Por: Breno Nascimento, de Niterói, RJ
O mês de agosto marcou os moradores da favela da Grota, localizada no bairro de São Francisco, em Niterói. Foram pegos pela péssima notícia de que o Colégio Estadual Duque de Caxias, com seus 65 anos de história na localidade, seria fechado pela Secretaria de Educação (Seeduc RJ).
Em 17 de agosto, o diretor regional pedagógico das baixadas litorâneas convocou a comunidade escolar a comparecer no colégio para uma reunião no dia 28, na qual seria apresentado o estudo da Seeduc sobre o fechamento do mesmo.
Os alunos, professores e funcionários do colégio se empenharam na resistência contra o fechamento da escola, tendo os moradores da Grota se mobilizado com a causa. Dois abaixo-assinados somaram cerca de 700 assinaturas, o que corresponde a 10% da população da Grota¹. Além disso, os alunos do Ensino Fundamental regular do 6° ao 9° escreveram cartas contra o fechamento do colégio, expondo os motivos pelos quais isso seria injusto e a importância dessa escola para suas vidas.
A reunião do dia 28 de agosto teve o auditório do Duque Caxias lotado de alunos, professores, responsáveis de alunos, ex-alunos e moradores. Dirigentes da associação de moradores e representantes da UNE (União Nacional dos Estudantes) também estiveram presentes.
Os abaixo-assinados e as cartas foram entregues ao diretor regional pedagógico, que expôs o estudo da Seeduc que apontava o fechamento do Duque de Caxias por baixa quantidade de alunos. O fechamento se daria gradativamente ao longo dos próximos três anos com a extinção de turmas a cada ano. Já em 2018, o colégio não contaria mais com o 6° ano do Ensino Fundamental regular e com o 1° ano do Ensino Médio EJA. O Estudo apontava que o Colégio Estadual Cizínio Soares, também em São Francisco, era capaz e deveria absorver toda a demanda do Colégio Duque de Caxias gradativamente.
O povo presente questionou o fato de o estudo não ter sido divulgado antes da reunião para que houvesse uma argumentação mais sólida contra o fechamento, mas no final isso nem foi tão relevante, pois as falas contra o encerramento das atividades do colégio foram bastante embasadas. Colocações como a seguinte mostraram um nível de consciência elevado: “Quando se fecha uma escola, são abertos novos presídios”. Obviamente, houve aplausos.
Algumas falas destacaram o perigo de alunos de 11 anos (já que o 6° ano seria a primeira turma fechada) pegarem ônibus e atravessarem ruas² sozinhos rumo ao novo colégio. Outras falas colocaram a existência de rixas agressivas de alunos do Cizínio, em sua maioria provenientes do Morro do Cavalão, contra os alunos que iam para lá e são da Grota. Também foi falado sobre o fato de que o Duque de Caxias se tornaria um grande elefante branco dentro da favela e o local poderia ser tomado pelo tráfico. As cartas, abaixo-assinados e a relatoria da reunião foram reunidos em dossiê para ser entregue na Seeduc. Os moradores também resolveram criar uma página no facebook chamada SOS Duque de Caxias para organizar a resistência ao fechamento da escola.
Em meio a esse processo de resistência, os alunos do colégio começaram a se mobilizar no sentido de criar um grêmio estudantil. O nome escolhido para o grêmio foi “O Futuro é agora”. Nome sugestivo, de quem sabe que é preciso lutar no presente contra os desmandos de governos como os de Michel Temer e Pezão. Atualmente, o grêmio se encontra na fase de formação de chapas para a eleição.
Na semana que se seguiu à primeira reunião a página recém criada no facebook ultrapassou as 100 curtidas e uma oficina de faixas foi feita no dia 6 de setembro, já que uma nova reunião seria marcada para a semana seguinte com intuito de informar a decisão final do secretário de educação, Wagner Victer. A ideia era fazer um protesto de rua contra o fechamento do colégio comandado por alunos e moradores e aberto a apoiadores da causa, antes que a próxima reunião ocorresse para mostrar ao governo a insatisfação popular.
A manifestação foi marcada para o dia 11, mas a ideia ganhou corpo e a data do protesto foi transferida para o dia 15, quando integrantes da Orquestra de Cordas da Grota poderiam se juntar ao ato. Porém, na mesma semana que ocorreria a manifestação, o diretor regional pedagógico ligou para a direção do Duque de Caxias informando que o colégio não iria mais fechar e que próxima reunião seria no dia 18 para apresentar os detalhes da decisão e tirar dúvidas da população da Grota. Evidentemente, o Secretário de Educação Wagner Victer temeu o crescimento da mobilização popular. O protesto foi cancelado, mas se seguiu mobilizando a população para comparecer em peso novamente na reunião do dia 18.
O povo compareceu uma vez mais a essa segunda reunião e seguiu fazendo falas sem se intimidar. Já a UNE, não compareceu como da primeira vez. A Seeduc arquivou o estudo de fechamento, as turmas regulares de 6° ao 9°ano do Ensino Fundamental regular serão mantidas e os 4 ciclos do Ensino Médio EJA também permanecerão. Apenas as turmas de 8° e 9° da EJA deixaram de existir, sendo que o 9° ano ainda será oferecido em 2018. A Seeduc recomendou que a comunidade escolar faça uma campanha para aumentar o número de alunos da escola, o que é algo para ficar desconfiado, já que essa recomendação pode abrir um precedente para desengavetar o projeto de fechamento do Duque de Caxias caso não haja elevação da quantidade alunos. Por isso mesmo, houve falas no sentido de denunciar que a Seeduc também tem culpa no baixo número de alunos pela falta de investimento na infraestrutura do colégio, também foi dado o exemplo dos computadores da escola que já são antigos e carecem de manutenção, a falta de verba para levar os alunos a atividades culturais fora do colégio. Tudo isso contribui para a diminuição da atratividade do colégio.
Mas, a vitória da comunidade escolar não se restringiu a barrar o retrocesso que seria o fechamento do Duque de Caxias, também houve avanços. O 6° ano, que antes tinha apenas uma turma, sendo a mais demandada da escola com falta de vagas, a partir de 2018 terá duas turmas. Isso representa um ganho considerável, pois o Duque de Caxias complementa a Escola Municipal Helena Antipoff, que se localiza na Av. Rui Barbosa, perto da entrada da Grota, e que oferece o Ensino Fundamental do 1° ao 5° ano do Ensino Fundamental. Os alunos que terminam os 5° ano no Helena seguem para o 6° ano no Duque. Outro ganho foi a promessa do diretor regional pedagógico de abrir uma turma de 1° ano do Ensino Médio regular se os alunos do 9° ano quiserem continuar no colégio e se as campanhas conseguirem trazer mais gente pra estudar.
A lição que fica é que a união do povo pode colher muitos frutos. E qualquer tentativa de retrocesso da Seeduc receberá uma oposição ainda maior, pois as pessoas sabem que podem vencer, além disso a fundação e consolidação do grêmio estudantil trará ainda mais força para a escola e para a juventude da Grota na resistência contra qualquer medida injusta dos governos neoliberais antipopulares que estão no poder nos últimos anos. Não apenas resistir, mas propor saídas práticas para os mais diversos problemas, que não resumem à educação pública. As vitórias locais como essa animam as lutas mais amplas pelo futuro do Brasil que estão sendo travadas no momento atual. Ousar lutar! Ousar vencer!
1 Segundo informação de um dos dirigentes da Associação de Moradores a favela conta com 7000 habitantes aproximadamente.
2 A Avenida Presidente Roosevelt, onde se encontra o Cizínio, é uma das mais movimentadas de São Francisco.
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