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Curitiba: O que está por trás da polêmica com a Rua São Francisco?

Por: Paula Alvarenga e Rodrigo Tomazini, de Curitiba, PR

No último dia 16, a Câmara de Vereadores de Curitiba, a pedido do reacionário e ultra conservador vereador Chicarelli (PSDC), aprovou requerimento que pede à Prefeitura a proibição do fechamento da Rua São Francisco aos domingos para atividades infantis. O documento aprovado também pede mais fiscalização no local. Segundo o autor do requerimento é preciso “moralizar a Rua São Francisco e acabar com o consumo de bebidas alcoólicas e drogas no local”.

Por trás desse pedido está camuflado o conteúdo extremamente preconceituoso, homofóbico e excludente do vereador. O motivo apresentado é que, segundo ele, essa rua, especificamente, seria motivada por outro sentido, o da bebida. “Só passam pela rua as pessoas do mesmo estilo.  Algumas crianças que passaram pela região me procuraram assustadas. Além disso, pessoas do mesmo sexo ficam juntas lá”, chegou a declarar.

Rua-São-Francisco
Aos domingos, Rua São Francisco também é frequentada por jovens e crianças.

O que está sendo discutido é a aprovação de uma política higienista, repressora e homofóbica. O que o vereador está propondo é um retrocesso, já que é sabido por todos que antes da ocupação pública, a rua não era atrativa. Mudou após as pessoas começarem a frequentar. Agora, inclusive, a rua é mais segura.

Logo de cara vemos uma censura por parte do autor devido obviamente ao medo da multidão, da organização, da troca de experiências entre os jovens. A ocupação de locais públicos fica proibida. Se apropriar da cidade torna-se crime. Em tempos de crise e de ataques aos direitos dos trabalhadores e da juventude, o toque de recolher é a melhor solução para esses senhores.

O discurso de guerra às drogas oculta o discurso moralista e higienista de combate a todos aqueles que não se encaixam nos parâmetros da considerada normalidade, em especial a comunidade LGBT e a juventude negra e pobre moradora das mais diversas periferias brasileiras.

Desde a implantação da Lei de drogas de 2006, o Brasil tornou-se o 4º país no ranking mundial de população carcerária, ostentando a cifra de 622.202 presos em dezembro de 2014, com um aumento absurdo de 117% de encarceramentos femininos se comparado com o de homens, que cresceu 68%.

A criminalização das drogas consiste em uma das maiores fontes de lavagem de dinheiro e especulação financeira de grandes banqueiros, no entanto, 60% da população carcerária é formada por negros de idade entre 18 a 29 anos, apenas com Ensino Fundamental completo.

Como se não bastasse, mais da metade dos presos portavam menos de 100 gramas, não estava armada, ou em qualquer tipo de atividade violenta. Assim, 150 mil pessoas, 25% de todos presos, perderam a liberdade sem cometer nenhum crime de violência. O episódio do helicóptero carregado com quase meia tonelada de cocaína só reforça e demonstra como o grande tráfico é abafado pela imprensa e pela polícia.

A legalização das drogas poderia reverter tal situação, impactando de forma positiva o cotidiano da cidade, principalmente da população negra da periferia, diminuindo mortes, o encarceramento e a violência gerada pelo tráfico. Por outro lado, tratando o caso como de saúde público e não de segurança pública, os dependentes poderiam ter acesso a tratamentos adequados e não da repressão policial e prisão, quando não a morte. O que a Câmara de Vereadores de Curitiba faz é ir no caminho oposto a isso.

É urgente e necessário um amplo debate, já que é uma reivindicação de grande relevância social não só para usuários recreativos, mas para toda a população. O que deve ser moralizada não é a Rua São Francisco, mas sim a Câmara de Vereadores de Curitiba.