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MUNDO

A guerra comercial de Trump

Trump anuncia medidas protecionistas, acompanhado de trabalhadores da indústria metalúrgica

Trump anuncia medidas protecionistas, acompanhado de trabalhadores da indústria metalúrgica

Presidente sobretaxa a importação de alumínio e aço, gerando tensões e a possibilidade de medidas protecionistas de outros países

Gabriel Santos, de Maceió (AL)

No início de março, Donald Trump mostrou-se fidelidade ao seu lema de campanha – “América em primeiro lugar” – ao aumentar as tarifas sobre a importação de aço (25%) e alumínio (10%). Estas medidas foram duramente criticadas por governos de todo o mundo, causando preocupação e o prelúdio daquilo que vem sendo chamado de uma guerra comercial. A medida entra em vigor nesta sexta-feira, 23.

A Casa Branca argumenta que a dependência que o país teria do aço e do alumínio estrangeiro ameaça a segurança nacional, pois coloca em risco o setor armamentista. Afirmou que o país compra cinco vezes mais alumínio do que consome e é ainda o maior importador mundial de aço. Isto gerou uma destruição da indústria nacional que teria sido “dizimada por décadas de importações a preços mais baixos que o dos produtores nacionais”.

Trump, ao colocar estas barreiras, busca recuperar o emprego com o fortalecimento da indústria nacional e impede uma hipotética ameaça a segurança. O setor siderúrgico emprega hoje 385 mil pessoas nos EUA. Na virada do século esse número era quase o dobro: 640 mil trabalhadores. Não por acaso, Trump teve vitórias na sua campanha eleitoral na região conhecida como velho cinturão industrial, uma das regiões mais afetadas pelo desemprego.

Em sua conta do twitter o presidente declarou: “Temos de proteger nossa indústria do aço e do alumínio, e, ao mesmo tempo, demonstrar grande flexibilidade e cooperação para nossos amigos reais e aqueles que nos tratam com justiça tanto no âmbito comercial como no militar”.

A medida de Trump não foi bem recebida pelas lideranças de seu partido. Diversos congressistas do Partido Republicano se mostraram contrários e preocupados com o aumento das tarifas. Mesmo assim, o presidente não tira o pé do acelerador e mantém firme seu plano.

Em Wall Street as reações foram diversas. As ações das empresas siderúrgicas valorizaram fortemente: a AK Steel teve alta de 7%, a US Steel subiu mais de 4%, e a fábrica de alumínio Alcoa registrou crescimento de 2%. Do outro lado, grandes empresas que seriam afetadas pelo aumento das tarifas tiveram quedas, como a Ford Motor, por exemplo. O temor de uma guerra comercial acabou por prejudicar o índice geral de Wall Street, que caiu mais de 2%.

É importante colocar que as medidas anunciadas por Trump surgem no momento de renegociação do Acordo de Livre Comércio da América do Norte (NAFTA) com México e Canadá. Em janeiro, Trump retirou os Estados Unidos da Parceira Transpacífico (TPP). O tratado firmado em 2015 por 12 países de três continentes, era visto como uma das principais vitórias da Era Obama e o mais importante tratado comercial desta década.

O discurso protecionista de Trump é baseado em um suposto enfraquecimento dos Estados Unidos desde que barreiras comerciais começaram a ser reduzidas ao redor do mundo. Para o presidente, os EUA teriam um déficit comercial em torno de 800 bilhões de dólares por ano. “Fomos maltratados como nação durante muitos anos; todos tiraram vantagem de nós, e isso não vai voltar a acontecer nunca mais. As guerras comerciais não são tão más. Porque somos mais poderosos que eles”, falou.

SEGURANÇA NACIONAL?
Mas, segundo o Instituto Americano do Ferro e do Aço, a realidade é diferente daquela que Trump apresenta para a defesa do aumento das tarifas. O instituto afirma que 70% do aço consumido no território norte-americano são produzidos no próprio país e que, destes, somente 3% é para uso militar.

O auto isolamento dos EUA é uma realidade que surpreende. Porém, onde o resto do mundo vê como isolamento, Trump enxerga um ato de justiça natural. Por isso segue na retórica do tudo ou nada, com sua metralhadora de palavras afirmando que ganhar uma guerra comercial seria fácil.

Diversos economistas afirmam que este tipo de tarifação acabará tendo resultado negativo, e o custo da produção tende a aumentar, aumentando assim o preço final do produto. Afirmam também que como consequência desta bola de neve, as empresas podem sair mais prejudicadas do que favorecidas.

GUERRA COMERCIAL
O risco de uma guerra comercial preocupa, pois quando um país do peso e importância dos Estados Unidos toma uma medida dessas, ela tem fortes consequências em todo o mercado e pode forçar outros países a tomar medidas parecidas. A Organização Mundial do Comércio (OMC) estuda declarar a medida ilegal.

A União Europeia por sua vez elaborou uma lista de produtos norte-americanos que enfrentarão impostos comerciais. Jean-Calude Juncker, presidente da Comissão Europeia, afirmou, em tom ríspido e firme: “Não permaneceremos sentados enquanto nossa indústria é atacada com medidas injustas que colocam em risco milhares de empregos europeus. A União Europeia agirá com firmeza e com respeito para defender nossos interesses”.

A União Europeia passará a supervisionar os fluxos de aço e de alumínio que deixarão de entrar nos EUA. Bruxelas se preocupa que as toneladas não vendidas para o Tio Sam acabem por inundar o mercado europeu, podendo assim, ser forçada a tomar medidas também protecionistas.

O ministro do Comércio do Japão, Hiroshige Seko, afirmou que as exportações prejudicariam de alguma forma a segurança nacional norte-americana. O Canadá, vizinho dos EUA e maior exportador de aço para o país, foi duro nas palavras. “Uma decisão assim seria inaceitável e teria consequência dos dois lados da fronteira”, afirmou o ministro do comércio, François-Philippe Champagne.

Países se movimentam diante deste rearranjo nas peças. No mesmo dia em que Trump anunciava o aumento das tarifas, os onze membros restantes da Parceria Transpacífico (agora chamado TPP11) assinaram um novo tratado, colocando os países membros e a bacia do Pacífico como linha de frente na defesa da globalização. Para diversos chefes de estado presentes na assinatura do novo tratado, o grupo pode sobreviver sem os EUA.

Outro que vem tomando a frente na defesa do mundo globalizado e se projeta para o posto de grande potência é a China. Este país nas palavras do criador do Fórum Econômico Mundial está preparado para assumir o posto de “Liderança na economia mundial”.

E existe também a possibilidade de um novo tratado comercial entre o Mercosul e a União Europeia, que juntos representariam 700 milhões de pessoas. Nesta quarta, 21, os produtores de aço do Brasil, segundo maior exportador para o Estados Unidos, reuniram-se com Michel Temer. “O principal pleito do setor é que o presidente Temer entre em contato com o presidente Trump e tente, argumente para que o Brasil fique fora da 232, com isso a gente garante acesso ao mercado americano”, afirmou o presidente do conselho diretor do Instituto Aço Brasil, Alexandre Lyra.

O mercado capitalista tenta se reorganizar. As guerras comerciais acabam por reduzir a geração de empregos e aumentar o custo de vida. Elas são produto dos rumos tomados pelas economias capitalistas desde a crise de 2007-2008. Caso se confirme o esperado conflito comercial, isso levaria a rivalidades e disputas pela hegemonia monetária e política, o que poderia fazer com que a escala suba de uma guerra comercial para novos conflitos armados de repercussão internacional.