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BRASIL

OPINIÃO | A luta Ecossocialista, o agronegócio e os desafios da esquerda

*Por João Amaral

O conhecimento e informação hoje são fundamentais mas de nada servem socialmente para evolução e bem estar social se não tivermos a noção de como funciona a sociedade. Principalmente se desejamos transforma-la.

Posso saber o que são os Neonecotinóides, veneno usado na agricultura, que tem sido responsável pelas extinção das abelhas. Que o Glifosato é um dos maiores causadores de câncer .Mas preciso entender por que estas substâncias são amplamente usadas nas lavouras e não são proibidas.E a partir daí organizar ações para mudar esta situação.

O Brasil sustenta duas posições de destaque no campo do agronegócio: é o maior consumidor de agrotóxicos e um dos maiores exportadores de commodities do mundo. Essas duas colocações são a expressão de um modelo de economia para o campo e para o país.

As recentes transformações do campo brasileiro deram surgimento à agricultura altamente mecanizada, com elevados investimentos em agroquímicos para a produção de mercadorias, consequentemente, fortalecendo a agricultura de negócio.

Este modelo agrícola, denominado agronegócio é a expressão da expansão capitalista no campo. Dados CPT (Comissão Pastoral da Terra) afirmam que com o avanço do agronegócio quatro milhões de camponeses foram expulsos do campo nos últimos anos.

Este contingente foi habitar os corredores de miséria, pobreza, violência, degradação ambiental no entorno das grandes propriedades margeando as estradas nas cidades do interior. Ou se deslocaram para as grandes cidades onde o cenário é o mesmo de violência, pobreza e degradação ambiental.

Com o advento do agronegócio o trabalho humano foi substituído por máquinas e pelo veneno. O uso do veneno, por esse modelo, não é uma necessidade agronômica. Para se produzir não precisa veneno, que é usado como uma forma de substituir a mão de obra que antes fazia as práticas agrícolas com tempo de trabalho, por exemplo a capina, um plantio mais cuidadoso.

É preciso entender que o modelo do agronegócio é apenas um modelo de se ganhar dinheiro. Seu o único objetivo é ter lucro, não importa se vão destruir a natureza, se vão usar venenos, se desempregam pessoas.

Agronegócio é máquina e veneno. Primeiro, para substituir a mão de obra. Segundo, como são monoculturas em larga extensão – ou só soja, ou só laranja, ou só arroz, ou só pasto – têm de matar, na lógica do agronegócio, todas as outras formas de vida vegetal ou animal. Não praticam uma agricultura. Querem produzir uma commodity. O veneno é a forma de matarem tudo que não é soja, que não é laranja, tudo que não é arroz.

Há uma aliança permanente entre interesses – o grande proprietário, as empresas que compram a produção dele, que controlam o mercado das commodities e que ao mesmo tempo são as fabricantes de veneno.

A Monsanto, por exemplo, fornece os fertilizantes, o veneno, e depois compra a soja. A mesma coisa faz a Cutrale com a laranja. Oferece o veneno, os adubos e, depois, compra a laranja.

A mesma empresa ganha dinheiro com veneno e controlando o mercado, que têm origem nas fórmulas desenvolvidos pela Bayer, pela Basf, pela Du Pont, para os negócios das guerras. Na Primeira e na Segunda Guerra Mundial foram usadas como armas. Depois, os Estados Unidos, utilizou na Guerra do Vietnã.

Quando terminaram as guerras, essas empresas adequaram aquelas fábricas de veneno pra matar gente e floresta em larga escala para a agricultura.

São as mesmas empresas. E os efeitos são de extrema gravidade. Um punhado de terra , tem mais de mil formas de vida. São aqueles bichinhos invisíveis, bactérias, que formam os nutrientes, senão a terra não produz nada. O veneno mata essas formas de vida.

Este modelo para agricultura baseado nos agro-venenos trazem graves consequências para a população: os cientistas e médicos que trabalham no Instituto Nacional do Câncer (Inca) têm feito várias pesquisas e alertado que o veneno, quando se acumula no organismo, começa a atacar as células mais frágeis. É por isso que tem aumentado a incidência de alguns tipos câncer, que não têm mais relação com a idade das pessoas. Você pode ter câncer de próstata com 40 anos. Tem mulheres com 20, 30 anos, com câncer de mama. Por quê? Veneno.

O professor Wanderlei Pignati, da Universidade Federal do Mato Grosso, pesquisou durante dez anos mulheres de uma região do estado e encontrou resíduos de glifosato no leite materno.

As mães que achavam que estavam dando o melhor alimento do mundo a seus bebês não sabiam que através do que comiam concentravam também o veneno absorvido no leite; e as crianças, ainda bebês, estavam recebendo suas primeiras doses.

Esse mesmo professor fez outra pesquisa também muito interessante. Há um secante que é passado na soja, para uniformizar seu amadurecimento, porque na natureza não amadurece tudo ao mesmo tempo. Como querem usar a máquina, então têm de entrar quando todas estiverem maduras.

Passam então um veneno, a base de glifosato, o chamado secante, que na verdade “mata” toda a soja. Aí vem a máquina e toda a soja está seca. Ao matar a soja, aquele veneno não é mais absorvido pelo grão. Vai para a natureza. Sobe como pó e, conforme o vento, vai para qualquer parte. Açude, horta, qualquer lugar.

Há pesquisas científicas na Europa comprovando que pessoas que comem alimentos com índices exagerados de glifosato, que é o veneno mais disseminado, já apresentam baixa fertilidade.

Também foram feitas pesquisas nos Estados Unidos em regiões onde o mal de Parkinson era mais incidente, e a relação que foi encontrada foi justamente essa. As pessoas tinham se contaminado, com os alimentos ou expostas ao veneno usado na agricultura, e desenvolveram maior propensão ao Parkinson.

Essa questão nos coloca um grande desafio, para nós militantes e para as organizações de esquerda. Como militantes ecossocialistas é nossa tarefa realizar trabalho de conscientização junto a população: é um verdadeiro crime o que está acontecendo por conta do agronegócio. Eles estão tendo lucro enquanto vidas humanas são perdidas.

O Instituto Nacional de Câncer (INCA) advertiu que, a cada ano, surgem 500 mil novos casos de câncer, no Brasil. Grande parte deles vem do uso de venenos agrícolas. Mas isso não passa na TV. Não faz parte dos noticiários. Pois o agronegócio é um dos grandes patrocinadores dos tele jornais.

A Agroecologia como alternativa Ecossocialista

Já a agroecologia pode ser definida como o estudo da agricultura a partir de uma perspectiva ecológica. Trata-se de um tipo de prática agrícola que prioriza a utilização dos recursos naturais com mais consciência, respeitando e mantendo o que a natureza oferece ao longo de todo o processo produtivo — desde o cultivo até a circulação comercial dos produtos.

Alimentos saudáveis para quem ?

O chamado mercado dos produtos saudáveis, orgânicos ou agroecológicos cresce em torno de 10%, ao ano. Por outro lado, a população se dá conta de que não é mais caro de se produzir no modelo da agroecologia.

Como é que ela está se dando conta? Porque estão surgindo mais feiras, então o preço é melhor, e isso está quebrando o monopólio dos supermercados.

O que as redes de supermercados fazem?

Compram o produto orgânico dos pequenos agricultores, inclusive organizando centrais, onde o pequeno agricultor entrega e eles só lavam e colocam naquelas caixinhas padronizadas; porém, como sabem que o produto orgânico atrai comercialmente  pessoas que tem mais consciência, na classe média, eles aumentam o preço, para ter lucro máximo, em cima da disposição da classe média de pagar um pouco mais por um produto que tem o selo de garantia.

A Nestlé e outras empresas já estudam duas formas base alimentação para o futuro: uma a base de soja ( veneno e transgênica) para os pobres e outra com produtos orgânicos para as classes abastadas.

Mas essa máscara está caindo, porque mais produtos orgânicos estão chegando ao mercado, às feiras, e as pessoas começam a comparar: por que um quilo de tomate orgânico no Zaffari custa R$ 4,00 e nas feiras custa o mesmo quilo orgânico R$ 2,00.

É perceptível em todas as regiões que aumentou a consciência da população, tanto pelos casos de saúde na família quanto pelo aumento da informação. Há muita informação que agora circula pela internet e que há dez anos não se tinha. Porém ainda esta consciência ainda se limita a setores da classe média e da classe trabalhadora mais politizada.

A agroecologia, reforma agrária e o ecossocialismo como programa de transição ao socialismo: eis os desafios do PSOL

Então concluindo, nós precisamos sim criar um diálogo com a sociedade sobre o veneno da agricultura de guerra = agronegócio e a alternativa da agroecologia e da agricultura camponesa.

Neste sentido é imprescindível discutir a Reforma Agrária , Agroecologia como parte integrante de um projeto de sociedade Ecossocialista.

Este debate tem que fazer parte de nossas elaborações programáticas e compor nossas propostas eleitorais.

Estamos ás vésperas de nossos congressos estaduais e nacional e esta discussão tem que se fazer presente, eis a tarefa de todos nós ecossocialistas do PSOL  e das organizações comprometidas com a necessidade de construção de um projeto revolucionário para o Brasil.

Temas como a soberania alimentar, saúde, produção agroecológica, reforma agrária e uma crítica mais contundente ao agronegócio e seus malefícios devem ser pauta de nossos congressos.

Como afirmou o italiano Antônio Gramsci precisamos viver entre o pessimismo da razão e o otimismo da vontade.

João Amaral – Jornalista e Ecossocialista PSOL

Fotos : Charge Latuff e imagens ilustrativas da Comunicação MST