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MOVIMENTO

Nossa homenagem ao metalúrgico Hélio Bombardi e ao legado de luta e organização operária

Helio Bombardi, Em 1984 e em depoimento ao Projeto Memória do MOMSP. Detalhe: CSBH/FPA

Helio Bombardi, Em 1984 e em depoimento ao Projeto Memória do MOMSP. Detalhe: CSBH/FPA

José Carlos Miranda*, de São Paulo (SP)

Na madrugada desta terça (13), recebi a informação do falecimento do companheiro lutador e socialista Hélio Bombardi, aos 70 anos. Hélio foi metalúrgico desde o início dos anos 1970. Participou ativamente das greves da categoria, sobretudo as de 1978 e 1979, e foi uma das lideranças do MOMSP (Movimento de Oposição Metalúrgica de São Paulo), tendo feito parte das chapas de oposição em 1981, 1984, 1987 e 1990. Em 1984, ele era da Comissão de Fábrica da Masey Fergusson e encabeçou a chapa, contra o pelego Joaquinzão. Hélio seguiu atuando por muitos anos, tendo feito parte da Executiva da CUT em 1988, da área sindical da campanha presidencial de Lula em 1989 e assessorado os metalúrgicos de Campinas, em 1992.

Para as novas gerações, mais do que lembrar e homenagear “os nossos”, é importante compartilhar o momento da luta dos trabalhadores no qual nossos companheiros e camaradas se encontravam. Se me permitem, vou falar do companheiro Hélio no contexto no qual o conheci.

Era o ano de 1984, a ditadura já estava em agonia e a campanha das Diretas Já! mobilizava milhões pelo Brasil. A insatisfação com as dificuldades econômicas provocava greves e manifestações na cidade e no campo. Em abril, pararam 10 mil metalúrgicos em São José dos Campos (SP) e 200 mil professores da rede pública de São Paulo. O mês de maio registrou greves longas: bóias-frias de Goiás, São Paulo e Minas Gerais e a dos professores das universidades federais. Em junho, rebelaram-se os garimpeiros de Serra Pelada, ameaçados de expulsão.
Aconteceram ainda greves na Previdência Social e na Companhia Siderúrgica Nacional, a CSN. A primeira greve na história da siderúrgica levou à ocupação da usina inaugurada por Getúlio Vargas. Em agosto houve o 1º CONCUT (Congresso Nacional da CUT) no pavilhão Vera Cruz, em São Bernardo do Campo, com mais de cinco mil delegados. E no final do mês, desempregados invadiram a sede do Sine (Serviço Nacional de Emprego), em São Paulo. 
Em novembro, é a polícia que desalojava os grevistas que ocupavam a Aço Villares, em São Caetano (SP). Em dezembro, acontece uma greve de 24 horas no Banco do Brasil. 
Os conflitos no campo, que vinham crescendo desde o incentivo à exploração de regiões como a Amazônia por grupos estrangeiros, dez anos antes, e recrudesceram com a recessão, incentivam a organização dos trabalhadores, apoiada pela Igreja. O Encontro Nacional dos Trabalhadores Sem-Terra, em Cascavel (PR), havia criado o MST, em janeiro daquele ano. Em outubro, 40 mil pessoas participaram do Grito do Campo, em Porto Alegre, protestando contra a política agrícola do governo.” [1]

DEPOIMENTO DE HÉLIO SOBRE A OPOSIÇÃO METALÚRGICA DE SP

Foi nesse clima que ocorreu a eleição do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo, de 2 a 5 de julho de 1984. A campanha extrapolou a categoria, que na época tinha cerca de 400 mil trabalhadores na base. Eu, por exemplo, era ferroviário e trabalhava nas oficinas da Lapa da Rede Ferroviária Federal S.A (RFFSA, empresa extinta no primeiro governo Lula, em 2003). E nós participamos da campanha metalúrgica, das panfletagens e das colagens de cartazes “lambe-lambe”. Nós saíamos em picapes com dois tambores de 200 litros cheio de cola que preparávamos com água, farinha de trigo e soda caústica e íamos colando nos “corredores de fábrica”, nas vias de acesso para as muitas fábricas, como o corredor Mofarrej, na Vila Leopoldina, onde na época trabalhavam mais de 40 mil metalúrgicos.

Essa foi a eleição sindical mais disputada e de massas que participei em toda minha vida militante, uma verdadeira operação de guerra. Hélio Bombardi era o candidato a presidente pela Chapa 2, portanto a principal figura pública daquele processo. A chapa 2 era impulsionada principalmente pelo MOMSP e composta por praticamente todas as forças da esquerda na época, com exceção de setores que compuseram a chapa da situação apoiada pelos patrões e pelo governo. A chapa 1 era encabeçada pelo pelego Joaquinzão, que foi interventor nomeado pela ditadura e presidiu o sindicato até 1987. Esta chapa foi auxiliada pelas organizações PCdoB e PCB (partidos ilegais na época), MR-8 e alguns militantes do PT.

Helio Bombardi com Luiz Carlos Prestes
Helio Bombardi com Luiz Carlos Prestes

A chapa 2 e Hélio representavam a organização dos operários pela base e independentes, as comissões de fábrica. Essa foi a última vez que a chapa de oposição, com um socialista na cabeça, esteve muito próxima de ganhar a eleição sindical no Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo que anos depois veio a ser o berço do chamado “sindicalismo de resultado” e nascedouro da Força Sindical.

Já passou pela cabeça que se tivéssemos ganho aquela eleição com a chapa 2, talvez não houvesse a Força Sindical? Talvez tivesse havido um pólo de sindicalismo classista diferente dos metalúrgicos de São Bernardo? Talvez o destino do PT e da CUT poderia ter sido diferente?

Bem, nós não ganhamos e a história se desenvolveu como nós conhecemos. O mais importante é podermos refletir sobre os erros e acertos daquele período. E preparar as novas gerações para novos ascensos que, se não se repetirão como o que vivemos há 34 anos, certamente mostrarão a força e o poder de organização da classe operária.

O legado de Helio Bombardi e do MOMSP foi de ter ousado construir a auto-organização operária pela base e independente nas fábricas. É um legado que já está no panteão da história de lutas da nossa classe. Foi na flor da minha juventude que militei com esses companheiros e muitos outros que ainda estão no combate e outros que já não estão entre nós, como Vito Gianotti e Valdemar Rossi. Não há honra maior.

Fica aqui a nossa homenagem e nossa solidariedade a seus amigos e familiares.

Hélio Bombardi Presente! Hoje e sempre!

 

* José Carlos Miranda é da Coordenação Nacional do M-LPS e foi metalúrgico de 1986 a 1995 sendo Secretario de Imprensa da CUT Regional 1991 a 1994 e da Direção da CNM CUT (Confederação dos Metalúrgicos da CUT) de 1993 a 1995

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