meio-ambiente

Nosso papel na COP30


Publicado em: 8 de novembro de 2025

Meio Ambiente

Bruno Zanette, de Belém (PA)

Esquerda Online

Esse post foi criado pelo Esquerda Online.

Meio Ambiente

Bruno Zanette, de Belém (PA)

Esquerda Online

Esse post foi criado pelo Esquerda Online.

Compartilhe:

Sergio Moraes/COP 30

Ouça agora a Notícia:

A trigésima conferência das partes do clima pode ser entendida sobre diferentes prismas, a maioria indo muito além do recorte ambiental: esse é o maior evento de multilateralismo mundial, logo uma oportunidade para ONU destacar-se em um contexto de cortes orçamentários; Essa uma grande oportunidade de destacar uma região Brasileira que tem crescido em influência, população e economicamente; É a primeira conferência após a superação de um ponto de não retorno, com o sistema planetário não sendo mais capaz de suportar corais de água quente; E, sobretudo, enfrenta um movimento climático dividido e menos influente do que haviamos em 2019, com o ápice das marchas globais pelo clima e de difusão dessa pauta no discurso público.

Uma leitura crítica da nossa incapacidade de incidir nesses espaços multilaterais pode nos deixar desiludidos e imobilizados com os avanços possíveis. Porém, a nível de construção de lideranças e de organização a participação com olhar crítico e tensionante nesses espaços é sim muito valiosa. Nenhum outro lugar do mundo terá um tabuleiro de xadrez tão bem montado da disputa climático como Belém, se o rei é a burguesia fóssil que nem vai estar presente a rainha pode ser o lobby de suas empresas, possuindo a capacidade única de estar em todos locais, em todas as salas, mesmo no meio dos ativistas e suas ONGs. Os bispos do capital fóssil conseguem penetrar seus argumentos em diferentes ideologias, afinal se projetos de energias renováveis estão encontrando baixa aceitação na sociedade para indústria fóssil não importa se os interlocutores não acreditam em aquecimento global ou generalizam o colonialismo verde intrínseco às tecnologias renováveis. Suas torres são o sistema financeiro que cada vez abre mais as portas para novos projetos de infraestrutura fóssil, mesmo as previsões de seus próprios relatórios contarem com diminuição do uso de combustíveis fósseis para atingir net-zero, é claro que, o argumento de continuar a financeirização da natureza através dos créditos de carbono tem se mostrado muito mais convincente. Seus cavalos são a maioria dos sindicatos desses setores, são utilizados para dar uma cara humana ao que defendem, fazendo-os enxergar nos ativistas uma ameaça do fim dos seus empregos, quando na verdade, a automação visando lucro é uma ameaça muito maior. Já os peões somos nós individualmente, que nessa teia de interesses não temos a capacidade de exigir alternativa, no máximo podendo escolher se vamos dar dois passos para o fim do mundo tentando seguir o modo de vida imperial ou somente um com mudança de dieta e comprando um carro elétrico.

Todavia, a partir das discussões multilaterais de clima já foi possível comprar mais tempo para construirmos poder de realmente virar o tabuleiro. A maior vitória das conferências multilaterais de clima foi o acordo de Montreal que regula as emissões de gases CFCs. Devido a ele, já é possível observar a restauração da camada de ozônio, e se não tivesse ocorrido as taxas de câncer de pele já inviabilizaria algumas atividades ao ar livre. Todavia, essa vitória criou um véu ilusório de como se dão as dinâmicas de influência nas negociações climáticas, uma vez que a influência da sociedade civil, através de difusão científica e mobilização, foi capaz de convencer os capitalistas a encontrarem uma solução ao problema. Porém, claramente tapar o buraco da camada de ozônio não foi uma questão que exigiu uma mudança estrutural nas dinâmicas de produção, tendo em vista que outros gases poderiam substituir os CFCs e que as indústrias que dependiam desse insumo não exerciam um poder de lobby tão grande quanto o fóssil. Logo, é necessário superar o paradigma de que a crise climática será resolvida pela difusão de dados científicos e não pela luta política.

Se é verdade que uma solução duradoura e completa para o aumento das temperaturas médias somente virá através da implementação em escala global da planificação da economia, também é verdade que as ferramentas de financiamento, adaptação e mitigação climáticas utilizadas de maneira efetiva, podem ter impactos fundamentais na capacidade manutenção da sociedade como conhecemos. Aqui é importante trazer os conceitos de pontos de não retorno, eventos que são desencadeados a partir da piora no sistema climático global e que não iremos retornar somente retirando carbono da atmosfera, pois esses sistemas foram construídos ao longo de eras geológicas passadas e não décadas. Pontos de não retornos que já estamos próximos incluem a amazônia deixando de ser uma floresta tropical para se tornar um bioma menos denso, o fim da concentração de gelo nos pólos gerando aumento significativo do nível mar e a interrupção de correntes marinhas que dissipam o excesso de calor levando as temperaturas nos meses quentes a patamares insuportáveis.

Estar correto cientificamente não significa que vamos ter poder político para a mudança, e a etapa dos cientistas das petroleiras espalhando dúvidas sobre as mudanças climáticas já passou, o investimento hoje é focado em lobby político para expandir o máximo possível projetos de infraestrutura, que, no futuro, serão muito difíceis de descomissionar. Também lutam por manter a dependência fóssil de diversos setores da economia, seja na área de transporte, energia ou manufatura. Acreditamos assim, que na COP precisamos estar munidos de argumentos para incidir sobre os temas que serão discutidos em conjunto da comunidade global, como também usar esse espaço de destaque para influenciar como o Brasil atua nos temas mais importantes em território nacional. Nesse sentido gostaríamos destacar três pontos importantes para termos um olhar crítico que são muitas vezes secundarizados pela esquerda, todavia serão foco de grandes decisões internacionais bi-laterais e multilaterais:

Mercado de Carbono: concebido no artigo 6 do Acordo de Paris como uma forma de trocar emissões por absorção de gases do efeito estufa, nesse sentido, é verdade que é muito difícil descarbonizar certos setores como aviação, construção civíl e indústria de metais. Todavia, assistimos nos últimos anos o Norte do Brasil, especialmente, se tornar um laboratório de casos problemáticos no mínimo da implementação desses projetos. Venda de créditos de terras públicas por agentes privados, territórios indígenas que não consentiram com a venda participando, terras que possuiam trabalho análogo a escravidão vendendo créditos e finalmente, o ponto comum entre quase todos os projetos, a maior parte do dinheiro fica com a Faria Lima como middle man. Esse ano na COP o governo Brasileiro continuará se isolando em uma posição pouco popular na América Latina, onde apoia o avanço da conexão dos mercados de carbonos nacionais em uma rede internacional, apostando que a ONU será capaz de criar uma sub-agência fiscalizatória de projetos. Essa talvez seria uma das melhores saídas, pois atualmente o mercado de carbono brasileiro é regulado pelo ministério do meio ambiente com menos de uma dezena de funcionários para colocar limites e fiscalizar projetos em todo o país, obviamente essa fragilidade não é acidental.

Hidrogênio Verde: primeiro necessitamos clarificar que a discussão principal ao redor desse combustível não é de uso na indústria nacional, e sim de uma forma de como modificar as energias renováveis para melhor se adaptarem aos mercados de trocas comerciais existentes e facilitarem a transição energética Europeia. Experiências na América Latina já demonstram o alto uso de água e energia para sua produção e o risco extremamente alto de acidentes fatais, uma vez que é um combustível muito reativo. Todavia, o Brasil com cerca de 80% de energia renovável em sua rede elétrica,  abundante em água doce e com projetos de uso dessa tecnologia com destaque internacional possui um potencial gigante de utilizar essa matéria prima para desenvolver sua indústria nacional verde, especialmente de aeronaves e metalurgia. Logo, uma possibilidade de vender os equipamentos junto do combustível.

Transição Energética: Belém em novembro também será sede da operação de pesquisa de novos poços de petróleos na foz equatorial. Com o governo federal utilizando todas as ferramentas retóricas possíveis para dizer que não é uma contradição e  que não prejudica a imagem de líder climático, porém nos mais avançados estudos de clima, é consenso que é fisicamente inconciliável novos poços de petróleos e as metas do acorde de París. É notório que nenhum outro país encontra-se respeitando suas metas também, porém o Brasil chamou a responsabilidade para si e precisa superar a fantasia de que explorar combustíveis fósseis desencadeia inevitavelmente em melhoria na qualidade de vida e industrialização, quando na verdade é mais difícil encontrar cidades que fazem bom uso dos royalties do petróleo do que o contrário. Mesmo que boa parte da queima do nosso petróleo gerando emissões em outros países e não aqui, é inegável o papel que a petrobras cumpre na manutenção desse sistema, sendo continuamente colocada como uma das maiores exportadoras de petróleo, e é claro que é uma via de mão dupla, consumir petróleo aumenta o preço incentivando a produção, e do outro lado, como ocorreram com os grandes crashes do preço de petróleo , o preço do petróleo nas autoras incentiva encontrar e implementar soluções que independem do petróleo.

Finalmente, é muito difícil medir o impacto das conferências do clima em reduzir emissões, todavia a literatura científica mostra que elas cumprem um papel fundamental na disseminação da discussão nos países sede. Devemos extrair desses momentos que o mundo olha para o Brasil lições e aprofundar a nossa visão crítica de como melhor utilizar as ferramentas ao nosso dispor para contribuir com nossa estratégia, mas também construir relações e legitimidade na pauta climática participando ativamente desses espaços.


Contribua com a Esquerda Online

Faça a sua contribuição