Valério Arcary
Ahora, ya de viejo, vuelvo a los primeros amores: me encanta Lenin por su empirismo. Porque en el fondo ese empirismo es, en relación al proceso histórico, lo más dialéctico que hay(…) Me adelanto a decir, entonces, una comprobación metodológica: un sano empirismo, un sano hálito empírico es lo más dialéctico que hay. Porque, de hecho, este sano empirismo de Lenin es: “Dejemos que los hechos se produzcan, [que] las revoluciones [se produzcan], y después hacemos las teorías”. Y no como creo que es más o menos el enfoque de Trotsky: “Hacemos teorías de cómo va a ser una revolución para todo el siglo”. (…)¿Qué quiere decir “sano empirismo”? ¿Qué hubiera dicho Lenin? Lenin hubiera dicho: “Soy medio empírico. ¿Por qué no vemos [qué pasa]?; después vemos, ajustamos [la teoría] a la realidad; Y la realidad inmediata para [elaborar] política inmediata; la realidad más general para [elaborar] teoría más general. Por eso en el problema teórico siempre es un poco tardío. Lenin es uno de los últimos en escribir sobre el imperialismo, pero después redondea [el tema] [1]
Nahuel Moreno
Ao contrário do que pensam aqueles que ainda oferecem o seu apoio crítico ao PT e seu governo, o que está em disputa no Brasil, depois das Jornadas de Junho, não é o destino do governo Dilma, mas o destino das mobilizações que nasceram do mal estar social. O governo Dilma, dez anos depois da eleição de Lula em 2002, não oferece razão alguma para qualquer dúvida. Não tem preocupação maior, senão recuperar o mais rápido possível a estabilidade das instituições. O que mais teme o governo é a amplitude da greve geral de 11 de julho. O que está em disputa é qual será a dimensão da entrada da classe trabalhadora em cena. E quais serão as repercussões da greve geral na consciência de milhões de jovens que foram às ruas.
Alguns intelectuais de esquerda, chocados pela presença de algo próximo a dois milhões nas ruas, em revolta popular de massa radicalizada, ou seja, muito mais do que protestos, se interrogam, perplexos, por quê? O que foi, talvez, mais pertubador nas Jornadas de Junho, para aqueles que apóiam o governo de coalizão liderado pelo PT, foi o repúdio indiferenciado a todos os governos, não distinguindo Haddad ou Dilma, de Alckmin do PSDB, ou Sérgio Cabral do PMDB, entre outros. Pela primeira vez, governos dirigidos pelo PT foram ridicularizados, denunciados, escrachados nas ruas em manifestações de massas, numa esscala diferente de todas as que desfilaram nos últimos dez anos. A insolência, a irreverência e a fúria da juventude deixou a intelectualidade próxima ao governo assombrada.
O sentimento antipartidário que irrompeu nas ruas nas Jornadas de Junho é um fenômeno complexo, portanto, como tudo que existe, contraditório. Atingiu, impiedosamente, o PT. E, ainda que com menos intensidade, até os partidos que se posicionam como oposição de esquerda aos governos do PT. Muitos na esquerda se perguntaram se as massas juvenis não estariam sendo manipuladas pela direita para desestabilizar o governo Dilma, e preparar a volta do PSDB e seus aliados ao poder. A propaganda petista do “nunca antes na história deste país”, depois de dez anos de repetição, fez estragos na consciência crítica da militância de esquerda, especialmente, entre os ativistas do movimento da classe trabalhadora organizada.
Admitir que é contraditório, porém, não é suficiente. Qualquer análise tem o desafio de compreender uma dinâmica. De onde vem? Para onde vai? Uma análise sólida não tem compromisso senão com a compreensão da realidade. Análises não podem ser instrumentais. Precisam ser o mais rigorosas possíveis. Que aqueles que saíram às ruas não são reacionários é evidente.
Acontece que o mais complexo modelo teórico sempre será imperfeito e insuficiente para abarcar as muitas e imprevisíveis combinações históricas concretas. A teoria da revolução está sempre em processo de atualização. O marxismo tinha previsto, por exemplo, que o proletariado seria o sujeito social da revolução anticapitalista. Em consequência tinha prognosticado que os países industrializados de forma pioneira seriam o cenário das primeiras revoluções socialistas vitoriosas. Entretanto, um dos paradoxos históricos mais pertubadores foi que os trabalhadores só tenham conquistado o poder num país central até hoje, e ainda assim de forma efêmera, na França, durante os dias da Comuna de Paris em 1871, no que poderíamos dizer que foi uma “contra-mão” da época histórica, porque o capitalismo ainda estava longe de ter esgotado suas possibilidades de desenvolvimento na escala internacional. E a maioria das revoluções anticapitalistas vitoriosas tiveram como sujeitos sociais outras classes. Somente na Rússia Czarista a classe trabalhadora foi o sujeito da derrota do capital. Foi nestas circunstâncias que a teoria da revolução foi reelaborada por Lenin e Trotsky.
É da natureza da discussão teórica a produção de conceitos e idéias como instrumentos de interpretação da realidade, o que supõe a necessidade das comparações e as generalizações. Não se pode realizar trabalho teórico sem o esforço de caracterizações e conceituações.
Na análise da realidade, no entanto, é preciso muito cuidado para não deixarmos nossas preferências teóricas nos cegarem. A teoria deve estar sempre em processo de verificação. O auto-engano é uma armadilha poderosa. Assim como o narcisimo é uma doença infantil intelectual, o auto-engano é uma doença infantil do narcisismo. Que bom quando pensamos ver confirmadas nossas hipóteses!
A construção de conhecimento sério, todavia, exige profunda humildade. Em outras palavras, combater a superficialidade, as generalizações rápidas, portanto, enxergar a situação concreta. Isso significa uma atitude crítica em relação às nossas hipóteses, a disposição de corrigi-las, a percepção de que a realidade é sempre mais surpreendente que os prognósticos que foram feitos, que o conhecimento é uma construção coletiva, que a polêmica ajuda o esclarecimento, que a luta de idéias deve ser feita com respeito pelas hipóteses e argumentos contrários, e muito mais. Exige, portanto, teoria e método.
Ainda que tenha se manifestado de forma explosiva nas ruas nas Jornadas de Junho, há que recordar que irrupções de antipartidarismo já tinham vindo à tona várias vezes nos últimos anos, e não pode ser considerado uma surpresa. O repúdio aos partidos, que são desprezados como os instrumentos dos profissionais da política, não é novo. Tem uma dimensão positiva? Como tudo é relativo, é bom lembrar que a ausência de direção é muito melhor que a presença de uma direção burocrática. E superior, incomparavelmente mais avançado, que a liderança de uma direção burguesa.
O domínio dos monopólios sobre o regime democrático está na raiz da corrupção. E a corrupção pessoal dos políticos profissionais está na raiz do ódio da juventude. Esse processo de experiência, ainda que incompleto, porque identifica mais o corrompido do que o corruptor, é progressivo. A luta contra a corrupção, uma forma degenerada de controle político inerente ao capitalismo, é uma luta progresssiva.
Mas o antipartidarismo tem, também, uma dimensão regresssiva: a desconfiança de qualquer instrumento de luta política pelo poder. A conclusão de que “os partidos são todos iguais” é ligeira e ingênua. Para compreendermos o apartidarismo, e o relativo apoliticismo, primeiro há que perceber que têm uma dimensão internacional. São uma expressão da repulsa ao regime eleitoral corrupto.
Mas a ideia de que o “meu partido é o Brasil” e, portanto, que os partidos seriam, não somente desnecessários, mas um obstáculo, é uma ideia de apelo simples, porém, muito perigosa. O meu partido é o Brasil é uma forma de nacionalismo apolítico, mas não é a antesala do fascismo, embora fascistas tenham se aproveitado, conjunturalmente, do atraso na consciência que este grito de guerra traduz.
Por trás deste atraso, desta confusão, encontramos três ilusões. Primeiro, a ilusão de que uma liderança individual incorruptível seria superior a lideranças coletivas. Não surpreende, mas é muito grave, que a saída política mais popular entre aqueles que foram às ruas em São Paulo, no dia 17 de junho, tenham sido Joaquim Barbosa e Marina Silva. Ninguém, nem uma só pessoa, pode salvar o Brasil. A busca de lideranças individuais salvadoras é uma fantasia apolítica. O que nos remete ao pensamento mágico e à ilusão da liderança individual incorruptível, indivíduos com capacidades, supostamente, fantásticas, a la Janio Quadros, ou Fernando Collor. A luta de partidos, ou seja, instrumentos coletivos de representação de interesses de classe, é incontornável nas sociedades urbanas contemporâneas. Não deve existir mais lugar para caudilhos. Vargas é o passsado do Brasil capitalista ainda em transição para a industrialização. À sua maneira, o lulismo, o caudilhismo carismático, foi uma das consequências da degeneração do PT. Trocar um caudilho por outro seria dramático, caminhar para trás.
Segundo a ilusão de que existe uma solução técnica ideal para administrar a sociedade, ou seja, a fantasia positivista da “ordem e progresso”. Como se não existissem soluções técnicas as mais variadas, que respondem a diferentes interesses de classe.
Terceiro, e pior ainda, invertendo as relações entre causas e efeitos, a perigosa ilusão de que o problema seria a corrupção dos partidos sobre o Estado, e não a corrupção do capitalismo sobre os partidos.
O que está em disputa, portanto, é a consciência de milhões que irão lutar hoje, neste histórico dia 11 de Julho. A CUT e o PT farão o que puderem para conter, desviar e bloquear o caminho das mobilizações no dia seguinte. A tarefa da hora é abrir o caminho.
[1] MORENO, Nahuel. Critica a las tesis de la revolución permanente de Trotsky Buenos Aires, Ediciones Crux, 1992. Colección Ineditos de Nahuel Moreno. p.68.
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