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As lutas LGBTs, feministas, negras e indígenas que precederam o Fora Temer

Travesti Socialista

Travesti socialista que adora debates polêmicos, programação e encher o saco de quem discorda (sem gulags nem paredões pelo amor de Inanna). Faz debates sobre feminismo, diversidade de gênero, cultura e outros assuntos. Confira o canal no Youtube.

Por Jessica Milaré, Colunista do Esquerda Online

Algumas pessoas poderiam dizer que os setores oprimidos aderiram às manifestações contra o governo Temer. Mas talvez seria mais correto dizer que, pelo contrário, foram as mobilizações contra a LGBTfobia, o machismo, o racismo e a xenofobia que prepararam o terreno para que o Fora Temer surgisse de norte a sul.

Os setores oprimidos da classe trabalhadora são os que são mais sensíveis à mudança dos ventos. Quando milhões foram às ruas contra o aumento das passagens em 2013, muitas pessoas ainda tinham na lembrança as fortes mobilizações que ocorreram contra o Feliciano e suas declarações LGBTfóbicas, machistas e racistas. Por isso, as LGBTs iam às ruas com todas as suas cores.

Junho de 2013 defendeu, em primeiro lugar, interesses do povo contra os da elite. “Ei, Fifa, paga minha tarifa!”, gritavam as ruas a plenos pulmões.

Desde então, a primeira greve a ter repercussão nacional foi a onda negra da greve dos garis do Rio de Janeiro em fevereiro de 2014. Foi a luta dos garis negros, que na maioria das vezes são invisíveis à população, que moralizou a classe trabalhadora para que radicalizasse suas lutas, o que se expressou em outras greves como de garis, petroleiros, metroviários e metalúrgicos.

Em 2015, ao contrário de todas as promessas feitas no ano anterior, Dilma defendeu os interesses dos empresários e banqueiros que financiaram em peso a sua reeleição. Revogou direitos trabalhistas e cortou verbas das áreas sociais. Quem depositou um voto de confiança de que o PT iria “a esquerda ” se sentiu desmoralizado e traído (de novo!)

Por outro lado, ocorreram mobilizações massivas de rua, protagonizada principalmente por pequenos empresários, profissionais liberais e trabalhadores com cargos de chefia que estavam revoltados com o resultado das eleições, com os escândalos de corrupção e que defendiam a queda da Dilma. Essas mobilizações, desde o princípio, tinham aversão às bandeiras dos setores oprimidos. Sua composição era, em sua vasta maioria, de homens brancos, heterossexuais e cisgêneros, com diploma de ensino superior e das faixas de renda mais altas. Na cidade de São Paulo, por exemplo, 69% dos manifestantes tinham renda familiar maior que 5 salários-mínimos (na mesma cidade, apenas 26% da população está nessa faixa de renda). Até mesmo em Salvador, onde quase 80% da população é negra, as manifestações contra a Dilma eram em sua vasta maioria de pessoas brancas!

Fascistas, com seus discursos de ódio contra as pessoas oprimidas, entraram nessas mobilizações com tranquilidade. O Bolsonaro tinha seu próprio carro de som! Muitas LGBTs e pessoas de camisa vermelha, pelo contrário, foram agredidas por manifestantes. Estes demonstravam não só aversão às lutas da classe trabalhadora, como também às dos setores oprimidos dessa mesma classe. Não demorou quase nada pra que as pessoas que participaram das lutas feministas, LGBTs e negras percebessem que essas manifestações não estavam do mesmo lado que elas.

Muito antes do impeachment se concluir, os golpistas já haviam declarado guerra às pessoas oprimidas e suas lutas, protagonizando várias ofensivas contra os setores oprimidos: o avanço da terceirização; a redução da maioridade penal; a retirada dos debates de gênero, identidade de gênero e orientação sexual nas escolas; os avanços contra o direito ao nome social. Sem contar também com ataques regionais, como o cancelamento do programa de combate à homofobia no Rio de Janeiro; a repressão policial à Parada LGBT em Campinas-SP; etc.

Os movimentos das pessoas oprimidas, em resposta, protagonizaram diversas contraofensivas: as manifestações Fora Cunha; as mobilizações em repúdio ao atentado na boate LGBT em Orlando; a mobilização contra o assassinato de dois professores gays em Santa Luz, na Bahia; a greve por cotas raciais e contra os cortes de verbas na Unicamp e na USP; as mobilizações indígenas contra os retrocessos nas demarcações de terra; a segunda Parada LGBT de Campinas este ano, em resposta à repressão da primeira; etc.

As inúmeras declarações LGBTfóbicas, machistas, racistas e xenofóbicas dos golpistas no processo de impeachment e nas redes sociais não deixam dúvidas. O fato do Temer ter nomeado como ministros apenas homens, brancos, heterossexuais e cisgêneros, que têm a cara da elite, muitos investigados na Lava-Jato, outros fundamentalistas, é a mais visível prova de que este governo assumiu a declaração de guerra aberta contra todas as lutas da nossa classe. Ela está estampada na cara desse governo. Já passou da hora de derrubá-lo!