brasil

Governo Cláudio Castro alinha-se a Trump: a fusão da “Guerra às Drogas” com a “Guerra ao Terror”


Publicado em: 30 de outubro de 2025

Brasil

Gibran Jordão, do Rio de Janeiro-RJ

Esquerda Online

Esse post foi criado pelo Esquerda Online.

Brasil

Gibran Jordão, do Rio de Janeiro-RJ

Esquerda Online

Esse post foi criado pelo Esquerda Online.

Compartilhe:

Foto: Agência Brasil

Ouça agora a Notícia:

A operação “Contenção”, elaborada pelo Governo de Cláudio Castro no Rio, com o objetivo de combater o comando vermelho nas comunidades do complexo do Alemão e da Penha, foi a mais letal da história do Brasil, resultando até agora em 121 mortos, dezenas de feridos, entre policiais, população civil inocente e suspeitos. Superou o massacre do Carandiru no ano de 92, que teve 111 mortos, e a operação escudo/verão na baixada santista (2023/24) que resultou em 84 mortos. O governo de Castro também lidera quatro, das cinco operações mais letais registradas desde 2007 no Rio de Janeiro: Jacarezinho (28 mortos), Vila Cruzeiro (23 mortos), Salgueiro (13 mortos) e agora, a operação “contenção” no alemão/penha (121 mortos). A gestão Witzel (antecessor de Castro), por sua vez, detém o recorde de mortes totais em chacinas policiais em um único ano (634 em 2019), com a maior média mensal de vítimas (45 por mês). Essa curva ascendente não é acidental; é o resultado direto de uma política que incentiva e legitima o confronto como principal método de atuação no combate ao crime organizado.

Por tanto, o método do confronto violento e direto contra organizações criminosas não é uma novidade do governo de Castro, desde a década de 90 são inúmeras as operações elaboradas por diferentes governos, ou seja, mais de três décadas de invasão militar em territórios com objetivo de combater o tráfico, cujo o resultado foi a morte de população civil inocente, de profissionais de segurança pública e suspeitos que não tiveram direito ao devido processo legal.

Esse método cruento, não só se intensificou nos últimos anos, mas a propaganda de governos que reivindica esse tipo de operação passou a ser o número de mortos. Nos parece que a consequência dos retrocessos de parte significativa da consciência média da população, não autoriza preocupações em evitar efeitos colaterais de uma operação militar e nem está interessada em verificar se o crime será realmente controlado ou não, a satisfação do ódio coletivo é ver sangue! O que acaba levando os governos de base eleitoral protofascista a concentrar suas preocupações em conquistar uma métrica de sucesso para fazer propaganda política, no qual o critério de eficiência é o número de mortos. Os dados mostram que essa política se tornou ainda mais recorrente a partir de 2019, revelando dramaticamente como as ideias bolsonaristas na sociedade brasileira estão deixando enfermidades profundas.

O balanço dos últimos 30 anos de operações violentas nas favelas é positivo?

Ao levarmos em consideração pelo menos os últimos 30 anos, trata-se de um intervalo de tempo significativo para observar se um método tem validade na realidade ou não. O levantamento de dados GENI/UFF e do Instituto Fogo Cruzado, como também os próprios números da secretaria de segurança publica do estado do Rio de Janeiro, revela que nos últimos 30 anos, não só facções como Comando Vermelho, avançaram no controle de territórios, como também houve a expansão de grupos milicianos que passaram a disputar territórios com o tráfico. Indicando uma disputa intensa e uma constante mutação especialmente na baixada fluminense e zona oeste da cidade do Rio de Janeiro.

Enquanto os grupos de traficantes organizavam a importação e distribuição de drogas e armas controlando esse comercio ilegal, desafiando forças estatais a partir de várias comunidades e favelas. As facções milicianas encabeçadas por agentes do próprio estado avançaram no controle do comércio de gás, TV e internet a cabo, transporte de vans, especulação imobiliária, taxas de segurança e grupos de extermínio a partir de agentes da polícia civil e militar. Esses fatos do cotidiano do Rio de Janeiro demonstram que o modelo de segurança pública focado no confronto direto, na militarização do cotidiano das favelas e na realização de operações de alta letalidade é um fracasso retumbante. A chamada “guerra às drogas” transformou-se em uma guerra sem fim que alimenta um complexo industrial-militar e uma economia política da violência, cujos resultados são a consolidação do poder armado não-estatal, a corrupção endêmica das instituições policiais e a violação sistemática dos direitos da população civil, que vive sob o cerco de múltiplos fogos. Mais de 90% dos fuzis apreendidos dos paióis do crime organizado não são fabricados no Brasil e em sua maioria são de origem norte-americana, são dados da subsecretaria de inteligência da Policia Militar do Rio de Janeiro. Isso significa que o complexo industrial militar dos EUA vende armamento para as forças policiais e para o crime organizado, em dois fluxos de comércio, um através de contratos com governos e outro através de um mercado paralelo.

Segundo o mapa histórico dos grupos armados do Rio de Janeiro, de 2.565,98 km² de área urbana habitada da região metropolitana do Rio de Janeiro (retiradas a cobertura vegetal, áreas rurais e bacias hidrográficas), 18,2% esteve sob o domínio de algum grupo armado em 2023. Em 2008, as áreas dominadas representavam 8,8%. Isso significa que nos últimos 16 anos a área da região metropolitana do Rio de Janeiro sob controle de grupos armados dobrou (crescimento de 105.73%). As milícias foram o grupo que mais cresceu ao longo de todo esse período, triplicando o seu domínio territorial (+204,6%). E a ADA foi o único grupo que apresentou redução ao final do período (75,8%). CV e TCP cresceram respectivamente 89,2% e 79,1% nos últimos 16 anos.

Nem mesmo a intervenção militar na segurança pública do Rio de Janeiro, durante o governo Temer em 2018, chefiada pelo então general Walter Souza Braga Neto, foi capaz de causar algum abalo sobre o domínio das facções do tráfico de drogas. A intervenção chegou ao fim, Braga Neto fez parte da cúpula do governo Bolsonaro, e agora os dois e outros aliados estão condenados por chefiarem a tentativa violenta e criminosa de golpe de estado em 2022/2023. Enquanto isso, o crime organizado no Rio de Janeiro segue se desenvolvendo e expandindo território. As políticas neoliberais e a austeridade fiscal diminuem o alcance do estado em promover desenvolvimento econômico, através de investimentos em pesquisa, inovação, industrialização, qualificação e educação de trabalhadores em massa. Nesse vácuo e em ambiente de profunda precarização, as organizações criminosas conseguem recrutar compulsivamente jovens para ocupar funções operativas num modelo de negócios altamente lucrativo, mas ao mesmo tempo muito violento.

Milhares de jovens se associam aos esquemas das milícias e do tráfico, como também das narco-milícias, como uma alternativa de sobrevivência. Muitos preferem esse atalho para fugir da condição de miséria histórica, ainda que seja por pouco tempo de vida. As operações policiais violentas assassinam todos os dias jovens que estão no mundo do trafico, no dia seguinte todos serão substituídos por novos peões, retomando o ciclo que é dirigido por gente poderosa que não mora no morro. A favela é só um campo de operações do trabalho pesado, os verdadeiros chefes comandam o esquema em condomínios na barra da tijuca ou até mesmo fora do país.

A fusão da “guerra às drogas” com a “guerra ao terror” – A Guerra contra o “narco-terrorismo” como política de recolonização

A política de segurança pública no Rio de Janeiro, focada na guerra permanente contra as drogas, é consciente da sua ineficácia para desmantelar o crime, mas esse não é e nunca foi o seu objetivo, como vimos nos dados acima. O sistema narco-político liderado por bilionários tem interesse em perpetuar a guerra contra as drogas, pois é uma excelente forma de fazer propaganda política para uma parte da sociedade embebida de ódio contra a população periférica, alimenta a indústria armamentista, encarece o preço da droga aumentando os lucros, e ainda é um importante método para disputar o controle político de territórios.

Mas agora queremos chamar a atenção para a evolução dos objetivos da política de “guerra às drogas”, que passa a ganhar uma dimensão geopolítica mais estratégica. O governo de Trump e a extrema direita brasileira estão alinhados na política de colocar um sinal de igualdade entre traficantes e terroristas. O interesse global da extrema direita em fundir a “guerra às drogas” com a “guerra ao terror” obedece a um objetivo estratégico sobre três aspectos principais:

1. Recolonizar a América Latina para ter acesso a recursos naturais estratégicos e afastar a influencia do BRICS;
2. Facilitar intervenções militares para agredir a soberania de países na América Latina se preciso for; 3. Fortalecer o fluxo de comércio de armas da indústria militar americana;

O governo de Claudio Castro, assim como o secretário de segurança publica do estado de São Paulo, Guilherme Derrite, fizeram nos últimos meses movimentações idênticas em relação ao governo Trump. Apresentaram relatórios em reuniões com representantes do governo americano no sentido de classificar o CV e PCC como organizações terroristas.

Em entrevistas coletivas de representantes do governo de Cláudio Castro como também em declarações de parlamentares de extrema direita, a expressão “narco-terrorista” , até então pouco usual, está sendo utilizada sistematicamente. Além disso, já existe uma movimentação de parlamentares bolsonaristas em apresentar projetos que classificam organizações do tráfico como organizações terroristas. O secretário de segurança pública de São Paulo, Guilherme Derrite, irá se licenciar do seu cargo no governo Tarcísio para relatar o projeto já na semana que vem. Essa articulação já conseguiu aprovar a urgência do projeto de lei, permitindo a aprovação do PL 1283/2025 a qualquer momento, destaque que o texto desse projeto de lei cita nomeadamente o governo Trump como exemplo a ser seguido. Esse projeto também foi aprovado pela comissão de segurança pública e combate ao crime organizado da câmara, sob a relatoria de Alexandre Ramagem ( PL-RJ), condenado a 16 anos de prisão por envolvimento na trama golpista do 8 de janeiro.

Toda essa movimentação da extrema direita brasileira se dá num momento no qual o governo americano faz uma operação militar de grande envergadura, com porta aviões estacionados com equipamentos militares de alta tecnologia no mar do caribe, próximo a costa da Venezuela. Trump e representantes do seu governo recentemente deram declarações públicas, mais de uma vez, dizendo que tanto o governo Maduro como o governo Petro seriam líderes de facções narco-terroristas. Uma tensão está instalada no continente sulamericano, embarcações próximas da Venezuela e da Colômbia já sofreram ataques, e um ataque em solo nesses países pode ser realizado a qualquer momento, ferindo a soberania desses países e tratados internacionais.

A fusão da “guerra às drogas” com a “guerra ao terror”, responde a uma necessidade geopolítica do governo americano em construir um movimento de fora para dentro do Brasil, que conta com seus aliados bolsonaristas para fazer esse serviço com bastante eficiência. Trata-se da construção de uma narrativa política que satisfaz parte significativa do eleitorado brasileiro que olha para Trump com admiração, ao mesmo tempo que despreza o seu próprio país. Revelando que a formação social do Brasil enquanto povo nunca se completou, mesmo após 203 anos de nossa independência e mesmo depois de 137 anos do fim da escravidão. Ainda há fraturas e feridas que não permitem um sentimento de unidade em defesa de nossa soberania contra uma agressão externa.

O crime organizado é uma chaga social, que controla territórios, explora pessoas humildes, destrói famílias, obedecendo a interesses de poderosos da política nacional e internacional que querem perpetuar a “ guerra as drogas”, transformando agora na “guerra ao terror”, impondo um método ineficaz como política de estado em parceria com o complexo industrial militar americano, que por sua vez vende os mesmos fuzis, tanto para as forças estatais como para o crime organizado. Só vamos vencer a luta contra o crime organizado, quando essa pauta for parte constitutiva da luta contra todos aqueles que odeiam o Brasil e amam a bandeira americana.

Gibran Jordão é historiador, analista de geopolítica e TAE-UFRJ

 

Voir cette publication sur Instagram

 

Une publication partagée par Guilherme Cortez (@guilhermecortez_)


Contribua com a Esquerda Online

Faça a sua contribuição