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EDITORIAL

Quem prepara a volta da direita mais reaccionária? O exemplo grego da syriza

Por: MAS – Portugal

Na Grécia, tal como Portugal, é necessário uma esquerda mais combativa e exigente que não se curve aos ditames do Euro e da UE e que defenda uma saída internacionalista da UE, que defenda a saída do euro, a anulação da dívida dos países periféricos e a solidariedade entre os povos. 

No início deste mês de Outubro o governo grego liderado pela Syriza em coligação com o partido Anel (partido de direita) apresentou a proposta de Orçamento para 2017.O conteúdo do documento contempla 3,3 mil milhões de euros de austeridade adicional à austeridade que já massacra o povo grego desde 2010. Importa relembrar que a Syriza era uma coligação de pequenos partidos de esquerda e que eleitoralmente andava à volta dos 4% e 5%, só em 2012 é que ficou em 2º lugar, obtendo 27% dos votos. A Syriza ganhou as eleições em Janeiro de 2015 fazendo campanha contra a austeridade, pela reposição de tudo o que tinha sido retirado, pela reestruturação da dívida pública, mas sem se posicionar contra a permanência da Grécia no Euro. A vitória da Syriza gerou uma justa onda de entusiasmo e esperança pela Europa, sobretudo à esquerda. Os primeiros 6 meses de governação foram de forte pressão da UE sobre o Governo da Syriza e de um aparente combate de Tsipras e do seu governo aos credores (UE,BCE e FMI), mas sem nunca defender a necessidade de sair do Euro. Aliás, toda a sua negociação inicial com os credores foi sempre com o pressuposto de que a Grécia queria e tinha de se manter no Euro. Essa opção está hoje, infelizmente, a ser paga pela Syriza e os trabalhadores gregos.

Na altura o MAS participou do entusiasmo e das manifestações em solidariedade com o povo grego, por este ter expressado nas urnas uma rejeição clara aos anos e anos de austeridade. Embora já na altura tenhamos alertado que a Syriza, se queria de facto acabar com a austeridade e virar a página, não poderia continuar a defender a permanência no Euro. Alertamos também que a coligação para governar, a Syriza com um partido de direita e xenófobo (Anel), não auspiciava nada de bom. Passados esses primeiros 6 meses e perante a pressão da UE e restantes credores através da ameaça de não conceder mais financiamento à Grécia, Tsipras marca um referendo onde questionava o povo grego se era pelo Sim ou Não ao novo memorando da Troika que continha mais austeridade. O povo grego expressou-se com um claro Não ao memorando (61,9%), mas Tsipras desprezou o resultado e nessa mesma noite começou a negociar com U.E o memorando. Começa aí, de forma mais clara, a traição da Syriza às suas ideias iniciais e ao povo grego. Tsipras passa a ser denominado na Grécia como “o malabarista”, por ter transformado uma vitória de quem estava contra a austeridade num mandato para negociar com os credores mais austeridade.

Política da Syriza está a reforçar a direita
A vitória da Syriza nas eleições expressava a luta do povo grego e das suas mais de 30 greves gerais no combate aos memorandos da Troika executados no país pela Nova Democracia (partido de direita) e PASOK (PS da Grécia). Essa combinação entre a luta dos trabalhadores e o reforço eleitoral da Syriza permitiu afastar do poder o “centrão”,  ou seja, os partidos da classe dominante – Nova Democracia e PASOK. Agora, passados 6 meses,  a política da Syriza começa a abrir espaço para que a direita e o centrão reacionário e corrupto renasça das cinzas.

Passado quase 2 anos de governo Syriza, a austeridade passou a ser uma fatalidade e Tsipras utiliza os argumentos da direita e do centro de que “não há alternativa ao rumo que está a ser seguido”. A quem faz críticas pela esquerda à política do Syriza, Tsipras responde ferozmente quem, à esquerda com o já batido argumento: “vocês querem a volta da Nova Democracia (direita)”. Mas não será precisamente Tsipras, que ao aplicar uma política de direita, abre espaço ao regresso da mesma?

Olhando para as sondagens que saíram nos últimos meses na Grécia, quem está a preparar caminho para a volta da direita é a Syriza e o seu governo. A Nova Democracia surge nas pesquisas com 26% das intenções de voto e a Syriza em 2º lugar, com 16%. Na verdade, a política seguida pelo governo Syriza de continuidade das privatizações (portos, aeroportos, caminhos de ferro, água), de cortes nas pensões (o 12º corte nas pensões desde 2010), manutenção de cortes nos salários, tratamento dos refugiados em campos sem condições humanitárias abre espaço à volta da direita reaccionária e corrupta. Se, quando os reformados saem às ruas para contestar os cortes nas pensões, são recebidos como antes, com bastonadas e gás lacrimogéneo, porque motivo se espera que prefiram o Syriza à direita tradicional? “Pelo menos a direita não mente: diz que vai cortar e corta”. Assim parece começar a pensar parte da população grega.

O cenário é ainda mais greve se o virmos à escala europeia. A ascensão e vitória eleitoral da Syriza gerou esperança em toda e esquerda e trabalhadores europeus. Parecia haver uma alternativa pela esquerda ao plano austeritário europeu.  Ao desperdiçar essa oportunidade histórica, a Syriza abriu espaço para que a extrema-direita – Le Pen, Alternativa pela Alemanha ou o UKIP inglês – se posicionem com a única “alternativa” à decadência da UE. E, ao contrário da nova esquerda que o Syriza representava, os representantes da extrema-direita parecem não vacilar nas suas intenções.

Lições para a esquerda portuguesa
Este é o exemplo categórico e prático que a falta de audácia, combatividade, coragem e de exigência à esquerda cria as condições necessárias à volta dos partidos de sempre. A Syriza tem-se revelado na maior desilusão para o povo grego levando-o a tirar a conclusão de que “a esquerda e a direita é tudo igual”.

Sensivelmente há um ano, aquando da 2º vitória da Syriza nas eleições convocadas a seguir ao referendo, a deputada europeia Marisa Matias (BE) dizia o seguinte: “Evitou-se o pior cenário, que é o cenário em que – depois de toda a chantagem que a União Europeia fez, das instituições europeias, o Fundo Monetário Internacional, também o papel que o Banco Central Europeu fez para condicionar o exercício da democracia – seria voltar a ter um Governo da Nova Democracia, o principal responsável na situação em que a Grécia se encontra”.

Este raciocínio de que tudo é permitido, com a ameaça de que, caso contrário, volta a direita, até mesmo não cumprir com a decisão de um povo que se expressou no referendo contra o memorando da Troika, é muito perigoso. Porque é este raciocínio que tem por base as justificativas quando existe repressão, com o lançamento de gás lacrimogénio, como aconteceu a semana passada aos pensionistas em Atenas. É este raciocínio que justifica as privatizações, a austeridade, os impostos indirectos, os maus serviços públicos e de transportes… “porque senão, vem aí a direita”.

Mas importa perguntar: um governo que aplica estas medidas está a seguir que tipo de políticas? Serão estas políticas de esquerda? Não nos parece. É por isso que desde o início alertamos para as pistas que a Syriza ia dando de que não iria cumprir com a promessa de mudar a página da austeridade. Apesar das sondagens darem o 1º lugar à Nova Democracia, parece que Tsipras não aprendeu a lição, prosseguindo com a proposta de orçamento para 2017 com mais austeridade e, no Congresso da Syriza, que se realizou este fim-de-semana (14, 15 e 16 Outubro), insistindo no erro de permanecer acorrentado ao euro – “abandonar o euro não é um plano progressivo”

Na Grécia, tal como Portugal, é necessário uma esquerda mais combativa e exigente que não se curve aos ditames do Euro e da UE e que defenda uma saída internacionalista da UE, que defenda a saída do euro, a anulação da dívida dos países periféricos e a solidariedade entre os povos. É necessário que a esquerda perca o medo pois enquanto não nos livrarmos deste colete-de-forças o futuro será como o passado recente: com austeridade, com os partidos de sempre e com a perigosa conclusão que se pode tirar deste exemplo de que “esquerda e direita é tudo igual”.

Precisamente por estes motivos, temos alertado para o perigo que constitui o apoio dado por BE e PCP ao governo do PS. Respeitamos a simpatia que muitos trabalhadores e jovens têm por esta aliança entre a esquerda e o PS, pois ela serviria, pelo menos, para impedir o regresso da direita. Mas alertamos que, no médio-prazo, ela pode abrir espaço ao regresso em força da direita.

Basta de austeridade! Referendo para sair do Euro já! Suspensão do pagamento e auditoria da dívida! Por uma esquerda independente dos partidos austeritários! Por uma Europa dos Trabalhadores e dos Povos!

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