EDITORIAL 05 DE JANEIRO | As cenas de barbárie vistas no presídio no Amazonas são estarrecedoras. O massacre de 56 detentos, com direito a corpos esquartejados e degolados, expõe de modo dramático a falência do sistema penitenciário nacional. E vai além disso.
O horror ocorrido em Manaus revela em cores vivas a brutalidade, a tortura e o assassinato entranhados no Estado brasileiro.
As prisões superlotadas, fedendo a fezes humanas e sujeira, acolhem os presidiários com a prática regular e sistemática de violência, tortura e humilhação. O detendo é posto atrás das grades sob a condição de lixo humano, exposto às mais cruéis formas de degradação física e psicológica e entregue ao domínio de facções criminosas que controlam as prisões.
As imagens do massacre chocaram o mundo. Até mesmo o Papa Francisco se manifestou e pediu que “condições de vida dos detentos sejam dignas de pessoas humanas”.
Mas o horror de Manaus, que apresentou um país à beira do colapso do sistema penitenciário, não comoveu Michel Temer, que após três dias se mantém – vergonhosamente – calado sobre o assunto.
Pior ainda foi a declaração espúria do governador do Amazonas, José Melo (PROS), que disse que “não havia nenhum santo” no presídio, e completou: “Eram estupradores e matadores que estavam lá dentro”, como se a condição dos detentos amenizasse as cenas de terror.
Na mesma entrevista o governador brucutu não explicou o financiamento de sua campanha eleitoral (R$ 300 mil reais) pela empresa privada responsável pela administração do Compaj, Complexo Penitenciário onde ocorreram as mortes.
O massacre também traz à luz o caráter podre do sistema carcerário
Segundo levantamento do jornalista Jânio de Freitas “Dos 622 mil encarcerados, mais de 40%, ou cerca de assombrosos 250 mil, estão sob prisão “provisória” há meses, há anos, quando deveriam durar 30 dias, se tanto. Ou nem isso, porque esses “provisórios”, se e quando afinal chegam ao julgamento, na maioria são absolvidos”.
E acrescenta: “Logo, nem sequer precisariam ou deveriam passar por prisão provisória. No Amazonas, dos 4.400 encarcerados, 2.880, ou 66%, são presos “provisórios”. Não menos expressivo da secular e perversa indiferença brasileira: cerca de metade dos sentenciados à cadeia não cometeu crime violento. Ao menos parte, portanto, e o provável é que grande parte, conforme o Direito Penal menos obsoleto, deveria cumprir penas alternativas, sem chegar ao cárcere”.
Os presídios brasileiros são, na prática, um depósito de pobres, negros e excluídos, de pessoas que em sua maioria cometeram delitos leves, que poderiam estar fora da cadeia cumprindo penas alternativas, ou que são inocentes, pessoas encarceradas sem provas.
Submetidos às práticas mais desumanas por parte do aparelho do Estado e reféns do crime organizado, os detentos saem de lá, quando saem, muito piores do que entraram. É preciso pôr fim a essa barbárie institucionalizada, é urgente acabar com encarceramento em massa. Basta de horror.
Foto: Reuters
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