Por: Glade Davis, colunista do Esquerda Online
Nessa última semana, um dos assuntos mais comentados midiaticamente foi o discurso de Marcela Temer relativo ao programa denominado “Criança Feliz”. O objetivo é atender crianças que recebem o bolsa família nos primeiros meses de vida e garantir aparato pedagógico e hígido permanentemente.
A ideia parece tentadora e emocionante. O Governo Federal, além de não revogar o programa social, resolve assisti-lo de perto, concedendo assistências inéditas às camadas mais carentes brasileiras. Só parece.
Isto me remete muito aos primórdios do Serviço Social no Brasil e no mundo. A burguesia buscava conter as articulações populares na época e, para tanto, era necessário utilizar-se dos poderes da fé e do amor cristão, que seriam, portanto, disseminados pelas mulheres burguesas. A essas mulheres era incumbido o papel de levar a caridade e o assistencialismo para as camadas mais pobres da sociedade, doando mantimentos, oferecendo atendimento médico e levando a palavra de Deus, que era o maior acalento para que a classe mais oprimida encontrasse o caminho da esperança e da mudança.
O serviço social como todos sabem, ou deveriam saber, ganha caráter marxista nos anos 60 e 70 pós ditadura, rompe com o assistencialismo e passa a jogar do lado da classe trabalhadora. Fica muito óbvio que estar ao lado dos necessitados não é uma questão feminina e cristã, mas uma questão de profissionalismo que prega pelas mudanças sociais edificadas, mudanças que requerem uma revolução que só virá das camadas mais baixas. O Serviço Social não é assistencialista no séc XXI, mas revolucionário. Se torna, portanto, a única categoria de trabalhadoras que hoje é majoritariamente feminina e negra e que agride o capital dentro do próprio capitalismo.
Contrariando propositadamente tudo o que foi construído historicamente, o governo traz de volta os ideais assistencialistas para amenizar os nervos diante das implementações inconstitucionais que agridem violentamente a classe. A ideia é novamente mostrar o potencial emocional e amoroso da mulher bem criada e do lar, a mulher que não fala alto, que não se impõe agressivamente diante de suas opiniões e que lhe cabe apenas o dom da boa etiqueta e dos bons costumes.
É esse o papel destinado às mulheres no governo Temer. Não há qualquer articulação politizada economicamente ou culturalmente para mulheres. É impossível pensar que num governo que odeia a classe trabalhadora e o setor dos oprimidos, poderia dar voz política às mulheres e, ou a negra(o)s e LGBTs.
Assim como na década de 30, a burguesia volta a secundarizar o papel das mulheres, delegando-as à mensageiras do amor benevolente e assistencialista, e para além disso, acredita que diante de tantos cortes de direitos e implantações elitistas e racistas, o assistencialismo dará conta de sanar a falta de base desse governo, que tem a cara de que não se sustenta de pé nem mesmo nos próximos um ano e alguns meses de mandato.
Este é o notório saber do governo de direita, ignóbil a todas as conquistas da classe trabalhadora, às profissionais que vêm em grande maioria da periferia e que pertencem a minorias. Ataca conscientemente a politização da massa através da nova cara do Serviço Social que surgiu diante das últimas movimentações sociais.
Mas, será essa nova cara do serviço social marxista aliada aos movimentos da classe trabalhadora quem irá desafiar o assistencialismo do governo e irá lutar cada vez mais para que se faça valer a laicidade do estado. Para que as mulheres pobres e da periferia saibam que seus lugares de mulheres não são apenas sendo boas mães e esposas; que a classe trabalhadora não deve aceitar de bom grado os ataques aos direitos e que só será possível se libertar dessas correntes quando intermediariamente busquemos alternativas de um governo que jogue ao lado da classe. Quando, por fim, derrubarmos o capitalismo.
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