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Os ataques imperialistas, a Frente Ampla e a burguesia nacional
A soberania está nas mãos dos debaixo
Publicado em: 5 de agosto de 2025
Os ataques de Trump à independência política do Brasil reacenderam ferozmente na esquerda brasileira o debate antiimperialista. Alguns setores imediatamente se propuseram a reeditar, desta vez sob o pressuposto de combater também a extrema direita, a ideia de que seria não só inescapável, mas desejável, buscar consolidar um bloco de ação com a burguesia nacional para as eleições de 2026.
Temos alguns fatores em mente que podem contrapor essa ideia. Tentaremos transformar esses fatores em um todo coerente.
1 O Brasil já é um país bastante protecionista. A tarifa média de importação aplicada pelo Brasil sempre foi alta, desde a primeira República. Está hoje em 7,26%, ao passo que a média mundial antes de Trump II oscilava entre 1 e 2%.
2 A política de substituição de importações vem sendo tentada desde a primeira República de Vargas. Naquela época, houve relativo sucesso na implementação de setores de base da indústria brasileira mas, mesmo assim, sob uma forte resistência da burguesia nacional, profundamente marcada pelos interesses do latifúndio.
3 O único período de industrialização massiva do Brasil que possuiu caráter relativamente democrático, com participação voluntária da burguesia e sem grandes crises, foi o período em que JK esteve no governo. Mesmo assim, não durou muito. Todos os outros foram dirigidos por governos bonapartistas ou semi-fascistas. A maioria se deu a partir de uma brutal exploração da classe trabalhadora e acumulação de capital. Portanto, não produziu avanços significativos na qualidade de vida da classe como um todo. Vide o eugenismo, o surgimento das favelas, a repressão no campo etc.
4 Não bastasse a burguesia brasileira ser uma das mais atrasadas e autoritárias do mundo, ela é hoje majoritariamente neoliberal. Seu plano é reduzir impostos, minar os serviços públicos, acumular capital e só então começar a pensar em se diversificar para competir com as burguesias de outros países. Não custa dizer que isso nunca irá acontecer.
5 Os governos neoliberais que se seguiram após a redemocratização inverteram qualitativamente a política de substituição de importações e destruíram qualquer sonho de que Brasil um dia pudesse montar um planejamento estatal de modernização de nossos setores produtivos.
6 Os governos do PT foram eleitos com o programa da soberania nacional. Fizeram de tudo para comprar a burguesia nacional, convencê-la desse programa. Propuseram isenções fiscais, reduções históricas do juros, financiamentos bilionários, privatizações, reforma da previdência, ajuste fiscal etc. Buscaram fortalecer nossa burguesia acreditando que conseguiriam ao mesmo tempo satisfazer os anseios da classe e estabilizar a luta de classes ao apostarem no crescimento do PIB, valorização do salário mínimo e aumento do consumo interno. Nada adiantou. Não investiram em reformas estruturais em nome da classe trabalhadora. Foram traídos. Sofreram golpes duríssimos. A lava-jato e o impeachment foram a expressão máxima da traição, da sinalização de que qualquer projeto nacional-desenvolvimentista não se consolidaria. Houve privatizações de setores estratégicos da economia brasileira. O governo perdeu o controle sobre a Petrobrás, a Eletrobrás, quase perdemos os Correios etc.
Todos esses fatores nos permitem concluir que, por mais que as forças de esquerda sigam em situação de minoria, por mais desfavorável que seja a correlação de forças, por mais cautelosos e defensivos que precisemos ser, continua sendo uma ingenuidade sem limites acreditar em alianças com a burguesia para o curto, médio e longo prazos.
Pesquisas feitas durante o pleito de 2022 (vide aqui e aqui) mostram que nem Alckmin nem Tebet foram definitivos para a vitória de Lula. Ou seja, Alckmin entrou na chapa não porque traria mais votos para Lula, mas porque seria o responsável por colocar em prática a conciliação de classes.
Ele é o mediador entre o governo e a burguesia. Fomos contra Alckmin na chapa justamente porque já sabíamos que sua presença significava um aceno estratégico, um aceno para a burguesia de que seria um governo a frio, pautado na tentativa de estabelecer ganhos mútuos. Algo que, obviamente, como também já sabíamos, não iria se manter por muito tempo.
Sendo assim, para todos que pregam pela soberania nacional, é tempo de perceber que não haverá soberania por parte dos de cima, uma vez que não é possível alterar a estrutura produtiva e mercantil de uma país continental como o Brasil sem entrar em conflito direto com os interesses acumulativos imediatos daqueles setores que já dominam o PIB brasileiro. Essa é a sina dos países dependentes e atrasados.
Abrir novas frentes de investimento significaria um risco muito alto, ainda mais para os parasitas que vivem da renda dos juros. Por isso, só aceitariam um plano mais ousado de investimentos caso recebessem um compromisso do governo de que poderiam aprovar medidas de ajuste fiscal ainda mais danosas para a classe trabalhadora. Ou melhor, caso recebessem um cheque em branco para poderem saquear o orçamento público e implementar as piores contrarreformas que pudéssemos imaginar.
Portanto, nossa luta contra o imperialismo não pode deixar de passar pela denúncia do caráter reacionário, submisso, engessado e incompetente da nossa elite. A aposta mais consequente que podemos fazer é a de que as frações majoritárias da nossa burguesia defenderão as negociações a frio com o imperialismo, cedendo ao máximo daquilo que puderem ceder para minimizar suas perdas.
Chegam a ser pueris, singelos, simplórios aqueles que ainda depositam um pingo de confiança na conciliação de classes. A elite desse país não vê a hora de se livrar de um governo que, por mais conciliatório que seja, ainda represente um empecilho para seus objetivos.
É muita sorte nossa possuirmos uma figura da envergadura de Lula, o único capaz de tirar o Estado brasileiro das mãos diretas da burguesia. Ele é a única pedra no sapato, o único obstáculo no caminho.
Mas Lula não estará conosco por muito tempo. Talvez Lula não rompa com a burguesia, talvez siga apostando na conciliação. Com isso, talvez deixe de usar cada gota de seu potencial, único na história do Brasil, para agitar as massas contra nossos inimigos de classe.
Sendo assim, só nos resta trabalhar para que a nossa sorte grande não se converta em puro azar. Essa deve ser a chave das nossas análises para o período que se segue.
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