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EDITORIAL

Como na Guiana Francesa… Resistir, lutar

Por Vincent Touchaleaume, direto da Guiana Francesa

três semanas começou uma grande mobilização na Guiana Francesa, com barreiras nas estradas, avenidas e ruas. A principal central sindical chamou a greve geral a partir de 27/03. Uma população de maioria negra castigada por anos de colonialismo francês. Até o momento o país está parado negociando com o imperialismo francês as condições para o retorno à normalidade. Publicamos o texto abaixo, aparecido no jornal francês L’Anticapitaliste nº 378 de 6 de abril, escrito por um militante guianense”

Em 28 de março, 30 mil pessoas protestaram nas ruas de Caiena e de Saint-Laurent. No momento em que nós escrevemos [4 de abril], milhares de pessoas se reúnem em Kourou para marchar até o centro espacial. Mesmo sobre o Haut-Maroni, os Ameríndios colocaram suas bandeiras sobre suas canoas e desceram o rio para se juntarem as manifestações à Maripasoula. O que que explica esta mobilização histórica e pacífica?

Os frutos podres do Estado francês

Visto da França, a Guiana Francesa tem a imagem de um faroeste amazônico onde reinam a violência e a desordem. E esta mobilização é apresentada, às vezes, como o capricho de crianças mimadas que se beneficiaram largamente da generosidade francesa através de subsídios e bônus para os funcionários que trabalham na região. Esta visão passa longe das questões importantes representadas pela região “ultramarina francesa”.

Segundo império marítimo mundial, único Estado a exercer sua soberania sobre todos os continentes e todos os oceanos, a França deve ao “detalhe” de seu império colonial sua continuação no clube das grandes potências. Sua contribuição é determinante ao nível geoestratégico, científico, militar, mas também do ponto de vista dos recursos marítimos que terão um lugar importante neste século.

A Guiana Francesa é a mais extensa das colônias francesas e potencialmente a mais rica. Do tamanho de Portugal, hospedando a Agência espacial europeia à Kourou, vizinha do “gigante brasileiro” que se impõe como potência regional, seus recursos são ainda pouco explorados. A biodiversidade da floresta, que cobre 90% do território, atrai multinacionais e laboratórios farmacêuticos, enquanto que o petróleo, o ouro e os outros minerais poderiam financiar um desenvolvimento endógeno que tiraria a população da dependência em relação a metrópole.

Foi esta esperança que o movimento atual soube materializar. Todas as camadas sociais e faixas etárias estiveram representadas em uma sociedade em pleno crescimento demográfico. Os setores com menos de 30 anos são a maioria, só que um de cada dois jovens está atualmente desempregado. O Estado prefere deixar vegetar a população graça a subsídios, ao RSA (programa social para pessoas de baixa renda) e empregos não formais, antes que alocar os meios necessários à educação e a formação das jovens gerações. Compra a paz social ao preço de “estágios”. A grande riqueza e a grande pobreza estão muito próximas, segundo um modelo que se pode qualificar de economia de transferência: o dinheiro público vem da França sob forma de programas sociais e os altos salários dos funcionários…. e retorna sob a forma do consumo.

Uma mobilização que continua e que vai deixar marcas

“Bloublou fini!”: mais mentiras! “Nou gon ké sa!”: não podemos mais! O objetivo é de acabar com o contra-desenvolvimento estrutural. A insegurança está na cabeça de todos e, infelizmente, é manchete semana após semana. Uma parte da juventude está na beira da estrada, buscando sua sobrevivência cotidiana de maneira paralela, tentada pela autodestruição. A insegurança é a parte visível do iceberg. O desemprego afunda a sociedade, a escola é incapaz de preencher seu papel, pois ela não consegue acolher em boas condições o conjunto dos jovens e por que ela fabrica massivamente o fracasso escolar. Desde a escola primária – na qual somente 1 aluno sobre 4 saem com as competências de base no francês e na matemática para o secundário – que só permite um trimestre por ano de acesso ao bacharelado, a universidade – onde a taxa de reprovação no primeiro ano é massiva em muitos cursos. O sistema francês é inadaptado a realidade cultural, linguística, climática e econômica do país.

O movimento foi impulsionado por coletivos cidadãos contra a insegurança, em relação com os setores de trabalhadores (das grandes até as pequenas empresas…). Os 500 frères (irmãos), que se reuniram originalmente numa sala de academia de um bairro popular de Caiena, marcaram por seu senso de direção e determinação. As primeiras reivindicações não eram, portanto, especialmente progressivas: reforço para a polícia, mais repressão, a extradição de presos de origem estrangeira e o pagamento de subsídios e ajudas devidas para agricultores, pescadores e outros setores. No entanto, todo movimento social da Guiana Francesa colocou rapidamente as questões de fundo que atravessam o país: o desemprego, a falta de infraestruturas, o monopólio do Estado sobre a terra, a inadaptação das leis francesas e a necessidade de mudar as relações com a “metrópole”.

O MDES (Movimento pela Descolonização e pela Emancipação Social) reúne militantes com experiência que carregam a memória dos grandes movimentos sociais dos anos 1990-2000. A entrada em greve por tempo indeterminado do sindicato UTG (União dos Trabalhadores Guianenses) da Energia, que mantém a barreira diante do Centro espacial guianense com um coletivo de usuários e de trabalhadores do hospital, deu uma base de classe ao movimento, amplificada pela greve geral. Desde alguns dias, sobre as barreiras, sobre a Radio Péyi e sobre as redes sociais, que tem um papel determinante, a evolução estatutária está no centro dos debates. Se a França não quer financiar o desenvolvimento da Guiana, que ao menos ela deixe-a que a Guiana Francesa se autoadministre!

O futuro do movimento ainda está por escrever, mas todo mundo na Guiana Francesa sente que uma página está prestes a virar, que a sociedade se coloca um novo olhar sobre ela mesmo, que a ameaça xenófoba pode ser combatida por uma visão solidária e mais igualitária.

É nesta via, aberta pela grande mobilização social, por sua determinação, sua radicalidade,  que nós vamos levar esta campanha presidencial com a candidatura de Phillipe Poutou.”