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EDITORIAL

A direita, Fidel Castro e a defesa da Revolução Cubana

A morte de Fidel Castro gerou reações de tristeza e comemoração em todo o mundo. Não poderia ser diferente, Fidel, sem dúvida, foi uma das figuras mais marcantes do século XX.

Duas são as visões hegemônicas sobre Fidel Castro e os rumos da revolução cubana.

De um lado está a posição provavelmente majoritária: morreu um ditador como outro qualquer. Este é o retrato de uma revolução cubana e de Castro pela ótica de figuras da extrema direita como Donald Trump , Jair Bolsonaro,  MBL (Movimento Brasil Livre) e os opositores do regime cubano em Miami. Comemoram a morte de Fidel. Para a direita, Cuba é uma prova de que o socialismo não deu certo. Desencadearam uma campanha de ódio ideológico contra a revolução cubana. Não podemos compactuar com essa campanha. Não reconhecemos em figuras nefastas e defensora da ditadura militar como Jair Bolsonaro, autoridade moral para criticar Fidel.  É uma tarefa fundamental combate-los no campo das ideias e da luta de classes.

Mas não é apenas esta visão que existe. Podemos acompanhar também a reação à morte de Fidel de uma esquerda incapaz de uma visão crítica sobre os rumos da revolução cubana e o destino político do seu principal dirigente. Não nos serve ignorar fatos de imensa dimensão: foi pelas mãos da burocracia castrista que a restauração trouxe a pobreza e a prostituição para a ilha que despertou os sonhos de milhões. Esta é uma visão unilateral que despreza a evolução das posições da burocracia castrista, a falta de democracia operária em Cuba e o papel de Castro na restauração capitalista.

Reivindicamos a revolução cubana e o que representou o processo revolucionário para o povo cubano e latino-americano, ao mesmo tempo, que somos opositores da Burocracia castrista e o seu curso de restauração do capitalismo em Cuba e a falta de liberdades democráticas na ilha.

As conquistas da revolução cubana

A revolução cubana de 1959 contra o ditador Fulgêncio Batista avançou para a expropriação da burguesia cubana e do imperialismo norte-americano, tudo isso a menos de 90 milhas da costa americana. O desenvolvimento do processo revolucionário avançou para uma reforma agrária radical que nacionalizou as grandes propriedades de terra e distribuiu terra aos camponeses.  A planificação da economia fez com que em poucos anos Cuba avançasse de uma semi-colônia americana para um país com acesso universal a educação com a eliminação do analfabetismo, a garantia do acesso a saúde pública, cultura e esporte. A pequena ilha do Caribe avançou em poucos anos para ser um dos países com maior desenvolvimento humano da América Latina. Em essência, essa é a herança que reivindicamos. Uma revolução socialista foi capaz de transformar Cuba em um dos países com maior desenvolvimento humano e melhores índices de saúde e educação, foi capaz de criar uma potência no esporte mundial.

O fim da URSS, o embargo econômico norte-americano e os limites de recursos naturais de Cuba fizeram com que a partir dos anos 90 as condições econômicas e sociais piorassem na Ilha. O projeto de “socialismo num só país” mostrou seu limite histórico. A direção castrista para manter seus privilégios e segurar o regime abriu a ilha para o capital estrangeiro, principalmente no turismo, e começou o processo de restauração capitalista e o ataque a grande parte das conquistas da revolução. Aos poucos foi caindo a planificação da economia, o monopólio do comércio exterior e a propriedade estatal dos meios de produção.

Fidel Castro: da Guerrilha a dirigente do estado cubano

Fidel Castro foi o principal organizador, dirigente e estrategista do Movimento 26 de Julho. Dirigiu a guerrilha que derrubou o ditador Fulgêncio batista, ganhando apoio das massas camponesas e urbanas e desafiando o imperialismo norte-americano. Uma revolução social que atingiu profundamente toda a vanguarda latino-americana nos anos 60 e 70.

Fidel era representante de uma pequena burguesia que expropriou o capitalismo como  produto da radicalidade do seu tempo histórico. A revolução cubana teve desde o seu nascimento o limite de não ter sido construída sobre a base da democracia operária. Todo o poder desde o surgimento do regime cubano esteve concentrado na cúpula do Movimento 26 de julho e depois na cúpula do Partido Comunista. Nunca existiu em Cuba conselhos que tivessem plena soberania, o poder ficou concentrado na cúpula da burocracia, nunca houve liberdade para partidos revolucionários dissidentes. Ocorreram perseguições evidentes aos LGBT’S.

A transformação da direção castrista também ocorreu no campo da defesa da expansão da revolução. Em um primeiro momento foram apoiadores de focos guerrilheiros em vários países da América latina e África, depois evoluíram para posições contrárias a expropriação da burguesia como na Nicaragua quando Fidel recomendou não transformar a Nicaragua em uma nova Cuba.

Reconhecer a importância da revolução cubana é uma tarefa da esquerda socialista. Devemos contudo evitar a unilateralidade, principalmente, no que toca o papel de Castro. Respeitamos os milhões de socialistas que choraram a sua morte mas alertamos que não podemos esquecer as lições da história. O socialismo só é possível no marco internacional. Os regimes burocráticos não levam ao socialismo, ao contrário abrem os caminhos da restauração. Neste sentido, a história não absolveu Fidel.

Foto:Exilados cubano celebram a morte de Fidel Castro em Miami, na Flórida – Reuters

 

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Revolução