Unir a esquerda é apoiar Lula em 2018?
Publicado em: 3 de janeiro de 2018
Por Gabriel Casoni, de São Paulo (SP)
A entrevista de Marcelo Freixo a Folha de São Paulo gerou enorme repercussão. Nas redes sociais, o deputado do PSOL passou a ser duramente criticado, especialmente por dirigentes, blogueiros e lideranças ligadas ao PT. O argumento principal parece irresistível: a necessidade da unidade da esquerda para enfrentar a ofensiva da direita.
A ironia da história, contudo, é que a direção do PT, ao mesmo tempo em que ataca Freixo por supostamente dividir o campo da esquerda, negocia alianças e acordos com partidos golpistas, grandes empresários e lideranças da direita em todos país.
Assim, a cúpula lulista faz um jogo matreiro marcado pela dissimulação.
Por um lado, hasteando de maneira oportunista a bandeira da “unidade”, busca bloquear o aparecimento de uma alternativa da esquerda independente nas eleições de 2018, alternativa que terá mais força caso Guilherme Boulos confirme sua candidatura pelo PSOL. Por outro, para reatar laços com o grande capital, querem demonstrar como Lula pode ser novamente útil à classe dominante. As recentes declarações do ex-presidente, cuidadosamente pensadas para agradar o mercado financeiro, fazem parte da estratégia de costurar um novo pacto com os ricos e poderosos.
E a unidade para lutar contra Temer e as reformas?
A direção do PT mostra-se muito interessada em não permitir o crescimento do PSOL, e particularmente em evitar a candidatura do líder da Frente Povo Sem Medo. Mas pouco ou quase nada diz sobre a fundamental unidade para defender os direitos dos trabalhadores. Essa questão passa bem longe de suas preocupações. Para os blogueiros lulistas, a “unidade da esquerda” é sinônimo de apoio eleitoral a Lula.
Os direitos dos trabalhadores não podem esperar as eleições. Em fevereiro, será colocada em votação a Reforma da Previdência. Quais são os planos do PT e da CUT para barrar esse ataque à aposentadoria dos trabalhadores? Vão chamar o povo à luta? Vão defender um dia greve nacional ou irão manter a linha de recuo, como fizeram depois da greve geral de 28 abril de 2017? Vão construir a unidade da classe para derrotar esses projeto? Ou o apelo à unidade da esquerda só vale para pedir votos para Lula?
Para unir a esquerda, é preciso primeiro romper com a direita
O argumento de que o PSOL e Freixo fazem o “jogo da direita” quando defendem uma alternativa independente da esquerda em 2018 mostra-se hipócrita na boca de dirigentes petistas. Como falar em unidade eleitoral contra a direita quando se sabe que o PT negocia alianças com partidos e lideranças golpistas nas mais diversas partes do país, tanto nos estados como em nível nacional?
E não se trata apenas das conhecidas alianças com a família Sarney, Renan Calheiros e Kátia Abreu. O partido de Lula, além de estar com o PMDB em Minas Gerais, negocia coligações com o partido de Temer em 05 estados somente na região Nordeste. Em 2016, o PT apoiou candidatos do partido de Eduardo Cunha em 648 cidades brasileiras.
A direção do PT teria mais autoridade para falar em unidade da esquerda caso tivesse rompido de fato com a direita. Porém, a bem da verdade, a luta contra os “golpistas” virou apenas discurso para impressionar o público da esquerda. Na realidade, o projeto de conciliação de classes do lulismo se mantém intacto, tanto no programa como na prática das coligações políticas. A orientação segue sendo exatamente a mesma: se aliar a setores burgueses para vencer as eleições e governar por meio de um pacto com velhas elites.
Curiosamente, a cúpula lulista ainda não notou que essa estratégia faliu miseravelmente com o golpe parlamentar. Foram as alianças com a direita que abriram as portas para o ajuste neoliberal e a retirada de direitos. Aliás, esse processo se iniciou já no segundo mandato de Dilma, corroendo o apoio popular que tinha o governo.
Michel Temer e Eduardo Cunha não foram raio em céu azul; os golpistas cresceram sob as asas dos governos petistas. Quando a maré mudou, os velhos aliados traíram. As pequenas concessões sociais do lulismo foram toleradas enquanto o impulso econômico permitia. Quando o ciclo de crescimento se esgotou, o cenário mudou radicalmente. Ao final, a burguesia rompeu com o PT, mas, tragicamente, o PT ainda não rompeu com a burguesia.
Lula tem o direto de ser candidato, mas não tem o monopólio da esquerda
Tanto o PSOL como Marcelo Freixo estão pelo direito democrático de Lula ser candidato a presidente, isso já foi dito e repetido em inúmeras ocasiões. É evidente que se trata de um julgamento político por meio do qual um setor da burguesia quer excluir o petista das eleições via o tapetão judicial. A tentativa de criminalização de Lula deve ser repudiada pelo conjunto da esquerda.
Mas o direito de Lula ser candidato não deve ser compreendido como apoio político ao petista.
A esquerda socialista, aquela que não aceita alianças com os golpistas, que aposta num programa anticapitalista para transformação do país, que tem um projeto de poder baseado na mobilização dos trabalhadores e do povo pobre, aquela que não admite financiamento de grandes empresários e banqueiros, que não faz de empreiteiros e pecuaristas amigos de estimação, enfim, aquela que acredita que para mudar Brasil é preciso luta de classes e não conciliação de classes; esta esquerda independente tem o direito de se apresentar nas eleições com cara própria, para apresentar suas ideias e programa.
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