O caos no INSS
Há anos o INSS vive um problema crônico de falta de servidores para atender a população. Essa situação se agravou em 2019, com milhares de servidores se aposentando e com o aumento dos requerimentos devido à reforma da previdência. O governo foi notificado várias vezes por órgãos como TCU e Ministério Público de que deveria fazer concursos públicos para que o INSS não entrasse em colapso. Os concursos não foram realizados, e a situação só se agravou.
A solução mágica encontrada pelo governo e seu ministro Paulo Guedes foi acabar com o atendimento à população nas agências e redirecionar quase todos os servidores do INSS para a análise de benefícios internamente, inclusive aumentado metas, adotando sistema de bônus e flexibilização da jornada de trabalho para alguns servidores. Mas o número de servidores é muito pouco para a demanda, e essa medida também não resolveu a situação.
O governo fez a opção de expulsar a população das agências do INSS e apostar somente no atendimento à distância. Com a diminuição do serviço presencial e fechamento de várias agências, as pessoas estão tendo que se virar para conseguirem acessar os serviços ou ter alguma informação pela Central 135 ou pela internet através do MEU INSS. Para agravar a situação, o governo extinguiu o Serviço Social do INSS com a Medida Provisória 905/2019, um dos poucos serviços que atendia a população presencialmente.
As razões do colapso do INSS
O INSS vive um problema estrutural que consiste na falta de servidores, e também no uso de tecnologia e condições de trabalho que estão distantes do que seria necessário para garantir o atendimento à população.
O déficit de servidores do INSS é algo que vem sendo denunciado já há alguns anos, seja pelas entidades representativas dos servidores, seja por órgãos como Tribunal de Contas da União e Ministério Público Federal.
Em 2014, o TCU, por meio do Acórdão 1795/2014-TCU-Plenário, já previa a possibilidade de colapso no atendimento do INSS, e recomendava que a Direção do Instituto e Governo Federal adotassem providências para evitar prejuízos ao atendimento ao público. Na época, o INSS tinha 39.392 servidores ativos em seu quadro, hoje conta somente com 23.032 servidores. Uma redução de 41%.
Em 2019, diante do caos já instaurado no INSS, a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão emitiu a Recomendação nº 19/2019, denunciando o crescente esvaziamento do quadro de servidores do INSS e represamento de benefícios, e recomendou que o Governo Federal realizasse concurso para contratação imediata de servidores, a fim de evitar prejuízos no reconhecimento de direitos aos usuários.
Mas, mesmo após estarem cientes da situação, Bolsonaro, o ministro Paulo Guedes e atual gestão do INSS, com sua política de Estado Mínimo, ignoraram os riscos e resolveram pagar para ver. Importante destacar que o Orçamento Federal de 2019 aprovado no Congresso Nacional previa novas contratações para o INSS através de concurso público, mas o concurso não foi realizado e o quadro se agravou.
Os discursos dos gestores do INSS, assim como da equipe do Ministério da Economia é sempre de que está havendo investimentos em tecnologias que garantem o funcionamento do INSS e o atendimento da população. Mas esses discursos não condizem com a realidade.
Os sistemas utilizados pelo INSS estão mais para a pré-história do que na modernidade tecnológica. Alguns dos sistemas utilizados na análise de benefícios ainda são baseados no antigo sistema operacional MS-DOS. Mesmo os sistemas atuais necessitariam de investimentos em redes de informação, pois a maioria dos locais trabalha com a velocidade de 512 Kbps, algo distante do discurso de avanço tecnológico feitos pela equipe de Paulo Guedes.
Para agravar a situação, a Dataprev, empresa responsável pelo processamento de dados do INSS e que está na lista de privatizações do governo, teve 15% de seus trabalhadores ameçados de demissão e plano para fechamento de unidades em 20 Estados em 2020.
Como já era previsto, o colapso anunciando chegou: Aproximadamente 2 milhões de requerimentos estão aguardando análise, sem contar as subtarefas que são geradas por esses requerimentos. São filas virtuais gigantescas, pessoas aguardando a resolução de serviços que antes eram resolvidos em poucos minutos nas agências do INSS como, por exemplo, cadastramento de procurador ou reativação de benefícios. Tal situação ainda pode se agravar, porque ainda não houve atualização das novas regras da previdência nos sistemas do INSS.
O uso político da crise e a contratação de 7 mil militares da reserva
Diante da crise e do desgaste político que a situação do INSS estava gerando para o Governo Federal, a solução mágica encontrada pelo ministro Paulo Guedes e sua equipe foi convocar militares da reserva para resolver o problema no órgão.
Numa manobra previamente preparada, se utilizando da Lei nº 13.954, aprovada em dezembro de 2019, o governo anunciou a contratação de 7 mil militares da reserva para atenderem no INSS. A lei prevê o seguinte:
“Art. 18. O militar inativo contratado para o desempenho de atividades de natureza civil em órgãos públicos em caráter voluntário e temporário faz jus a um adicional igual a 3/10 (três décimos) da remuneração que estiver percebendo na inatividade, cabendo o pagamento do adicional ao órgão contratante, conforme estabelecido em regulamento”.
O Secretário Especial de Previdência e Trabalho e autor da reforma da Previdência, Rogério Marinho, e o Presidente do INSS anunciaram que em 6 meses resolverão o caos instaurado no INSS. A partir de fevereiro os militares da reserva iniciarão treinamento, com início do atendimento previsto para abril. Com essa medida, o Governo Federal espera que todos os servidores do INSS sejam direcionados para análise e concessão de benefícios, desconsiderando os problemas estruturais que atingem o instituto há anos.
O colapso anunciado chegou e o Governo Federal mais uma vez faz a opção de não resolver o problema, em vez disso, faz uso político da crise instaurada pelo próprio governo para agradar sua base eleitoral. O INSS necessita de servidores para analisar os milhões de requerimentos de benefícios e serviços que chegam todo ano, somente com concursos públicos e investimentos em tecnologia a população terá seus direitos respeitados.
A contratação de 7 mil militares do país para substituir servidores federais no atendimento à população abre um precedente perigoso para todos órgãos públicos do país. Os trabalhadores e trabalhadoras precisam repudiar mais essa medida descabida do Governo Bolsonaro.
*Com Thaize Antunes, Andresa Lopes, Poliana Campos, Raquel Zanetti e Vinícius Vasconcelos.
Texto alterado em 16/01 às 10h57.
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