investigação (Forschungsmethode), é o esforço prévio de apropriação, pelo pensamento, das determinações do conteúdo do objeto no próprio objeto, quer dizer, uma apropriação analítica, reflexiva, do objeto pesquisado antes de sua exposição metódica. E a exposição, ou o método de exposição (Darstellungsmethode), não é simplesmente uma auto-exposição do objeto, senão ele seria acrítico, mas é uma exposição crítica do objeto com base em suas contradições, quer dizer, uma exposição crítico-objetiva da lógica interna do objeto, do movimento efetivo do próprio conteúdo do objeto.

A exposição é uma expressão (tradução) ideal do movimento efetivo do real, isto é, trata-se não de uma produção, mas de uma reprodução do movimento efetivo do material, do real, de tal modo que o real se “espelhe” no ideal. Reproduzir quer dizer aqui para Marx reconstruir criticamente, no plano ideal, o movimento sistemático do objeto, pois o objeto não é dado pela experiência direta e imediatamente. Requer aqui, portanto, um trabalho prévio de investigação (“escavação” e “garimpo”), de maturação do objeto, de sua captação com detalhes, de suas formas de evolução, de suas conexões íntimas, para depois expor adequadamente, sistemático e criticamente, a sua lógica interna; vale dizer, é preciso um esforço intelectual de investigação, de apropriação do conteúdo, de apreensão do movimento interno, efetivo, do real, e de exposição, de expressão, ideal desse conteúdo, para livrar-se do “envoltório místico”, da “crosta idealista”3, extraindo o núcleo, o “caroço racional” de dentro das coisas, pois, afinal de contas, “a pérola não sai sozinha da ostra”.

Neste sentido, o método dialético de Marx não é um instrumento, uma técnica de intervenção externa do pensamento ao objeto, como que um caminho pelo qual o pensamento manipula, a partir de hipóteses exteriores, o objeto.4 O pensamento tem, na verdade, que se livrar de opiniões pré-concebidas, de conceitos externos ao objeto, de hipóteses que pairam acima dele, para nele mergulhar e penetrá-lo, considerando apenas o seu movimento, para trazer à consciência este trabalho da própria lógica específica do objeto específico.

Já no Manuscrito de 1843, no Manuscrito inconcluso de Kreuznach, intitulado Da Crítica da Filosofia Hegeliana do Direito – Crítica do Direito Hegeliano do Estado (Aus der Kritik der hegelschen Rechtsphilosophie. Kritik des Hegelschen Staatsrechts) (1843), Marx, partindo de sua crítica à filosofia política de Hegel, analisa o método dialético de Hegel, deixando claro que ele transcende o empírico na sua especificidade material, se mantém por cima do finito, do concreto, e autonomiza o abstrato, a ideia, o pensamento, transformando-o em sujeito real, de tal forma que o finito aparece apenas como resultado dele. Tal fato se evidencia na relação que Hegel estabelece entre o Estado e a família e a sociedade civil. A tese central de Hegel, na sua obra Princípios da Filosofia do Direito (Grundlinien der Philosophie des Rechts) (1821), é de que o Estado é uma essência independente, instância autônoma, necessária (a suprema realidade social do homem), que possibilita a unidade da família e da sociedade civil. Hegel concebe a sociedade civil, tal como a família, como manifestação conceitual do Estado.

Deste modo, a relação entre família, sociedade civil e Estado se apresenta carente de significado próprio, assumindo o caráter de um fenômeno, de um predicado da Ideia: a família e a sociedade civil pertencem à essência do conceito racional do Estado, sendo, pois, momentos de sua esfera ideal. Para Hegel, a família e a sociedade civil são concebidas como esferas ideais do Estado, como esferas de sua finitude, como sua infinitude mesma. O Estado é que se divide na família e na sociedade civil, que as pressupõe, e o faz para surgir de sua idealidade como espírito real infinito para si.

As esferas da família e da sociedade civil, isto é, da individualidade e da particularidade, são, para Hegel, como se viu, momentos ideais do Estado (da universalidade) e constituem o seu aspecto empírico e finito. É, porém, por meio dessas esferas, família e sociedade civil, que o Estado sai de sua idealidade e se torna uma universalidade concreta, quer dizer, um espírito real, infinito. Por isso, os indivíduos alcançam, por um lado, uma realidade finita e particular, por intermédio da família e da sociedade civil, e, por outro, uma realidade infinita e universal, mediante o Estado. Assim sendo, os interesses particular e universal do indivíduo se conservam e persistem no âmbito dos interesses e fins do Estado, de tal forma que a esfera estatal não é algo de alheio ao indivíduo, pois é nela que o indivíduo se torna plenamente livre.

Hegel concebe a conexão da família e da sociedade civil com o Estado como determinação, produto da Ideia, pois a Ideia é o demiurgo de uma realidade hierarquizada, em cujo teto reina, imperturbavelmente, o espírito do Estado. Assim sendo, a divisão do Estado em família e sociedade civil é ideal, quer dizer, pertence à essência do conceito racional do Estado. Com efeito, o procedimento metodológico usado aqui por Hegel é o seguinte: a Ideia (o Estado) é o sujeito determinante, o princípio fundante, e os sujeitos reais, a família e a sociedade civil, são predicados, momentos objetivos da Ideia. Marx inverte esta orientação de Hegel e faz do elemento real (a sociedade civil) o verdadeiro sujeito, no qual o pensamento (o Estado político) é tão-somente sua manifestação.

Em outros termos, se em Hegel há a inversão do empírico em especulativo, pois, para ele, a Ideia é o demiurgo da realidade, para Marx, a realidade efetiva é o demiurgo do pensamento; isto significa que Marx põe como condicionado, determinado, produto ou predicado (o Estado) o que Hegel considera condicionante, determinante, produtor ou sujeito, e situa como sujeito (a sociedade civil) o que Hegel julga predicado.5 Quer dizer, para Marx, é o contrário: é a sociedade civil (enquanto sistema de interesses privados) que produz o Estado político (enquanto representante aparente do interesse geral, coletivo), e não o Estado que engendra a sociedade civil; da sociedade civil, resulta o Estado, dado que este é caracterizado pelo desenvolvimento “natural” da família e pelo crescimento artificial da sociedade civil. Hegel faz dessa questão um “misticismo lógico” (a realidade transformada em determinação da Ideia), uma antinomia indissolúvel. Vejamo-la:

§ 261. Frente às esferas do direito e do bem-estar privados, da família e da sociedade civil burguesa, o Estado é, por um lado, uma necessidade externa e um poder superior, a cuja natureza estão subordinadas e da qual dependem suas leis e seus interesses; mas, por outro lado, é ele o fim imanente de ditas esferas e tem suas forças na unidade de seu fim universal último e dos interesses particulares dos indivíduos, dado que estes têm deveres para com o Estado, na medida em que eles, ao mesmo tempo, usufruem de direitos. (§ 155)..6

O método dialético-especulativo de Hegel mistifica a existência real ou material do Estado, porque não toma como ponto de partida os sujeitos reais e apreende, em vez da própria natureza do conteúdo do Estado, a Ideia ou a substância abstrata como determinação estatal. Tal determinação não é considerada a partir de seu conteúdo concreto, real, mas sim como forma abstrata, lógico-metafísica, uma vez que a determinação formal, absolutamente abstrata, aparece como conteúdo concreto. É assim que Marx desmonta o método dialético de Hegel, a fim de demonstrar que, em suma, sua Filosofia do Direito é apenas um tratamento da lógica do objeto, isto é, um desenvolvimento da Ideia, das determinações da Lógica no empírico, quer dizer, uma articulação da própria Lógica, como que um capítulo ou um mero parênteses de sua obra anterior, a Ciência da Lógica. Por isso, diz Marx que, aqui, não estamos fazendo “Filosofia do Direito”, senão Lógica.

Depois dessa crítica à especulação como método científico, exposto no Manuscrito de Kreuznach, revelando de forma crítica as “mistificações” da filosofia política hegeliana, em A Sagrada Família (Die heilige Familie) (1844) ou Crítica da Crítica Crítica, contra Bruno Bauer e consortes (Kritik der kritischen Kritik. Gegen Bruno Bauer und Consorten), particularmente no capítulo intitulado “O Segredo da Construção Especulativa”, Marx e Engels enfatizam, de forma instrutiva, o caráter abstrato, apriorístico, do método idealista, do método dialético-especulativo de Hegel, que quer criar, milagrosamente, o mundo real a partir de categorias abstratas, passar de uma abstração ao contrário da abstração, ou, com outras palavras, quer, partindo do “ser conceitual irreal”, de uma ideia geral, de um conceito universal-vazio, conceber “seres naturais reais”, coisas concretas, dando-lhes uma significação mística, sobrenatural.

O método especulativo-abstrato, ao tratar da realidade, como, por exemplo, das frutas concretas, maçãs, pêras, morangos, amêndoas etc., elabora uma ideia abstrata, um conceito geral de fruta, que existe fora do próprio homem. Tal ideação ou conceito abstrato, a fruta, separada das diferenças particulares, específicas, vale dizer, dos frutos singulares reais (maçã, pêras, morangos, amêndoas), é tomada pelo método especulativo como a unidade (a totalidade universal) da aparência das diversidades, como a substância, a verdadeira essência, como aquilo que existe de essencial nas frutas concretas; e os seres reais, as frutas singulares, são inessenciais, meras aparências, desaparecendo, por conseguinte, aqui suas diferenças reais, individuais, ou seja, a particular riqueza de suas determinações.

Assim sendo, o que existe de fundamental no concreto, de essencial na pêra ou na maçã não é o ser real, as “propriedades naturais” da pêra, da maçã, o que é perceptível aos sentidos, mas as “propriedades especulativas”, a essência abstrata, atribuída ao objeto pela atividade autônoma do eu ou do sujeito. Portanto, a essência, a fruta, não brota do solo material, não é extraída do ser, mas do espírito, do cérebro, por conseguinte, ela é abstrata e seus momentos, maçã, pêra …, também o são; quer dizer, ela é apenas uma representação abstrata do eu, e as frutas particulares reais, “as frutas profanas”, são seres conceituais abstratos, simples manifestações vivas do conceito, “encarnações” da ideia, “cristalizações” ou modos de existência da fruta única, absoluta.

O entendimento limitado do método dialético-abstrato “distingue, é verdade, uma maçã de uma pêra e uma pêra de uma amêndoa”, mas sua “razão especulativa declara que essa diferença sensível é não-essencial e sem interesse.” Tal método “vê na maça a mesma coisa que na pêra, e na pêra a mesma coisa que na amêndoa, a saber, ‘a fruta’.”7 Desta maneira, esse procedimento metodológico, que é uma exposição dissimulada, e não real, da própria coisa, leva o homem a tomar o desenvolvimento especulativo como real, e o desenvolvimento real por especulativo.

Para o idealismo especulativo, a ideia é, como se notou, o demiurgo (o sujeito) do real, pois este é produto do pensamento que se aprofunda em si, movimentado em si mesmo. Assim sendo, o movimento do pensamento aparece aqui como um ato produtor, e o mundo produzido surge como realidade única. Hegel confunde, nos dizeres de Marx e Engels, o processo lógico com o processo real, tomando este apenas como fenômeno, aparição do lógico, escamoteando, assim, suas contradições e conflitos. A dialética hegeliana é a dialética do pensamento puro; nela, o lógico é

o valor especulativo, o valor do pensamento do homem e da natureza – sua essência tornada completamente indiferente contra toda determinidade efetiva e, por isso, não efetiva – é o pensamento exteriorizado, que, por conseguinte, se abstrai da natureza e do homem efetivo; o pensamento abstrato.8

Nos Manuscritos Econômico-Filosóficos (Ökonomisch-philosophische Manuskripte) (1844), em especial no terceiro manuscrito, intitulado “Crítica da Dialética e da Filosofia Hegelianas em Geral”, Marx critica esse idealismo especulativo, particularmente a dialética especulativa de Hegel, que é, para Marx, o método de exposição do movimento lógico, espiritual, conceitual, e de sua autodeterminação, que não dá conta da realidade concreta, do homem e da natureza.

A dialética especulativa de Hegel começa com a alienação do infinito (da substância, do universal abstrato), que se nega (elimina o infinito) e se põe como determinado, finito (particular), negando, em seguida, o finito, para restabelecer o infinito. Por meio desse procedimento metodológico de Hegel, da dialética da negatividade, da negação da negação, feito princípio motor e criador, não ocorre a afirmação do ser verdadeiro, objetivo, mas a confirmação da abstração, uma vez que o infinito, o espírito absoluto, aparece como o espírito do mundo alienado, que compreende a si mesmo dentro dos limites da abstração, da auto-alienação.

O método especulativo de Hegel é abstrato, acrítico, pois toda a história, toda a produção, não é vista como a história real do homem como sujeito, mas apenas como expressão abstrata, lógica, especulativa do processo histórico, resultado da história da produção do espírito abstrato, pois só o espírito constitui a autêntica essência do homem, e a verdadeira forma do espírito é o espírito pensante, o espírito lógico, especulativo.“A humanidade da natureza e da natureza produzida pela história, dos produtos do homem, manifesta-se no fato de estes serem produtos do espírito abstrato e nessa medida, portanto, momentos espirituais, essências do pensamento.”9 Desta forma, a riqueza, o poder do Estado, a sociedade civil, a família e fatos sociais análogos, por exemplo, são fenômenos espirituais, apenas “entidades alienadas do ser humano”, concebidos na sua forma espiritual, em sua essência abstrata, “por conseguinte, simplesmente um estranhamento [Entfremdung] do pensamento filosófico puro, isto é, abstrato.”10

A alienação, concebida por Hegel, se reduz, pois, à alienação da autoconsciência, e a sua superação é somente a negação da oposição entre o pensamento abstrato (o para-si) e a realidade sensível ou a existência sensorial real (o em-si), entre sujeito e objeto, porém circunscrita ao interior do próprio pensamento. Quer dizer, tudo finda numa alienação do pensamento, e tudo se resolve na esfera desse pensamento abstrato. A abolição, por exemplo, do estranhamento, da propriedade privada, da vida civil egoísta, não é resultado de um ato prático, transformador, mas de uma superação meramente especulativa, idealística, que ocorre só no interior do próprio pensamento, na esfera da pura consciência, isto é, na abstração, como ato puramente formal, deixando-os persistir como tais no mundo objetivo e real.

Tal como haviam feito anteriormente em A Sagrada Família, Marx e Engels, em A Ideologia Alemã (Die deutsche Ideologie) (1845-1846), mantêm, de modo explícito, a sua postura anti-especulativa, opondo-se às idéias tomadas como abstratas, autônomas, pelos neo-hegelianos (Feuerbach, Bauer e Stirner). Marx e Engels enfatizam que as ideias pertencem a uma época, e não uma época a uma idéia determinada, ou seja, que não se explica a práxis a partir das ideias, mas se explica as formações ideológicas a partir da práxis material, pois que “não é a consciência que determina a vida, mas a vida que determina a consciência”.11 Ao contrário do pensamento sem pressuposto, eles partem de pressupostos reais e inelimináveis, da produção material da vida, dos meios para satisfazer as necessidades vitais (comer, beber, ter habitação, vestir-se), com os quais “a produção das idéias, das representações da consciência está […] imediatamente entrelaçada”.12

Portanto, embora as idéias, as representações, sejam produzidas pelos homens, elas, e todas as formas de ideações, como a moral, a teologia, a filosofia e qualquer outra ideologia, não são desligadas dos fatos, desprovidas de pressupostos, incondicionadas, auto-engendradas, mas são expressões ideais das circunstâncias reais, das condições materiais de existência, extraídas do mundo real, isto é, tem como raiz, como fonte primária, a produção e o intercâmbio material da vida social-humana.

Passagens expressivas sobre o método, presentes em A Ideologia Alemã, são retomadas por Marx em sua obra A Miséria da Filosofia (Das Elend der Philosophie) (1847). Nesta obra, capítulo II, “A Metafísica da Economia Política”, especialmente no §1, que trata diretamente da questão do método, Marx, em resposta ao Sistema das Contradições Econômicas ou à Filosofia da Miséria (Système des Contradictions Économiques ou à Philosophie de la Misére de Proudhon) (1846), demonstra a inconsistência metodológica das argumentações de Proudhon, pois o método deste socialista francês reproduz, de forma vulgar, mal-assimilado, o método especulativo-hegeliano, na medida em que toda realidade se reduz, como em Hegel, a um movimento puramente conceitual. Abstraindo da sociedade, ou dos fatos, a base material, Proudhon alcança como substância apenas as categorias lógico-formais.

É para se admirar, […] se todas as coisas se apresentam como categoria lógica? É para se admirar, ao abandonar, pouco a pouco, tudo aquilo que constitui a individualidade de uma casa, ao abstrair dos materiais de que ela se compõe e da forma que a distingue, se tem, finalmente, ainda um corpo; ao abstrair dos limites desse corpo, se tem ainda um espaço; enfim, ao abstrair das dimensões desse espaço, se tem nada mais do que a quantidade em si, a categoria lógica da quantidade? Se abstrairmos, consequentemente, de qualquer assunto todos os seus pretensos acidentes, animados ou inanimados, homens ou coisas, assim temos razão em dizer que em última abstração chegamos a ter como substância apenas as categorias lógicas.13

O método metafísico da economia política de Proudhon é irrefletido e equivocado, pois ele não implica o movimento histórico que engendra as coisas, não as explica, ou, melhor expressando, nele, as coisas estão às avessas, porque, em vez de as ideias ou categorias serem expressões do movimento histórico das relações sociais de produção, antes são as relações materiais expressões de ideias ou de categorias. Se, para Marx, os princípios, ideias e categorias são produzidos de acordo com as relações sociais de produção, pois eles são abstrações, expressões teóricas da realidade, para Proudhon, ao contrário, as relações reais são encarnações das categorias, “da razão impessoal da humanidade”. Neste sentido, assim como no método especutativo-abstrato de Hegel, o método de Proudhon reduz, pois, tudo o que existe, tudo o que vive sobre a terra e sob a água, à força da abstração, o concreto ao abstrato, diluindo, deste modo, toda a realidade no mundo das abstrações, no universo das categorias lógicas.

Proudhon quer aplicar a dialética de Hegel às categorias da economia política, mas ele se apropria dela, nas palavras de Marx, de forma muito “mesquinha”, pobre, construindo apenas uma metafísica da economia política.

Sendo toda a coisa reduzida a uma categoria lógica, e todo o movimento, todo o ato de produção ao método, naturalmente se segue que toda relação entre produtos e produção, entre objetos e movimento, se reduz a uma metafísica aplicada. O que Hegel fez em relação à religião, ao direito etc., procura o sr. Proudhon fazer em relação à economia política.14

Para Proudhon, a dialética consiste de um simples movimento antagônico, encerrado na antítese entre o positivo e o negativo, o sim e o não. Ele pensa assim:

O sim torna-se não, o não torna-se sim, o sim torna-se ao mesmo tempo sim e não, o não torna-se ao mesmo tempo não e sim, desta maneira os contrários mantêm-se, neutralizam-se, suprassumem-se. A fusão desses dois pensamentos contraditórios forma um pensamento novo, que é a sua síntese. Esse pensamento novo desdobra-se ainda em dois pensamentos contraditórios, que se formam, por sua vez, numa nova síntese. Deste trabalho de geração nasce um grupo de pensamentos. Esse grupo de pensamentos segue o mesmo movimento dialético de uma categoria simples e tem por antítese um grupo contraditório. Desses dois grupos de pensamentos nasce um novo grupo de pensamento, a síntese de ambos..15

Preso a essa “dialética” maniqueísta, Proudhon pensa que toda a realidade, qualquer categoria econômica, tem dois lados, a oposição entre o lado bom (a coisa boa) e o lado mau (a coisa má), a parte da vantagem (do conveniente) e a da desvantagem (do inconveniente), as quais constituem a contradição de cada categoria. Nesse sentido, para superar essa contradição, basta, na opinião de Proudhon, conservar a ala boa, eliminando o “desvio” da parte má, para se chegar à síntese. O método metafísico da economia política de Proudhon se afasta do método dialético, pois,

quando o processo do movimento dialético se reduz ao simples procedimento de opor o bom ao mau, de colocar problemas que tendem a eliminar o mau, e de aplicar uma categoria como antídoto para outra, as categorias não têm mais autonomia; a idéia “já não funciona”, já não tem vida nela. Já não se põe nem se decompõe em categorias. A sucessão das categorias transformou-se em um suporte puro. A dialética já não é o movimento da razão absoluta. Já não existe mais dialética, há quando muito apenas moral pura.16

Como tudo tem, nessa dialética proudhoniana, dois lados, assim a escravatura, a exploração, o capitalismo em geral tem também os seus dois lados. O importante não é negá-los, e sim ver os dois lados, eliminando apenas o lado mau, mas conservando “o lado bom” da escravatura, da exploração do capitalismo etc. Onde estaria “o lado bom” da escravatura? Para Proudhon, ela “é o eixo da indústria burguesa, do mesmo modo que as máquinas etc.” Sem ela,

não teríamos o algodão; sem o algodão não teríamos a indústria moderna. Foi a escravidão que deu às colônias o seu valor, foram as colônias que criaram o comércio mundial, que é a condição da grande indústria. Por isso a escravidão é uma categoria econômica da maior importância.

E mais:

Sem a escravidão, a América do Norte, o país mais progressivo, transformar-se-ia num país patriarcal. Tire-se a América do Norte do mapa do mundo, e tem-se a anarquia, a decadência completa do comércio e da civilização modernos. Faça-se desaparecer a escravidão e ter-se-á anulado a América do mapa dos povos.17

Assim, por meio dessas reflexões, desses procedimentos metodológicos de Proudhon, tudo passa a ser justificado, pois a escravatura, bem como a exploração, por serem categorias econômicas já estabelecidas, eternas, existiram e sempre existirão explícita ou disfarçadamente, perdendo seu caráter de produtos históricos e transitórios.

Uma formulação mais acabada, embora resumida, do método de Marx encontra-se na Introdução (Einleitung) aos Fundamentos (Grundrisse) (1857-58), no Prefácio (Vorwort) e na Introdução (Einleitung) (1859) a Para a Crítica da Economia Política (Contribuição) (Zur Kritik der Politischen Ökonomie) (1859) e no Pósfácio da segunda edição alemã (Nachwort zur zweiten Auflage) (1873) de O Capital (Das Kapital) (1867). Logo no início da Introdução aos Grundrisse, Marx demonstra que as relações econômicas são determinadas social e historicamente, e é, precisamente, a ausência desse caráter histórico o equívoco central da economia clássica. “Neste esquecimento encontra-se toda a sabedoria dos economistas modernos que demonstram a eternidade e a harmonia das relações sociais existentes.”18

O ponto de partida da investigação de Marx é a produção material, num determinado estágio do desenvolvimento social-humano, mas não a produção em geral, que é não só uma abstração genérica, pobre e vazia, como também apologética.

Indivíduos que produzem em sociedade, portanto produção de indivíduos socialmente determinada é, naturalmente, o ponto de partida. O caçador e o pescador individuais e isolados, com que começam Smith e Ricardo, pertencem às imaginações carentes de fantasia do século XVIII. São “robinsonadas” que não expressam de forma alguma, como imaginam alguns historiadores da cultura, uma simples reação contra os excessos de requinte e um retorno a uma vida natural mal compreendida. Do mesmo modo, o contrato social de Rousseau, que estabelece, entre sujeitos independentes por natureza, relações e laços por meio de um pacto, nem por isso se baseia num tal naturalismo. Isto é aparência, e somente aparência estética das pequenas e grandes robinsonadas. Na realidade, trata-se de uma antecipação da “sociedade burguesa” que se vinha preparando desde o século XVI, dando passos gigantescos para a sua maturidade no século XVIII.19

Ao ter mostrado que a produção material não é uma produção em geral, abstrata, mas é determinada socialmente, Marx delimita seu objeto de investigação, a saber, a produção burguesa moderna, e defende o argumento de que nela os indivíduos não podem ser tomados, como aparecem na economia política, atomisticamente, já que eles são membros de um conjunto social, ou seja, se encontram interligados por meio de relações complexas que determinam seu ser social.

Marx critica aqui as “robinsonadas” do século XVIII, típicas não só da economia política clássica, como também do contratualismo, do utilitarismo e do racionalismo e do empirismo modernos, que vêem o indivíduo não como um resultado, mas como ponto de partida da história, o indivíduo como um ser independente, isolado, fragmentado, livre de seus laços sociais, de sua unidade, dificultando, assim, entender a condição dele como mero instrumento, simples meio para a realização dos fins privados, egoístas, da sociedade burguesa moderna. Ao contrário das teorias anteriormente mencionadas, Marx toma o indivíduo não como um dado da natureza, mas como um produto da história, como

um zoon politikon, [animal político], não só um animal social, mas um animal que só pode isolar-se em sociedade. A produção do indivíduo isolado fora da sociedade […] é uma coisa tão absurda como o seria o desenvolvimento da linguagem sem indivíduos que vivem e falam juntos em conjunto.20

Marx rejeita aqui, pois, o atomismo social, ou seja, as concepções atomísticas de sociedade, no qual o indivíduo singular (o individualismo e o subjetivismo metodológicos) era o ponto de partida, anterior à sociedade, ao todo, pré-social, ou era visto à parte da comunidade, puramente egoísta, trazendo, com isto, dificuldades para se compreender a sociedade como um todo complexo e preexistente, do qual o indivíduo é parte.21

O caráter ideológico do pensamento dos economistas clássicos evidencia-se também no momento em que eles concebem a vida social como governada por leis fixas, naturais, universais abstratas, válidas para todos os indivíduos em todas as sociedades, dando a entender às ocultas que as relações burguesas são regidas por leis eternas, imutáveis, e tratam a produção, a distribuição, a troca e o consumo como partes isoladas do todo, esferas autônomas, momentos exteriores, não relacionados entre si, do processo econômico. Ao contrário dessa parcialidade e fragmentação do processo econômico feita pelos economistas clássicos, Marx parte da produção material, socialmente determinada, e demonstra que ela é um todo orgânico, dinâmico, uma rica totalidade de relações diversas, na qual seus momentos constitutivos, a distribuição, a troca e o consumo, estão concatenados entre si, formando unidade sintética, embora contraditória: a produção oferece, na forma material, o seu objeto, isto é, os elementos materiais do consumo, pois sem objeto não há consumo.

A produção determina, porém, não só a forma objetiva, como também subjetiva do objeto, isto é, ela não só fornece o objeto material à necessidade do consumidor, como também cria o consumidor, a sua necessidade, ao determinar o modo, a forma específica em que o objeto deve ser consumido. Como diz Marx: “A fome é a fome, mas a fome que se satisfaz com carne cozinhada, comida com faca e garfo, não é a mesma fome que come a carne crua servindo-se das mãos, das unhas, dos dentes.”22 Do mesmo modo: “O objeto de arte – tal como qualquer outro produto – cria um público sensível à arte e capaz de desfrutar a beleza.”23

Portanto, a produção cria o objeto para o indivíduo (para o consumo), o modo de consumi-lo e a necessidade no indivíduo desse produto (o apetite, o desejo do consumo). E o consumo é o móbil que impulsiona a produção, que põe em movimento o processo produtivo, na medida em que ele produz a necessidade de um novo produto, de uma nova produção. Entre a produção e o consumo situa-se a distribuição, que não pode ser uma repartição coletiva, igualitária, dos produtos, porque ela não é independente, e sim determinada inteiramente pela estrutura da produção, que é privada, particular. Nesse sentido, a distribuição dos produtos é determinada pela forma da produção (privada), da distribuição dos instrumentos de produção (privados) e da função (capital e trabalho) dos membros da sociedade na produção. Do mesmo modo, a troca não é independente e indiferente à produção, e, se a produção é privada, a troca também o é.

Portanto, produção, distribuição, troca e consumo são elos de um todo único; eles não são idênticos nem exteriores um ao outro, mas momentos diferentes, embora recíprocos, no interior de uma unidade, de uma totalidade orgânico-dialética. Em O Capital (1867), Marx parte, por exemplo, da forma simples do valor, a mercadoria, porque dentro dela se encontram as contradições básicas da sociedade capitalista. A mercadoria é, no entanto, uma parte articulada a um todo, a uma totalidade, o capitalismo como sistema econômico, social e político. Essa totalidade em sua concreticidade clara e ricamente articulada, enquanto unidade da diversidade, síntese de múltiplas determinações, é o que Marx designa de o concreto, o efetivo, que se distingue do real imediato, empírico, como ponto de partida, próprio dos economistas clássicos.

A economia política clássica parte superficialmente de um todo, de uma totalidade abstrata, a nação, o Estado, a população. Esse todo, de onde ela parte, é, entretanto, imediato, empírico, por isto ele é, em verdade, um abstrato desordenado, obscuro, vazio de conteúdo social, econômico e político, carente, pois, das mediações e determinações capazes de torná-lo inteligível. Marx demonstra que a população, por exemplo, por si só é uma representação inorgânica da realidade, “caótica do todo”, uma abstração, pois ela se compõe, em verdade, em classes sociais, e estas não podem ser compreendidas sem a contradição entre o capital e o trabalho assalariado, e estes, por sua vez, sem a troca e a divisão do trabalho. Marx quer, com isto, superar, por um lado, o método empirista da economia política, que parte, sim, do real, mas permanece no seu nível simples, aparente, empírico-imediato, sem, contudo, cair, por outro lado, no método especulativo hegeliano, que concebe o real apenas como um resultado da atividade de conceber, do pensamento, fechado e concentrado em si mesmo.

O método de Marx é, como expresso, uma crítica não só à economia política clássica, como também à dialética hegeliana. E, embora faça valer a prioridade ontológica desse real ante o real produzido pelo pensamento que engendra a si mesmo, separado e acima do objeto, produzido só idealmente, abstratamente no pensamento, ele não nega, de maneira nenhuma, o momento em que o real, a partir do próprio real, deva ser pensado, concebido, reproduzido por meio do pensamento, isto é, reconstruído pelo pensamento como concreto pensado. Mas para reconstruir o concreto, a totalidade orgânica, deve-se, segundo Marx, partir do inferior para o superior, do mais simples e abstrato para o mais complexo e efetivo, da aparência para a essência, pois, como diz ele no Prefácio (Vorwort) de 1859 a Para a Crítica da Economia Política (Contribuição): “parece-me que antecipar resultados que é preciso demonstrar em primeiro lugar é pouco correto, e o leitor, que quiser, em geral, seguir-me, deve elevar-se do particular ao geral.”24

Marx começa, portanto, pelo real imediato, que é ainda nesse nível abstrato, pobre, para, em seguida, a partir dele mesmo, reconstruí-lo, ou reproduzi-lo (mas não produzi-lo), pelo pensamento como uma “categoria mental concreta”. Como adverte ele, “é preciso nunca esquecer, a propósito da evolução das categorias econômicas, que o sujeito, aqui a sociedade burguesa moderna, é dado tanto na realidade como no cérebro”.25 Em síntese, o método de Marx é, como já enunciado, o método da reconstrução do real por meio do pensamento e da exposição (ou apresentação) crítica desse próprio real.


Esse método de pesquisa (reconstrução) e exposição (crítica) do real na qualidade de concreto mediatizado é reafirmado por Marx, como expresso, no referido Pósfácio (Nachwort) (1873) de O Capital. Aqui Marx confirma o que já se demonstrou no início deste artigo, a saber, por um lado, sua crítica ao método empirista da economia clássica, para a qual o real é dado de forma simples e imediata. Mas “deve-se, sem dúvida, distinguir, formalmente, o método de exposição do método de pesquisa.

A investigação tem de apoderar-se da matéria, em seus pormenores, de analisar suas diferentes formas de desenvolvimento e de descobrir a conexão interna que há entre elas. Só depois de concluído esse trabalho, é que se pode apresentar, adequadamente, o movimento real. Se isto se consegue, ficará espelhada, no plano ideal, a vida da realidade pesquisada”.26 De outra parte, Marx reafirma (o que já foi também demonstrado) seu confronto com a dialética mistificada de Hegel:

Meu método dialético, por seu fundamento, não só difere do método hegeliano, como também é a ele inteiramente oposto. Para Hegel, o processo do pensamento, – que ele transforma em um sujeito autônomo sob o nome de idéia, – é o criador do real, e o real é apenas sua aparição externa. Para mim, ao contrário, o ideal não é mais do que o material transposto para a cabeça do ser humano e por ela interpretado.27

Embora extraia e assimile no seu método o procedimento geral da dialética hegeliana, o núcleo racional dela, a transitoriedade, a negatividade, o devir, o potencial crítico, o esforço do pensamento (o trabalho do conceito) para reconstruir o objeto, Marx não se esquece de enfatizar a tese de que, “em Hegel, a dialética está de cabeça para baixo. É necessário pô-la de cabeça para cima, a fim de descobrir o caroço racional dentro do invólucro místico.”28 Portanto, pelo que ora foi exposto, é perceptível a noção de que o método de Marx é um valioso procedimento de investigação e exposição crítica ao método positivista da economia clássica e ao método formal da dialética hegeliana, por permanecerem estreitos, seja pela empiria imediata, pela mera exterioridade inerte, seja pelo pensamento, pela pura interioridade espiritual, no abstracionismo, exteriores à realidade efetiva, sendo incapazes de apreendê-la a partir de suas determinações histórico-sociais; ele é, na qualidade de conhecimento da realidade social em sua totalidade, como crítica às contradições internas da totalidade da sociedade burguesa, marcada pelo antagonismo entre as forças de produção e as relações de produção, entre o capital e o trabalho, um método emancipatório, um veículo necessário à transformação dessa totalidade (tanto político, quanto civil), como condição fundamental para a edificação de uma outra forma de sociabilidade humana, determinada, sim, pelas diferenças, mas não pelas desigualdades econômico-sociais entre os homens.

1* Graduado em Filosofia pela Universidade Estadual do Ceará (UECE, 1989), Mestrado em Filosofia pela Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas (FAFICH) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG, 1993) e Doutorado em Filosofia pela Universität von Kassel (KASSEL, ALEMANHA, 2002). É professor efetivo (associado) do Curso de Filosofia e do Programa de Pós-Graduação em Filosofia da Universidade Federal do Ceará (UFC) e professor colaborador do Programa de Pós-Graduação em Educação Brasileira da FACED – UFC. Coordenador do Grupo de Estudos Marxistas – GEM –, vinculado ao Eixo Marxismo, Teoria Crítica e Filosofia da Educação, e ao Programa de Pós-Graduação em Educação Brasileira da FACED – UFC. Orientador do Programa Jovens Talentos/CNPQ. Atualmente, é Pesquisador Bolsista de Produtividade do CNPQ, é membro da Internationale Gesellschaft der Feuerbach-Forscher (Sociedade Internacional Feuerbach) e dedica suas pesquisas ao estudo da filosofia política, da filosofia de Hegel, do idealismo alemão e de seus críticos Feuerbach, Marx, Adorno e Habermas. E-mail: [email protected]. Homepage: www.efchagas.wordpress.com . Academia.edu: https://ufc.academia.edu/EduardoFChagas . Plataforma Google Scholar ou Google Acadêmico: https://scholar.google.com.br/citations?user=yBsqblIAAAAJ&hl=pt-BR Editor da Revista Dialectus:(http://www.revistadialectus.ufc.br/index.php/RevistaDialectus/about/editorialPolicies#sectionPolicies). C.V (Lates): http://lattes.cnpq.br/2479899457642563. (http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?id=K4794196Y0).

2 Cf. sobre isto o artigo de Müller, Marcos Lutz. Exposição e Método Dialético em “O Capital”. In: Marx. Boletim SEAF-MG, v. 2,. Belo Horizonte, 1983, p.17-41.

3 Cf. Engels, F. Ludwig Feuerbach und der Ausgang der klassischen deutschen Philosophie. In: Marx/Engels, Werke (MEGA). Berlin: Dietz Verlag, 1984, v. 21, p.293.

4 Cf. o “Posfácio: Marx – Estatuto Ontológico e Resolução Metodológica”, de Chasin, José, in: Pensando com Marx – Uma Leitura Crítico-Comentada de O Capital, de Francisco José Soares Teixeira. São Paulo, Ensaio, 1995, p.389-90: “a rigor, não há uma questão de método no pensamento marxiano.” “Se por método é entendido uma arrumação operativa, a priori, da subjetividade, consubstanciada por um conjunto normativo de procedimentos, ditos científicos, com os quais o investigador deve levar a cabo seu trabalho, então, não há método em Marx.” “Contudo, atentando para momentos fundamentais da elaboração fragmentária de Marx a esse respeito, é possível captar e expor as linhas mestras de sua concepção”.

5 Essa crítica de Marx a Hegel é, na verdade, uma retomada da crítica de Feuerbach não só à religião e à especulação hegeliana, mas também a toda especulação moderna, na qual o predicado (o homem) se transforma em sujeito real, e o sujeito (Deus ou o espírito) decai para o predicado do próprio predicado, produto de seu produto. A crítica de Marx ao método hegeliano reproduz, pois, em muitos pontos, a crítica que Feuerbach dirige à filosofia especulativa, em particular, a de Hegel, e à teologia ordinária. Nas Teses Provisórias para a Reforma da Filosofia (Vorläufige Thesen zur Reformation der Philosophie) (1842), Feuerbach afirma que se tem de inverter a filosofia especulativa, fazendo do predicado dela o sujeito, e do sujeito o predicado, para se ter a verdade revelada, a verdade “pura e nua”. Para ele, “o ser é sujeito, o pensamento predicado, que contém, no entanto, a essência de seu sujeito. O pensamento provém do ser, mas não o ser do pensamento.” Na filosofia especulativa de Hegel, porém, dá-se o contrário: “o pensamento é o ser; o pensamento é o sujeito, o ser é o predicado […]. Mas […] o verdadeiro real neste real […] é o pensamento […] Mas, justamente por isso, Hegel não chegou ao ser como o ser, o ser livre e independente.” Nesse sentido, o método da dialética hegeliana que ascende do abstrato ao concreto, ou melhor, do ideal ao real, no âmbito do pensamento mesmo, não atinge a realidade verdadeira e objetiva, e sim as realizações do próprio pensamento abstrato. Cf. Feuerbach, L. Vorläufige Thesen zur Reformation der Philosophie. Org. por W. Shuffenhauer. Berlin: Verlag, 1970, GW 9, p.258 e 257-58. Cf. também o meu livro: Chagas, Eduardo Ferreira. Natureza e Liberdade em Feuerbach e Marx. Campinas-SP: Editora Phi, 2016.

6 Marx, K. Aus der kritik der Hegelschen Rechtsphilosophie – Kritik des Hegelschen Staatsrechts. In: Marx/Engels, Werke (MEGA). Berlin: Dietz Verlag, 1957, v. 1, p.203.arx.

7 Marx, K e Engels, F. Die heilige Familie. In: Marx/Engels, Werke (MEGA). Berlin: Dietz Verlag, 1958, v. 2, p.60.

8 Marx, K. Kritik der Hegelschen Dialekti und Philosophie überhaupt. In: Ökonomisch-philosophische Manuskripte aus dem Jahre 1844. Marx/Engels, Werke (MEGA). Berlin: Dietz Verlag, 1990, v. 40, p.571-72.

9 Ibid., p.573.

10 Ibid., p.572.

11 Marx, K e Engels, F. Die deutsche Ideologie. In: Marx/Engels, Werke (MEGA). Berlin: Dietz Verlag, 1958, v. 3, p.27.

12 Ibid., p.26.

13 Marx, K. Das Elend der Philosophie. In: Marx/Engels, Werke (MEGA). Berlin: Dietz Verlag, 1959, v. 4, p.127.

14 Ibid., p.128.

15 Ibid., p.129.

16 Ibid., p.133-34.

17 Ibid., p.132.

18 Marx, K. Einleitung zur Kritik der politischen Ökonomie. In: Marx/Engels, Werke (MEGA). Berlin: Dietz Verlag, 1983, v. 13, p.617. Cf. também Marx, K. Einleitung zu den “Grundrissen der Krtik der polistischen Ökonomie”. In: Marx/Engels, Werke (MEGA). Berlin: Dietz Verlag, 1983, v. 42, p.21.

19 Ibid., p.615. Cf. também Einleitung zu den “Grundrissen. Op. cit.,, p.19.

20 Ibid., p.616. Cf. também Einleitung zu den “Grundrissen. Op. cit.,, p.20.

21 Diferentemente daqueles que partem de objetos isolados, tomam a parte à margem da totalidade orgânica, ocultando o todo, ou daqueles, como, por exemplo, Weber, que evitam a totalidade ou acreditam não se poder conhecer o processo total da sociedade, que o todo é uma ilusão, Lukács toma a totalidade concreta como condição primordial do conhecimento da realidade, destacando-a como categoria decisiva, central no método de Marx: A “consideração dialética de totalidade, que tanto se afasta em aparência da realidade imediata e que constrói a realidade de um modo aparentemente ‘não-científico’, é, em verdade, o único método que pode apreender e reproduzir a realidade no plano do pensamento. A totalidade concreta é, pois, a categoria fundamental da efetividade.” Portanto: “Não é o predomínio dos motivos econômicos na explicação histórica que diferencia decisivamente o marxismo da ciência burguesa, mas o ponto de vista da totalidade. A categoria da totalidade, o domínio do todo sobre as partes, que é determinante e se exerce em todos os domínios, é a essência do método, que Marx recebeu de Hegel e transformou originalmente, para dele fazer o fundamento de uma ciência inteiramente nova. […] E o que há de fundamentalmente revolucionário na ciência proletária não é simplesmente opor `a sociedade burguesa conteúdos revolucionários, mas sim, em primeiro lugar, a essência revolucionária do próprio método. A primazia da categoria de totalidade é o suporte do princípio revolucionário na ciência.” Lukács, G. Geschichte und Klassenbewusstsein. Berlin: Sammlung Luchterhand Verlag, 1970, p.71 e 94.

22 Marx, K. Marx, K. Einleitung zur Kritik der politischen Ökonomie. Op. cit, p.624. Cf. também Einleitung zu den “Grundrissen der Krtik der polistischen Ökonomie”. Op. cit., p.27.

23 Ibid., p 624. Cf. também Einleitung zu den “Grundrissen der Krtik der polistischen Ökonomie”. Op. cit, p.27.

24 Marx, K. Vorwor zu Zur Krtik der Polistischen Ökonomie”. Op. cit., p.7.

25 Marx, K. Einleitung zur Kritik der politischen Ökonomie. Op. cit, p.637. Cf. também Einleitung zu den “Grundrissen der Krtik der polistischen Ökonomie”. Op. cit., p.40.

26 Marx, K. Nachwort zur zweiten Auflage zu Das Kapital. In: Marx/Engels, Werke (MEGA). Berlin: Dietz Verlag, 1962, v. 23, p.27.

27 Ibid., p.27.

28 Ibid., p.27. Cf sobre esse ponto a posição semelhante de Engels em 1888, em sua obra Ludwig Feuerbach und der Ausgang der klassischen deutschen Philosophie. Op. cit., p. 292-93: “Em Hegel, a dialética é o auto-desenvolvimento do conceito. […] Era essa inversão ideológica que se tratava de eliminar. Concebemos novamente os conceitos do cérebro materialisticamente como imagens dos objetos reais, em vez de considerar os objetos reais como imagens deste ou daquele momento do conceito absoluto. […] Com isto, porém, a própria dialética do conceito se convertia simplesmente no reflexo consciente do movimento dialético do mundo real, o que equivalia a converter a dialética hegeliana num produto cerebral; ou melhor, a inverter a dialética que se encontrava na cabeça, para colocá-la de pé.” Cf. também a observação de Marcos Müller, ao evidenciar que a inversão não é “uma operação de mágica trivial, como se bastasse pôr, novamente, a dialética hegeliana de pé […]. Não basta inverter […]. É preciso, além de inverter, virá-la ao avesso, […] mostrando que as contradições presentes nos fenômenos não são a aparência de uma unidade essencial, mas a essência verdadeira de uma ‘objetividade alienada’ (e não da ‘objetividade enquanto tal’), e que a sua resolução especulativa na unidade do conceito é que representa o lado aparente, mistificador, de uma realidade contraditória. Virando ao avesso a realidade invertida, alienada pelo capital, ‘enquanto figura objetiva consumada da propriedade privada’, a contradição, que estava do lado de fora, transforma-se no seu verdadeiro interior, na pérola racional desta realidade, e o que estava por dentro, a unidade resolutiva e integradora das contradições, revela-se como o seu exterior aparente, o seu envoltório não só místico, mas mistificador.” Cf. Müller, Marcos Lutz. Exposição e Método Dialético em ‘O Capital’. Op. cit., p.26.

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Marx 200