Por: Gustavo Linzmayer, de São Carlos, SP
No começo do mês de setembro, centenas de famílias ocuparam um terreno da Estação Ecológica de Itirapina (SP), município da região de São Carlos, com a finalidade de dar uso social à terra, nela plantando e produzindo alimentos. A área pertence ao estado de São Paulo e a ação tem, entre outros objetivos, questionar o uso que o governo vinha fazendo dela. Com predomínio, na paisagem, de pinhos introduzidos artificialmente, a área estava sendo usado por empresas para a extração de madeiras. Além disso, o governo tinha como plano privatizar o local.
O espaço é um dos parques mirados pelo Projeto de Lei 239 de 2013, que visa privatizar terras estaduais para uso econômico. Os sem terra lá acampados reivindicam que a prioridade de compra seja da União e que sua finalidade seja social, para a reforma agrária.
Em menos de um mês de ocupação, setores da direita organizada, prefeitos da região, especulação imobiliária e a mídia comercial local iniciaram uma violenta campanha de deslegitimação do acampamento, baseado em calúnias. Não é a toa, já que o movimento se instalou no coração do estado de SP, próximo a uma represa que comporta em seus arredores condomínios luxuosos de casas e um clube de golf.
Entre os crimes imputados aos sem terra e apoiadores, está a matança de animais silvestres e o incêndio da floresta. Em relação à floresta, que de fato tem sofrido com o fogo, é importante ressaltar que os menos interessados no incêndio são as famílias acampadas, pois, além de colocar em risco os barracos, pertences e integridade física, depõe contra a ocupação que já tem, de antemão, o desafio de conquistar apoio público. Há relatos de motoqueiros encapuzados que, durante a noite, iniciam o incêndio. Suspeita-se que sejam contratados pela especulação imobiliária da vizinhança para colocar a opinião pública contra o acampamento.
No entanto, o caso maior de flagrante calúnia é em relação à matança de animais. Foi descoberto que fotos circulando em redes sociais de animais mortos, supostamente pelos acampados, são retiradas, na verdade, de uma publicação de anos atrás que nem do Brasil é. Estão envolvidos na difusão do factóide figuras proeminentes da política local, notadamente no campo da direita. Em certo grau, a campanha de acusações mira, também, militantes e candidatos da esquerda.
Mais do que a simples solidariedade aos acampados diante dessa terrível campanha que se utiliza da calúnia e do terrorismo, é fundamental a discussão sobre a relação entre capitalismo e terra. O latifúndio, além de destruir os terrenos utilizados pela monocultura e pelos tratores, se utiliza vastamente de agrotóxicos venenosos para a saúde humana, A produção destina-se, majoritariamente, à exportação. No final das contas, não traz alimentação para os lares do povo explorado no Brasil e a lógica do lucro por ele reforçada, aumenta a desigualdade social.
A possibilidade de uma forma de produção agrícola que consiga respeitar a natureza, sem utilizar substâncias tóxicas, está no modelo de agricultura familiar, que é a base para os sem terra, com a aplicação de métodos de agroecologia e policultura, que renove o solo. Além disso, é possível suprir a demanda alimentícia de todos os lares do país apenas com o produto do trabalho camponês. Não necessitamos do latifúndio.
Comentários